segunda-feira, novembro 17, 2014

FRÉMITO DE INSUBMISSA HUMANIDADE...


Mais além cumes desérticos e eternas neves
No colapso dos dias. Veredas de solidão na vertigem
E no abismo das cidades onde a cólera em surdina
Compõe a sinfonia do medo. E os pombos tombam
Feridos pelo ar fétido que respiramos impudentes...

Efémeros despojos na pantalha são pretexto
Das bombas incendiárias que trazemos no olhar
Do grito dos passos nas calçadas e das gargantas
Mudas. Do terror gelado no sangue supérfluo
Que derramamos - pão incerto que nos roubam!...

Despimo-nos e vestimo-nos na nossa nudez frágil
Como se o arrepio da pele fosse fluidez de orgasmo
E as heras que nos habitam e entopem as veias
Fossem diapasão de verdade ou memória de destroços
A que nos agarramos pressurosos de eternidade...

Por isso a montanha e os gelos. O refúgio de pássaros
Deserdados. E de itinerários perdidos na distância
Dos dias verdadeiros. Por isso o sonho crepuscular
Rangendo estéril de tão perfeito. Canto desesperado
Que em vão ecoa. Praças e rios que se negam fugidios...

Antes a harmonia do caos. O declive das colinas.
A imperfeita palavra. E a poética sem rima. E a luz.
E a treva. O sal das lágrimas e a raiva. E o punho.
E o sabre. E o peito aberto. E o caminhar vagabundo.
E o sangue em frémito de insubmissa humanidade...


Manuel Veiga

12 comentários:

O Puma disse...

Excelente este teu caminhar vagabundo pelo equilíbrio assimétrico que nos convoca.
Abraço poeta

Ana Tapadas disse...

Antes o caos, que a harmonia das palavras impele para a reconstrução justa!

Beijo

Majo disse...

~
~ ~ Um lancinante e comovedor grito de desespero.

~ ~ Grata por dares voz à minha dor, Poeta.

GS disse...

Veemente, as palavras são 'marteladas' de desespero.

E, no entanto, a melodia rompe e pressente-se o sensivel ser.

beijo

MARILENE disse...

Do medo e do silêncio nada se colhe. A submissão falseia a harmonia. Abraço.

Andrea Liette disse...

A nudez da realidade-

e a poesia insubmissa!

Poema solene que nos adverte e espanta.

Um abraço.

George Sand disse...

Gostei muito desta insubmissão, totalmente insubmissa!
Gritos de insubmissão: precisam-se!

jrd disse...

Da raiva e da revolta e da persistência na luta. A tua Poesia é o combate.

Abraço meu irmão

Parapeito disse...

"E o sangue em frémito de insubmissa humanidade..."
È preciso acordar...
Gostei muito.
Brisas doces

© Piedade Araújo Sol (Pity) disse...

a poesia e o sangue do Poeta é sempre insubmisso

belo momento de poesia

beijinhos

:)

Lídia Borges disse...


É um grande poema! Daqueles que, de tão bem construídos, não permitem comentários.

Bj.

Lídia

MS disse...

Sempre intenso, insubmisso, o arauto do reino que vai mal...

Beijo afectuoso, Herético!

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