segunda-feira, abril 23, 2007

Inclusão ... ou Revolução?

Uma nova palavra no léxico político. Com o alto patrocínio do Presidente da República. A “inclusão social” é a nova palavra fetiche com que se procura exorcizar a (má) consciência política do atraso económico e social do País. Perante o escândalo da pobreza, as eminências do Palácio de Belém antecipam razões, convocam empresários, escolas e instituições de voluntários para “contrariar o destino” dos menos favorecidos...

As famílias, pois então, não fossem elas, no dizer de Sua Excelência, quem tem “papel decisivo no sucesso dos esforços para a inclusão”. As famílias, portanto!... - debatendo-se com o garrote dos impostos, os baixos salários, as reformas de miséria e o desemprego dos filhos...

Para já, não é ainda o discurso dos ”pobrezinhos” e dos “chás de caridade”. Mas pelo rumo o País toma, em breve lá chegaremos (de novo). De facto, desde os tempos do “antigamente”, nunca foi tão grande o fosso entre ricos e pobres e, como se sabe, os pobres fazem muita falta para que os ricos salvem as suas almas piedosas...

Dados recentes do Eurostat sobre o aumento das assimetrias sociais na União Europeia, revelam que, nos últimos dez anos, foi Portugal o “campeão” das desigualdades (ou não fôramos nós bons alunos!). De facto, segundo aquele organismo de estatística da UE, entre 1995 e 2005, as assimetrias diminuíram, no conjunto dos países, de 5,1 para 4,8, enquanto que, em Portugal, cresceram de 7,4 para 8,2.

Compreende-se, assim, neste quadro, a dimensão maior do desígnio nacional da “cooperação estratégica”. O governo “socialista” do Eng.º Sócrates fecha 1400 escolas e mantêm o projecto de fechar mais umas quantas?!... Pois bem, o Chefe de Estado diz-se consternado com o baixo nível instrução e de qualificação das pessoas, que “protagonizam” (imagine-se quanto!) os casos de exclusão e garante, solene, que a escola "tem sido e vai continuar o mais importante instrumento de inclusão social" e a oportunidade decisiva para que os jovens vençam o "determinismo social”...

E por aí em adiante. O governo “socialista” do Eng.º Sócrates rende-se, de corpo e alma, às políticas mais activas do liberalismo económico, aumentando as desigualdades, promovendo políticas de despedimentos, de baixos salários, reformas e pensões de miséria, para proveito de uns quantos?!... Pois então, o senhor Presidente, preocupado com o “determinismo social”, cumpre o seu papel ideológico de “conformação da sociedade” e propõe-se, com fervor, anestesiar o País com os seus “roteiros para a inclusão”...

Esquecem-se, um e o outro, que o alegado “determinismo social” não se exorciza com passes de mágica, pois assenta em pressupostos profundamente inconciliáveis: o mesmo sistema que segrega exploração, pobreza e miséria é o mesmo que acumula lucros e riqueza para uns quantos...

E esquecem também que, enquanto houver uma injustiça, haverá sempre a bater um coração revolucionário...


O foco guerrilheiro existe sempre. Em cada um de nós
existe um foco. Uma guerrilha possível
uma insubmissão.
Nem é preciso procurar além a serra
o lugar propício
inacessível.
A serra está em nós. Começa
em certas noites no nosso próprio quarto
irrompe subitamente sobre a mesa de trabalho
pode aparecer à esquina
em plena rua.
(...)

Talvez a serra não seja mais que um ínfimo espaço
uma utopia para uso próprio
uma palavra
uma pequena forma quase despercebida.
Contra o sentido único. O pensamento único.
O dia único.
(...)

Ou talvez o mexer dos lábios
de um poeta algures
no mundo...
(...)

Talvez uma nova síntese esteja a nascer.
Mesmo aí. Onde menos se espera.
Por dentro de computador. Na imagem virtual.
Nas grandes auto-estradas da informática.
Mesmo aí é possível a surpresa
uma boina uma estrela um vírus.
Ou talvez um coração.
A fala o sopro uma batida.

Che.”


Excertos do poema “Che” – Manuel Alegre – Edição – “Caminho”.


25 de Abril, Sempre!

32 comentários:

Maria P. disse...

É fantástica a clareza das tuas palavras que tão bem revelam as verdades deste país(zinho).

Um abraço*

Maria disse...

Deixaste-me sem palavras, com as palavras ao Che...

Um abraço num punho erguido...
... e um cravo vermelho para ti...

vida de vidro disse...

O discurso da "inclusão social", da forma que tem sido feito pelo PR, tem um cheiro a "caridadezinha" que enjoa.
Fazes uma óptima análise, completada com esse presente dos excertos do fantástico poema do Manuel Alegre.
25 de Abril, sempre! **

PintoRibeiro disse...

Revolução! Outra, claro,
Abraço.

Anónimo disse...

eu não me "incluso"



incluo-me no rol dos teus leitores.



25 mil cravos sempre.


e um beijo.



(piano)

hfm disse...

O "chás de caridade" e Che trouxeram-me dois mundos entre os quais me degladiei - o da tradição familiar, o da revolta e da mudança. Em ambos, de forma radicalmente oposta, tanta utopia! Prefiro onde me situei, não no concreto (este está mau) mas dentro de mim.

Unknown disse...

Lindíssimo, meu amigo!
Gostei muito deste texto e adorei a inclusão de um poema! Ainda por cima "esse" poema. E tudo isto em véspera do 25 de Abril...

Beijinhos

Jorge Castro (OrCa) disse...

Quem lhes desse com uns Chés por caridade / no alto dos bestuntos alugados / havia de trazer luz à cidade / ... incluídos nós, então, e aliviados! :-)

Claro, clarinho como a água das montanhas... mas só aquela dos píncaros, mesmo, meu caro.

25 de Abril, sempre! E aquele abraço.

Bernardo Kolbl disse...

Abraço. Não há pachorra.

Anónimo disse...

Hasta la vitoria siempre!!!!

António Melenas disse...

Excelente análise.
Com base no ditado popular "com papas e bolos se enganam os tolos", estes gajos ("gajos", aqui, é mesmo para os desmerecer) inventam estes palavrões para deitar poeira nos olhos da malta e mais facilmente os enganar... e o pior é que enganam muitos. Especialmente os que gostam de ser enganados.
VIva o 25 de abril (pus a propósito uns versitos no meu outro blogue)
Um abraço

M. disse...

Na minha humilde opinião, serão perigosas, essas expressões como "inclusão social", por exemplo. São redutoras, limitadas, enganadoras, espartilham o pensamento enquanto pensadas e ditas, deturpam a acção, desviam-na, ofendem a realidade sofredora das gentes. São ridículas na sua pequenez (des)humana.

Lord of Erewhon disse...

Governo socialista?? :)

Abraço!

JM disse...

Pois é. Como empre, colocas o dedo na ferida (que badalhoquice)e com o nível literário a que nos habituaste. "Inclusão social"... a nova expressão com que os "fantoches" ao serviço do capital nos querem encher a barriga, com uma mão cheia de nada.
Inclusão/Revolução?
Eu voto REVOLUÇÃO. Claramente.
Um abraço

Gi disse...

As clivagens financeiras provocam as clivagens sociais. E, Pêndulo, em alguma coisa tinhamos que ser os primeiros!...
Gostei da análise e do poema.
E 25 de Abril ...sempre!

o Reverso disse...

QUE CHATICE !: OS NOSSOS CRAVOS ESTÃO A EMPALIDECER.
UM ABRAÇO.

Vladimir disse...

é preciso dar a volta a isto, a este país, tem de haver solução, há que procurá-la, mas se calhar neste momento não estaremos a percorrer o caminho mais acertado....

Bernardo Kolbl disse...

Sem 25's,bom dia e um abraço.

Amora Silvestre disse...

campeão das desigualdades?
não me digas nem me contes.
beijo

Espaços abertos.. disse...

Grande texto,magnífico pelas suas palavras onde dás grande destaque ao conceito que é a inclusão,fizestes uma optima síntese.

Bom feriado
Bjs Zita

Anónimo disse...

Olá Pai,

(Perdoem-me os utilizadores deste blog, por este post excessivamente pessoal, mas não resisti neste dia tão simbólico para alguns!)

É com orgulho que ao longo destes meses que te leio, por meio do afã quotidiano que é a minha vida. Mas leio-te! Ao ler-te obrigas-me a aquilo a que sempre me obrigaste - a questionar-me! E com isto a aprender!

Partilhamos muitas divergências sobre a maneira como vemos o mundo, e neste espaço nem sempre estou de acordo com o ponto de vista. No entanto encontro sempre em ti a profundidade e densidade dos valores da Liberdade, da Igualdade, e da Fraternidade!

Neste dia tão especial para tantos como tu buscam a verdade, apenas te quero dizer: Obrigado! E que a força das tuas palavras perdurem!

Um beijo,
Do teu filho

Gi disse...

Pêndulo,
Vim aqui só para dizer que tomei a liberdade de te "linkar" e perdi-me dea mores a ler a dedicatória do teu filho. Só por isto vale a pena continuar a acreditar e ter esperança no dia de amanhã.

Um beijinho. Já deixei aqui a minha pétala de cravo perfumado :)

disse...

Eles não aprendem.
A batalha da Democracia está ganha, podemos dize-lo.
Porque há 33 anos o povo saiu à rua e obrigou a que fosse esse o rumo a seguir.
Não nos obriguem a ir para a rua de novo.

Bandida disse...

se necessário acredito que iremos de novo para "a rua gritar"...

um cravo de Abril para ti!



B.
_______________________________

Nilson Barcelli disse...

As coisas estão mal, de facto, mas nunca estiveram melhor.
Mas o discurso já mudou, agora é a participação dos jovens e uma renovação nas comemorações do 25 de Abril.
Depois, virá outro discurso.
E daqui a uns anos, continuaremos na mesma, isto é, na cauda da Europa.
Porque, no fundo, não temos capacidade para muito mais. Evoluimos, mas os outros evoluem mais...
Um abraço.

Licínia Quitério disse...

Não podia passar este dia sem te deixar um especial abraço.
Que, apesar de todas as desilusões, nos continuemos pelo sonho sonhado e vivido!

Anónimo disse...

Talvez uma nova síntese esteja a nascer.
Mesmo aí. Onde menos se espera.
Por dentro de computador. Na imagem virtual.







Talvez....


________________beijo.





piano.

Amora Silvestre disse...

nasci com a liberdade, trouxe um cravo na mão e amor no coração.

Anónimo disse...

Amigo-irmão, neste espaço respiro um ar gostoso. Aqui as palavras não escondem. Aqui, sinto-me em casa. Deixo o meu abraço fraterno e outras palavras...

não
não existem
só por existir
as palavras
antes
sentir
sentimento
intenção
gesto
só depois
bem depois
as de não dizer
as de esconder
o sentir
sentimento
intenção
gesto
só depois
bem depois
...
o sol já ia alto
...
abril
aquele abril
não volta mais
...
hoje é moda
dançar o cravo
Che no vestuário
neorevolucionários
(de palavras natimortas)
de branco caiados
não nos túmulos
mentes
nas gavetas
pcs e armários
...
n’algum lugar
inda florescem
rosas
cravos
palavras
...
aqui!

(batista filho)

PintoRibeiro disse...

Sem tempo, a correr, passei para deixar um abraço,

JPD disse...

Os PR que antecederam Cavaco Silva em Belém, não fizeram o anúncio de «Cooperação Estratégica» mas não deixaram de avalizar o curso dos Executivos que foram dando posse. O segundo mandato de Soares, com Cavaco em S.Bento, etrá sido a excepção.

Estamos com dois anos de Governo e a obsessão pela redução do déficit prepondera.

A cooperação e o entendimento entre Belém e S.Bento parece interessar e satisfazer os interesses de ambos.

Quando no disurso de Belém desaparecer do discurso oficial esse desígnio da legislatura, ou muito me enganarei, nunca será porque a consolidação das contas se verificou.

Também ainda não li nada sobre o efeito que a baixa de impostos -- a sua quantificação -- teria sobre a redução do desemprego, sobre o crescimento da economia. Seria muito útil conhecer estimativas.

Um abraço

Bernardo Kolbl disse...

Bom fim de semana e um abraço.

CELEBRAÇÃO DO TRABALHO

  Ao centro a mesa alva sonho de linho distendido como altar ou cobertura imaculada sobre a pedra e a refeição parca… e copo com...