terça-feira, fevereiro 07, 2017

Em Louvor de Lydia III


Cai a tarde, Lydia, e com ela se recolhem
Os raios de luz fria, simulacro dos dias claros
E quentes. Canto de cotovia suspenso
Na brisa que foi afago e agora queima
No silêncio de nossos dedos festivos
Abandonados no regaço, como pétalas
Que perderam o rumo do caule.

E, no entanto, o sol é o mesmo. E o azul
Tão nítido que fere, de luz, os olhos.

O rio passa, Lydia. Sempre. Com seu caudal
A inundar as margens, indiferente
À cotovia e ao melro.

Ou ao piar desconchavado
Do mocho. E seus augúrios. Em poema
Mal urdido.

Festejemos a glória de sermos. E deixemos que o rio siga.
Sem mágoa. E simulemos o beijo, Lydia! Isso basta,
Neste Agora. E aconcheguemos os corpos transidos
Que das estepes frias, o vento gélido
E a flor da memória
Em chamas.

 Manuel Veiga


Lydia é criação literária de Ricardo Reis

~

12 comentários:

Ana Tapadas disse...

Sabes como gosto destes poemas a Lydia...herdeira do meu amigo Reis!
belíssimo.

Beijo

Teresa Almeida disse...

Um poema que nos aconchega a uma nostalgia saboreada. E o amor, na arte do poeta, sobrevive em glória.
Deixo-te um louvor, caro amigo.
É um poema precioso.

Beijinho.

Tais Luso de Carvalho disse...

E, no entanto, o sol é o mesmo. E o azul
Tão nítido que fere, de luz, os olhos.


E que bela música com esse bailado de nuvens!
Poema lindo e música se encaixam perfeitamente.
Que bom que você está guardando os vídeos no blog.

Beijos, amigo,
Uma boa semana.

LuísM Castanheira disse...

Meu amigo, Manuel

Já li, uma, duas, três vezes e nem sei como hei-de comentar...
(dizem que a poesia não se comenta)
O que eu posso dizer-te é que é deslumbrante a tua escrita.
Se me pemites, retenho:
"...No silêncio de nossos dedos festivos
Abandonados no regaço, como pétalas
Que perderam o rumo do caule."[...].
Quem, das raízes deste poema, pudesse olhar o céu, descobriria o teu 'azul' sem os olhos 'ferir'.
Gostei mesmo muito...

Um abração




LuísM Castanheira disse...

* se me permitires, gostava de o 'levar' para perto...

deep disse...

Belo este discorrer poético com sabor a Reis e a Sophia. :)

Genny Xavier disse...

Versos saboreados na frescura das águas do rio que segue... belo, poeta, muito belo!

Beijo,
Genny

Odete Ferreira disse...

Bem no espírito da criação de Lydia.
Contudo, a tua Lydia, é diferente, pois que a ela, e só a ela, pertence o olhar lírico dos teus verdes, dos teus azuis e dos dias claros.
Belíssimo e sedutor remanso. Como água de rios (nossos).
BJ, amigo 😊

Suzete Brainer disse...

Lydia, criação literária de Ricardo Reis (Grande Pessoa...)
e a tua recriação num patamar de arte poética.
Excelente e numa inspiração de rara beleza.
Pura harmonia num todo de arte, com o vídeo-música
escolhido.
Apreciei muito!
Bj.

Graça Alves disse...

Como é exímio nestas revisitações a Ricardo Reis!
Bjs

Agostinho disse...

A beleza dos versos de MV vem do tom sereno com que conjuga o verbo. No amar de Lydia há uma réstia de ternura penumbrosa e portadas de janela cerradas.
Abraço.

José Carlos Sant Anna disse...

Ah! essa Lídia na verdade de existir sob a tua pena. "Isso basta!"
Forte abraço, meu caro Manuel.

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