quarta-feira, maio 24, 2006

Mulheres à prova de bala ?!...

O anúncio gritado em zoom na pantalha da televisão, sobrepõe-se a imagens de mulheres fardadas em diversas acções militares: “mulheres à prova de bala!” Em voz off, o locutor acentua a euforia: “Portugal é o País da Europa com mais mulheres nas forças armadas!...” Enfim, os destinos bélicos da Pátria em mãos femininas!...

Entendamo-nos. O que incomoda não é a alteração de paradigma social que permite às mulheres “naturalmente” integrarem as Forças Armadas, enquanto manifestação de autonomia e realização pessoal. Pelo contrário, o que se contesta é a jactância machista da expressão. Serão os homens das nossas forças armadas ”à prova de míssil” ?!...

Mas, sobretudo, o que não posso calar é a minha opinião sobre a patente arrogância (masculina) de considerar ser a “violência institucionalizada” do universo militar como espaço privilegiado de emancipação feminina... Outras mais legítimas razões de orgulho nacional seriam, certamente, se Portugal fosse o País da Europa que melhores condições proporcionasse às mulheres para participarem na vida cívica... Para além das propaladas (e insultuosas) quotas femininas...

Entretanto ...

Dizem os jornais, na sequência de um relatório da Amnistia Internacional, que no ano passado, no nosso País, foram assassinadas trinta e três mulheres, devido a violência doméstica... A inclusão do nosso país no relatório, segundo os responsáveis da AI, justifica-se pelo elevado número de vítimas e “como chamada de atenção para o problema, que sendo transversal geográfica e culturalmente, deveria merecer redobrados cuidados por parte do Governo português...”

Segundo o mesmo relatório, dados internacionais revelam que uma em cada quatro mulheres é vitima de violência doméstica e que o último levantamento da situação, realizado em 1995, indica que, em Portugal, uma em cada três mulheres já sofreu maus tratos de maridos ou familiares próximos...

E assim, vamos: - “nós por cá todos bem!...” - como num célebre programa do tempo da guerra colonial, com o qual se pretendia anestesiar as famílias dos soldados ...

Será que agora nos querem entreter a jogar aos soldadinhos de chumbo, com soldados-mulher a enfeitar a parada?!...

11 comentários:

JPD disse...

Olá!

Temos umas FA que ainda estão por encontrar o seu verdadeiro desígnio e serem orçamentadas para ele; temos um exercito de inspiração colonial que ainda se não reequacionou e andamos a anunciar modelos de violência de género, entre o masculino, tradicionalista e o feminino nouvelle!
Não há mesmo pachorra!
Quanto à violência, aquela que abordas na segunda parte do post, trata-se de uma caso bem sério. Há uma hediondez a campear que parece prezar as mulheres e as crianças como alvos previlegiados. Lamentável!
Um abraço

Isa Maria disse...

nós os portugueses temos a mania de estarmos sempre a ver, onde podemos ser melhores em alguma coisa. Se é neste feito, porque não publicitá-lo. Ora, mas naão nos fica nada bem, nós às mulheres, mas ...é uma mania à português!

Jorge Castro (OrCa) disse...

Sempre um país de aleatórias (ou talvez não...)questões simétricas. No caso, "mulheres de armas" versus mulheres vítimas.

País estranho este em que se quer criar, também, a mulher por quotas, hipocrisia a roçar a perversão.

Entretanto - e para gáudio dos teus leitores - outra cristalina opinião, pendular, dir-se-ia, que nos ajuda a arrumar ideias. E ele há tão poucas a fazê-lo!...

Um grande abraço.

Licínia Quitério disse...

Acho esta uma faceta preversa da emancipação da Mulher em que, devido a múltiplas circunstâncias, ela se está a deixar "embarcar". Um País de bravas guerreiras. Era o que nos faltava! Já tive uma longa conversa com uma dessas mulheres-soldado que me deixou triste. Confrontada com o seu ofício de matar "o inimigo", ela refugiava-se em escusas de actividades administrativas. Pareceu-me uma jovem a quem tinham cerceado muitos dos afectos. Enfim...estou velha.
Beijinhos.
Licínia

M. disse...

Cada um com seu gosto... Se uma mulher gosta de fazer a sua vida nas FA, que faça. O que irrita é fazerem disso uma espécie de guiness, com anúncio de estrondo. E o que é que estará por detrás dessa escolha? Se formos escarafunchar, talvez encontremos com que nos incomodar. Mas, talvez também, essa eventual independência e aparente "dureza" com que as mulheres são treinadas nas FA, as ajude a aprender a lutar contra a outra violência, a doméstica. Às vezes encontram-se forças vestindo outros papéis.
Mas isto é falar de longe: não conheço pessoalmente nenhuma dessas mulheres-soldado, como diz a Licínia e que a deixou triste.
Um abraço.

lique disse...

Com que então mulheres à prova de bala? :) Bem devíamos ser, para aguentar tudo o que a vida nos dá de presente só por sermos mulheres.
Mas, falando do teu post, porque será que isso acontece? Existe algum estudo sobre o assunto? Uma estatística deve merecer sempre um estudo que a justifique.
Será porque o desemprego está como está e se reflecte, ainda mais, nas mulheres? Será porque as mulheres portuguesas sentem a necessidade de um trabalho onde lhes sejam dadas as "armas" para se afirmarem, já que em outras áreas a afirmação é difícil? E quantas dessas mulheres estão em postos de destaque nas forças armadas? E quantas estão, efectivamente em funções de campo e não administrativas?
Tantas perguntas. Não me choca nada ver "os destinos bélicos da Pátria em mãos femininas", se souber que alguma decisão nessa área tem alguma possibilidade de ser feita por mulheres. O que não me parece...
Quanto à violência doméstica é uma vergonha mas, infelizmente, uma realidade tão enraizada que vai ser extremamente dificil mudar o estado das coisas.
E já falei muito, por hoje. :)
Beijos

Maria P. disse...

Eu concordo em absoluto com o comentário postado por fotoescrita.
E mais não digo!

M. disse...

Venho agradecer as palavras deixadas na minha paisagem despojada e trago um docinho de amoras para o lanche. ;-)

Diafragma disse...

Há anos, trabalhei com uma pessoa invulgar de quem me tornei amigo. Homem extremamente inteligente, doutorado, com patentes registadas na área da física nuclear, e um conhecedor profundo de história e de arte. Era também um grande conversador, e durante cerca de 2 anos viajávamos várias vezes juntos. Lembro-me que uma espécie de jogo que então tínhamos: enunciar as profissões ou actividades em que practicamente não havia mulheres e tentar perceber porquê. Lembro-me de alguns casos da nossa "lista". Compositoras, Campeãs de Xadrez, Marceneiras, mecânicas de automóvel, ou campeãs de bilhar, entre muitas. Este teu texto recordou-me esse nosso "jogo" para passar as horas de viagem.

eli disse...

[meu beijo... uma rosa... saudades...]

Nilson Barcelli disse...

Não percebeste nada mesmo...
Tu não vês que pelo menos essas mulheres que estão nas forças armadas não vão sofrer de violência doméstica?
Só espero é que as estatísticas da violência doméstica não se invertam, isto é, que passem os homens, maioritariamente, a ser vítimas dessa violência ...
Abraço.

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