sexta-feira, janeiro 20, 2017

ÁGUAS BRAVIAS ...


Abre-se a paisagem ao horizonte
Em delírio de olhos desmedidos. Atmosferas recidivas
Como se foram ainda açucenas colhidas
E o regaço. E o joelho incauto desguarnecido.
E tu viesses com a leveza de águas
Em mandil de coado tempo.
Chuva miudinha
A regar emoções e desalinhar
A orla dos sentidos.

Ergo-me declinando o nome. Caminheiro que sou
Das devoções pagãs que me visitam,
Tão faceiras, que nelas me reinvento
Em néscio alvoroço.

E em ti caminho
Música que invento no declive de teu corpo
E ecos recolhidos. Toada de abismos
Em coleante rumo dos passos
E profundos rios.

Águas bravias
Em cascata de enredos
E mistérios.

Manuel Veiga


22 comentários:

vida entre margens disse...

A poesia é assim: emociona pela capacidade de criar mistério, pelo que é dito nas entrelinhas e por caber na realidade de cada um de nós.
Um poema imenso!

Desejo um excelente fim de semana.

LuísM Castanheira disse...

Olá, caro Veiga
Para acabar a semana, aqui deixa esta pérola, mas belas águas eróticas que, sendo bravias, despertam sentidos nos écos e trazem mistérios.
Um poema cheio. Gosto destas "devoções pagãs", que assaltam o poeta e o faz "mergulhar" em rios tão profundos (?).
(e sem se afogar...)
Um grande abraço,Amigo

Teresa Almeida disse...

Um poema que apetece caminhar. Melodia não lhe falta!

Beijinho.

Graça Alves disse...

Gosto muito!
Parabéns!
Bj

Suzete Brainer disse...

Muito belo poema, inscrito de paixão e amor. Ricas construções
imagéticas de confissões íntimas. A expressividade sensual ou
erótica fica mais bela quando existe elegância e o uso da linguagem
implícita apresentada excelentemente neste teu poema.

Um bom domingo na paz, meu amigo.
Um beijo.

Manuel Veiga disse...

Cristina,

bem vinda. sempre.
mas deixe que lhe diga que faço sempre o possível para que as linhas digam o mesmo que as interlinhas...

beijo

Manuel Veiga disse...

Luis, caro amigo

sei lá porque caprichosa associação de ideias o teu comentário lembra-me a celebérrima Ceia dos Cardeais, do não menos célebre Júlio Dantas (PUM!)
- " E Vossa Eminência também amou! " - tal a tua surpresa.

e o pobre Cardeal, com os olhos em alvo, batendo no peito:
- "Oh, se amei! pode lá viver-se sem ter amado um dia..."

ora aqui tens! Pim, Pam, Pum!

forte abraço

Manuel Veiga disse...

Teresa,

a melodia do poema até permite dançar.

ironia à parte, quero dizer-te quanto me é grata a tua presença amiga.
as paisagens que nos visitam são as mesmas.

beijo

Manuel Veiga disse...

Graça.

é sempre um prazer vê-la por aqui.
prezo muito a tua poesia.

beijo

Manuel Veiga disse...

Suzete,

receio bem, minha amiga, que a "paixão e o amor" as "confissões íntimas" e a "expressividade sensual ou erótica" não seja mais que a "metafórica" forma de dizer as "devoções pagãs", a que o poeta humanamente não resiste.

sendo elas (as devoções pagãs) tão discretas não merecem certamente tão expressivo comentário.

razão redobrada para agradecer as tuas magnânimas palavras

beijo

Odete Ferreira disse...

No mesmo compasso, a paixão, a reverência e a irreverência. E isto é, para mim, o amor e o sentido de amar, excelentemente colocado em verso.
E, se não fosse mistério, como explicar a atração (fatal)?
BJ, Manuel 😊

Graça Pires disse...

Fiquei presa nestas "Águas bravias em cascata de enredos e mistérios".
Que mais acrescentar, Amigo?
Um beijo.

Manuel Veiga disse...

Odete,

fico grato pelo teu esclarecido comentário.
dele retenho a ideia do "sentido de amar" que tão bem exprimes.
de facto, "o sentido de amar" degrada-se, hoje em dia, tantas vezes, em exacerbadas
e fugazes emoções, facilmente descartáveis.

beijo, minha amiga

Manuel Veiga disse...

Graça,

tu não precisas dizer nada.
a tua presença é eloquente. sempre.

beijo, minha Amiga

LuísM Castanheira disse...

Manuel, caríssimo:

Que maravilhosa, amigo, esta sua associação de ideias.
(pim, pam, pum: a resposta a cada um).
"Pode ser fina a espada; a frase é mais ainda", dizia o velho cardeal de Montmorency.

Surpresa, sim, é (foi) a subtileza do poema na erudita escrita.

Quando formos 'velhinhos cardeais' saberemos o quanto amamos, e eu não possa dizer:
- “Foi ele, de nós três, o único que amou”.

Um abraço, Manuel e uma boa semana .

Manuel Veiga disse...

Luís, meu caro amigo

em tua florentina escrita não encontro mácula.
mas não vejas erudição onde apenas os sentidos (e os afectos) reinam.

abraço

José Carlos Sant Anna disse...

Águas bravias... Elemento fecundante. Nela o poeta mergulha para renascer envolto em cascatas de enredos e mistérios. Dessa água procede e se alimenta a vida e se faz o poema, reinventando a palavra. Outro poema que nos aprisiona.
Forte abraço, poeta!

Genny Xavier disse...

Poeta,

As palavras marcam os sentidos...como texturas, sabores, sons, visões...sinestesias dos afetos...

Beijo,
Genny

Manuel Veiga disse...

José Carlos, caro amigo

privilégio meu, o teu olhar de Poeta sobre o meu poema
aclarando alguns de seus "enredos e mistérios"

abraço. grato


Manuel Veiga disse...

Genny, minha amiga

é muito generosa comigo. grato
as suas palavras acrescentam. sempre.
nunca diminuem.

beijo

Agostinho disse...

"A regar emoções e desalinhar a orla dos sentidos" sempre a reinventar os momentos como sefossem primeiros.
O poema respira a magnífica aventura. Em todos os sentidos.
Abraço.

jrd disse...

Na torrente do poema desafias a cascata que te inunda os sentidos.

Abraço meu irmão poeta

CELEBRAÇÃO DO TRABALHO

  Ao centro a mesa alva sonho de linho distendido como altar ou cobertura imaculada sobre a pedra e a refeição parca… e copo com...