quinta-feira, dezembro 09, 2010

Notas de Leitura


Com a chancela da editora Leya, na série “Cadernos de Investigação”, o juiz jubilado do Tribunal de Contas, Dr. Carlos Moreno, publicou recentemente o título em referência, que constitui um verdadeiro libelo contra a má gestão das Finanças Públicas, no decurso das últimas décadas, no nosso país.

Com autoridade do seu percurso como juiz do Tribunal de Contas e outras funções ao serviço da administração financeira do Estado, a que alia a docência em diversas Universidades, o autor demonstra nesta obra, de forma eloquente, que “o Estado não tem fatalmente que realizar negócios ruinosos com os privados".

Em linguagem simples e acessível, ao alcance de qualquer leitor, mesmo não iniciado nestas matérias, o autor, na primeira parte do livro, apresenta alguns conhecimentos gerais sobre finanças públicas, aclarando conceitos básicos, nem sempre bem conhecidos pela opinião pública e, o que é mais grave pela opinião publicada.

Remete, depois, o autor para a “gestão dos dinheiros públicos”, que deve ser exercida com observância da lei, de acordo com critérios de boa gestão e respeito pela concorrência, a transparência e a publicidade, em vista a “realização exclusiva de finalidades públicas”.

Por isso, considera o autor que, vinculada embora a critérios técnicos, a gestão financeira do Estado pode ser obrigada a afastar-se de conceitos de estrita racionalidade económica, porquanto “há valores sociais que se sobrepõem aos critérios da economia, da eficiência, e da eficácia”.

Salienta o autor que “em Portugal a regra tem sido um mau planeamento e quase tudo que é orçamento público falha estrondosamente (…)”, o que explica “que as previsões de custos das obras públicas chegam a derrapar 300%.”

Insiste o autor que a transparência das finanças públicas constitui hoje uma questão decisiva de rigor técnico e que nada justifica que uma parte cada vez maior da receita e despesas públicas, em especial a despesa de investimento público, escape ao Orçamento de Estado e assim ao controlo político do Parlamento e do conhecimento dos cidadãos.

Detém-se, posteriormente, sobre a importância do controlo público externo das finanças públicas, como “necessidade colectiva essencial, tal como o saneamento básico, as vias de comunicação, a polícia ou a justiça”; e, nesse quadro, refere o papel do Tribunal de Contas.

Os capítulos seguintes são uma denúncia viva e fundamentada do papel nefasto das ditas “Parcerias Público- Privadas (PPP), de que Portugal “é o campeão europeu”. O autor não hesita em afirmar que, na grande maioria das PPP, as entidades públicas responsáveis pela gestão dessas parcerias têm revelado “demasiada impreparação e leviandade”…

O autor passa pelo crivo da sua crítica empenhada os últimos “18 anos a cometer os mesmos erros”, apresentando as monstruosas derrapagens financeiras e os consequentes prejuízos para o erário público da “Concessão da Lusoponte”, a “Concessão da Fertagus”, as “SCUTs”, a “Concessão Metro Sul do Tejo”, as “PPP-Saúde”, o “Terminal de Contentores de Alcântara”, as “Subconcessões da Empresa Pública – Estradas de Portugal”, a “Renegociação das Concessões das SCUTs e apresenta uma súmula dos principais erros cometidos pelo Estado neste domínio das PPP.

O último capítulo é consagrado às “Derrapagens nas Obras Públicas”, onde se descrevem os “edificantes” casos da “Casa da Música”, a “Ponte Rainha Santa Isabel”, o “Túnel do Terreiro do Paço” e os “Estádios do Euro 2004”. A finalizar, o autor apresenta algumas propostas de “Como o Estado Pode Gastar Menos e Melhor”.
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Pela sua vigorosa denúncia das más práticas de gestão financeira do Estado, pelo acervo de informação, pelo proclamado propósito de prestigiar o serviço público, considero a publicação desta obra um serviço que se presta a comunidade e um brilhante exercício de pedagogia cívica.   

      




 

10 comentários:

Rogério G.V. Pereira disse...
Este comentário foi removido pelo autor.
jrd disse...

Excelente!
As tuas notas de leitura constituem uma boa sugestão para ler o livro e entender melhor como os Estado nos tira as "notas"
Abraço

lino disse...

Acho que vou comprar.
Abraço

Anónimo disse...

gasta mais o estado o nosso dinheiro do que nós :( uma leitura a ter! um grande beijinho*

São disse...

Lamento nenhuma editora estar interessada em mim, pois também tenho factos bem interessantes, rrss

Uma boa noite.

MagyMay disse...

Depois deste teu excelente resumo do livro em causa... resta, lê-lo na íntegra.

Beijo, Heretico

Rogério G.V. Pereira disse...

Meu caro fui eu que eliminei o primeiro comentário. Tinha uma imperdoável troca de nome o que eu queria escrever está aqui:

Ultimamente dou comigo a comprar livros que não leio (o último foi "O Caçador de Relampagos" do Eufrázio Filipe*). Este seu post fez-me tomar uma decisão que vinha adiando: Deixar de comprar jornais diários e utilizar esse tempo à leitura que me sugere e às que tenho atrasadas...

* http://mararavel.blogspot.com/2010/12/cacador-de-relampagos-contos.html

O Puma disse...

A tua sugestão é oportuna

porque o conteúdo sábio do livro
é uma intervenção cívica e democrática para melhor se entender
o chamado estado do país.

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Quanto ao Rogério
por bem utilizou o teu espaço
e não devia

Abraço

GP disse...

Os Governos têm-se governado muito bem à nossa custa. Razão tem o Medina Carreira quando diz que o Governo devia estar nas mãos de uma dona de casa. Se eu tivesse governado a minha vida como têm governado o país, há muito que estava à porta dos Congregados a pedir.
Pena que estes ladrões não sejam responsabilizados!

beijinho

jawaa disse...

Eu creio nos Portugueses ilustres e sérios que ainda existem e até sabem colocar o dedo na ferida, alguns bem jovens ainda e já tão lúcidos. Esporadicamente vejo um ou outro em programas usualmente tardios na TV, leio-os aqui e além.
Sabes que não sou radical, mas acredita que ainda me dão umas vaias de 68 e apetece-me, não tirar apenas o soutien, mas tirar tudo e pegar numa arma.
Todos, também os da esquerda que deveria ser despojada, quando chegam ao lugar certo têm um discurso repetitivo e vazio, como um padre na igreja a falar de deus tirando uma costela ao Adão.
Há muito quem saiba, muito quem diga as verdades deste pobre país corrupto até ao tutano, mas o medo é atávico, vem de antes de Salazar, vem da Inquisição o medo à fogueira.
Não prestamos, somos pior do que aquele pardal que caiu na m....!

Um abraço, bem hajas pela divulgação.

CELEBRAÇÃO DO TRABALHO

  Ao centro a mesa alva sonho de linho distendido como altar ou cobertura imaculada sobre a pedra e a refeição parca… e copo com...