domingo, abril 01, 2007

Outras Personagens II - Rufina Amaya

Rufina Amaya foi a única sobrevivente do massacre dos habitantes da sua aldeia de El Mozote, durante a guerra civil, em El Salvador, de 1980 a 1992, entre o exército e milícias paramilitares governamentais e a guerrilha da “Frente Farabundo Marti para a Libertação Nacional”.

Durante a manhã do dia 11, até à tarde do dia 13, de Dezembro de 1981, homens, mulheres e crianças foram chacinados, pelo “Batalhão de Reacção Imediata Atlacatl”, treinado por instrutores norte-americanos para esse género de operações. No tempo de Reagan, convém lembrar...

Razões do massacre?!... O governo salvadorenho suspeitara que os guerrilheiros haviam recebido ajuda e esconderijo de alguns camponeses da região. Foi esse o “crime”, que os torcionários fizeram pagar com sangue...

Estima-se que mais de um milhar de pessoas tenham sido barbaramente assassinadas nessa operação militar. Segundo uma organização salvadorenha de protecção dos direitos humanos, dependente do Arcebispado de S. Salvador, foram exumados e identificados oitocentos e nove cadáveres, atirados para valas comuns.

Rufina Amaya escapou porque, na confusão da matança, escondeu-se nuns arbustos até os soldados se terem retirado.

- "Deus salvou-me porque precisava de alguém para contar a história ao mundo" – disse numa entrevista, em 1996.

Que de facto contou, apesar das diversas “sugestões” para estar calada...

Logo a seguir ao massacre, constara que alguma coisa de muito grave se tinha efectivamente passado. Jornalistas foram ao local e recolheram o testemunho de Rufina...

Os governos salvadorenho e norte-americano negaram os factos: o exército tinha efectuado uma operação na região e abatera algumas dezenas de guerrilheiros, mas não tocara em civis. Apenas isso. Mas Rufina não se calou...

Em EI Mozote, os soldados dividiram as pessoas em três grupos. Alguns dos homens foram decapitados, outros colocados em fila para a capela da aldeia. Aqueles que tentaram fugir, entre eles o marido de Rufina, foram abatidos a tiro e trucidados a golpes de facas de mato. Os restantes morreram, em chamas, na capela incendiada...

As mulheres e crianças foram fechadas nas casas da aldeia até chegar a sua vez: crianças para um lado, mulheres para outro. As mulheres mais novas foram violadas. E todas mortas a tiro...

Nem uma única criança ficou viva. Algumas atiradas ao ar e recebidas na ponta das baionetas. Foi assim que morreram...

Do seu esconderijo, Rufina viu tudo, incluindo a morte do marido, do filho de nove anos, gritando por ela e das três filhas do casal, de cinco e de três anos e de oito meses...

Durante algum tempo Washington e São Salvador insistiram em que a tropa apenas matara guerrilheiros, mas, em 1992, a exumação de corpos provou a barbárie... Rufina Amaya nunca desistiu em denunciar o horror!...

Entretanto, nas últimas semanas, milhares de pessoas têm visitado o International Center of Photograph, de Nova Iorque um "Trabalho de 30 fotógrafos em El Salvador", denunciando a selvajaria do exército e dos esquadrões da morte naquela guerra suja ...

Ao explicar a oportunidade da exposição, os promotores afirmaram que “a barbárie da guerra em El Salvador precisa ser melhor conhecida pelos americanos considerando o crescente envolvimento dos EUA no Iraque".

O exemplo de Rufina levado ao coração trevas?!...

Bom seria, pois se sabe que o Pentágono está a considerar a “normalização salvadorenha” como paradigma da guerra no Iraque e os veteranos da guerra suja em El Salvador são despachados para aquele país como conselheiros militares.

Rufina Amaya era católica e não uma “perigosa” marxista. De regresso a El Salvador, em 1990, foi diácono da Igreja Católica e dirigia, junto de El Mozote, grupos de reflexão. De perto e de longe ia gente a escutá-la.

Rufina Amaya morreu recentemente. Que ressuscite todos os dias no seu exemplo de dignidade e de coragem!...

Boa Páscoa!...

10 comentários:

António Melenas disse...

O capitalismo em geral e o seu maior expoente - O capitalismo imperialista americano - defende os seus interesses, aqualquer preço. Não recua perante quaisquer crimes.
umas vezes directamente, outras através dos seus capangas. A história dos últimos anos está repleta de atrocidades com esta.foi em Salvador, Foi no Chile, foi na Argentina, foi no Brasil, , foi na Guatemala foi na Indonésia, onde com o seu apoio o ditador Suharto, matou em poucas semanas mais de um milhão de pessoas que se opunham ao seu sangrento golpe de estado (ver a tal respeito o filme "O ano de Todos os Perigos")
Boa Páscoa e um abraço

Maria disse...

A melhor Páscoa que eu poderia ter era que este texto que acabei de ler fosse ficção. Fosse mentira. Fosse uma estória. Fosse uma invenção.
Mas é a verdade verdadeira.
Eu só pergunto: será que o Tribunal de Haia só olha para um lado? E se olha, será que vê?

A Páscoa possível, num abraço

Cris disse...

Queria que tudo isso fosse mentira, queria que não fosse isso e muito mais (que nem sequer sonhamos) que fazem sobressair apenas uma mãe, obrigada pela crueldade e barbarie humana, a denunciar o negro do coração humano. Aqui fica uma lágrima, e um coração encolhido.

M. disse...

Triste que o mundo seja tão perverso. Deixo a minha admiração por esta mulher corajosa que não teve medo de revelar as atrocidades de que foi testemunha.

M. disse...

Volto para desejar-te boa Páscoa. Com amêndoas de cores variadas, se as apreciares. Pelo menos são bonitas de se olhar.

António Melenas disse...

Quer dizer que fste de ferias
Um abraço
e Boa Páscoa

vida de vidro disse...

Os horrores deste mundo e enorme coragem de quem os denuncia. Um exemplo, sem dúvida. E o teu olhar sempre atento.
Tem uma Boa Páscoa. E volta breve. **

bettips disse...

Deixaste-me arrepiada...já te conhecia (reconheço o relógio antigo!) mas hoje li, mesmo tudo. O que a gente sabe mas aqui, preto no branco, melhor branco no azul. Só podemos gritar pela memória ...para que parem estas guerras ilícitas e disfarçadas de ...libertação! Um grande abraço e obrigada!

Anónimo disse...

Por aqui também há umas guerras!!

Maria P. disse...

Impressionante.

Um abraço*

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