segunda-feira, maio 15, 2006

"Dança Comigo!..."

Sabemos que “a classe capitalista dirige mas não governa (...), pois se contenta em dirigir o Governo” . E esta realidade continua insofismável, mesmo na fase do chamado capitalismo avançado, embora a influência dos businessmen sobre a política seja, hoje em dia, muitas vezes subestimada. Não raras vezes os “maiorais” da finança, da indústria e do comércio assumem um ar enfastiado e proclamem o seu afastamento e até desagrado sobre as questões de natureza estritamente políticas.

De facto, amiúde os nossos distintos “cavallieri” da finança, da indústria ou do comércio, tem revelado a sua má opinião sobre os políticos, que nunca tiveram que “fazer uma folha de pagamentos” e, portanto, em sua perspectiva, não conhecem o mundo real... A menos que “homens corajosos” assumam o leme e desenvolvam as políticas que lhes convêm. Brandindo naturalmente o interesse geral, qual biombo encobrindo a nudez cristalina da verdade dos seus interesses privados...

Trata-se, afinal, de “despolitizar” as medidas mais controversas dos governos, sobre manto (diáfano) de serem tecnicamente inevitáveis e julgá-las de acordo com os critérios que favoreçam os respectivos negócios.

No fundo, não mais que uma forma de ingerência “clandestina” e, portanto, não legitimada, na vida pública, desvalorizando a ideologia e a política, como instâncias de consciência e de intervenção cívicas.

E não se pense que o governo é a única componente do sistema de Estado sobre o qual se exerce a influência dos negócios. De facto, uma das características mais expressivas do “capitalismo avançado” é a colonização de todo o sistema político, desde as camadas superiores do aparelho de Estado (Administração Pública, Tribunais, Instituições Financeiras, Autarquias Locais, etc.), passando pelos partidos políticos e empresas públicas...

Como se sabe, hoje em dia, as empresas estatais ou para-estatais mais que entidades económicas reguladoras de preços e de mercados, ao serviço dos consumidores e cidadãos em geral, são apenas meras plataformas de especulação, cobiçadas do capital financeiro.

Faço questão de esclarecer que não duvido da boa fé dos governantes e dos dirigentes políticos em geral. Não duvido que eles acreditem sinceramente que são os mais lídimos representantes do interesse nacional e que a sua preocupação sincera é apenas servir o País. A questão, porém, é que estão integrados e conformados (formatados?) no sistema e, como tal, não conseguem ver o outro lado das coisas: ver para além dos valores e dos interesses hegemónicos a que se encontram ideologicamente sujeitos...

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Surpreendi-me a pensar nestas coisas, enquanto na televisão corria o programa de entretenimento “Dança Comigo” e a página aberta do jornal esquecido me lembrava que “o PS impede o debate sobre incompatibilidade entre mandato de deputado e advocacia...”

Vá lá compreender-se ...

7 comentários:

Diafragma disse...

A tua análise está muito bem feita, como de costume, mas gostava de lhe acrescentar uns comentários.
Um deles é que, no meu entender, só é dirigido quem deixa. O outro é que, infelizmente, há muita verdade na crítica que se se faz aos políticos em geral de nunca terem "trabalhado" numa empresa. E isso nota-se infelizmente, na ausência de práticas muito simples e testadas na vida real, como por exemplo estabelecer objectivos mensuráveis e datados, avaliar resultados, controlar Planos sem esquecer que "controlar" significa avaliar e corrigir etc. etc..
A título de exemplo, não faço ideia nenhuma quem escreveu o Plano Tecnológico, e, como dizes, não duvido das melhores intenções dos seus autores. Mas li-o e estou certo que um tal Plano nunca seria aprovado numa empresa, precisamente pelas faltas que referi acima.

Alberto Oliveira disse...
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Maria P. disse...

Que bela dança!

bjo.

lique disse...

Análise, como sempre, bem construída. Eu não diria que só "dança" quem quer. No sistema existente é muito complicada a recusa de uma dança. E que todos os santinhos me livrem de ter a mínima intenção de defender a classe política. Só que, quem não dança, mais tarde ou mais cedo sai de cena por uma qualquer razão que, claro, nada tem a ver com a sua integridade... Dir-me-ão que antes isso do que ceder ao sistema. Certo! Mas quais são os resultados práticos? O que tem que ser mudado é bem mais abrangente, digo eu, que não percebo nada de política.
Beijos

M. disse...

Também digo: "Vá lá compreender-se..." toda esta governação.

batista filho disse...

Estás a falar da situação do meu país, sem dúvida!... mesmo estando distante.
Infelizmente, a fortaleza ideológica que muitos camaradas aparentavam possuir - ruiram bem mais rápido que o muro de Berlim!
Bem como muitos sindicatos de trabalhadores e partidos políticos, ditos de "esquerda", ao terem os seus principais quadros encastelados no poder se esqueceram dos que diziam/dizem representar.
A Utopia?! - continua no mesmo lugar... e lá vamos nós: não mais com os passos ágeis da juventude, mas com constância das marés.
Parabéns por mais este artigo.
Deixo um abraço fraterno.

JPD disse...

Olá Herético!

Editaste um excelente artigo.

Nos dias que correm, pratica-se a diferença entre a economia e os negócios para separar "certas águas". A fronteira, muitas vezes é tão ténue que mal se acredita nesse esforço. Enfim!

O Estado, para não ser acusado de estar muito ligado a interesses particulares e deixar descansados os cidadãos, cria entidades reguladoras que teriam uma actividade que resguardaria os interesses dos cidadãos da eventual cobiça desenfreada do capitalismo selvagem.
A corrente neoliberal que defende que o mercado é o grande regulador não é aceitável. Porque a disparidade entre o consumidor e os produtores é acentuada e não tem em conta as franjas da sociedade que jamais acedem a patamares de poder de compra sequer de uma média baixa.
Também não é aceitável que os homens de negócios -- porque as suas propostas fracassam -- escarnecerem dos políticos.
Um abraço

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