sexta-feira, fevereiro 03, 2017

SORRISO DE PÃ - Em Música de Fundo


Do olhar à paisagem a coleante demora
E a esquiva cor. Neblinas acesas
A despenharem-se nas arribas.
Aladas. Como beijos desfeitos. E o vale
Corpo de mulher…

Potros selvagens. E líquidas promessas.
Orvalhos peregrinos assim expostos
De pétala em pétala. Silvestre a flor.
E os impossíveis dedos. A macerar a pele.

Alaga- se o dia. E o perfume na madura
Polpa. E os lábios murmúrio de água.

Destila o sol por entre nuvens. E a brisa
Agora desperta é toada. E o poeta
Medianeiro. E eco do alvoroço.
E de seus passos.

Sorriso de Pã. Em música de fundo.


Manuel Veiga   





10 comentários:

luisa disse...

Dá para ver a paisagem. Como numa tela.

José Carlos Sant Anna disse...

Dá para ver a paisagem, é verdade, como diz Luísa.
Talvez possamos dizer a partir desta constatação que o campo semântico que predomina é o da "pintura". Mas o que importa é a capacidade do poeta de nomear com uma dicção perfeita este sorriso que, para nossa alegria, o poeta alcança e partilha.
Retribuo o caloroso abraço, meu caro amigo!

Teresa Almeida disse...

... e assim toda a melodia se torna pagã e pura.

Parabéns, Manuel.

Beijinho.

Genny Xavier disse...

O poema salta aos olhos e aos sentidos todos...cores,texturas, perfumes, sonoridades, sabores...e, ainda, a verve das suas palavras manifesta-se além da imagem...paisagem: metáfora do ser...


Bom final de semana, poeta.
Genny

LuísM Castanheira disse...

A explicação do sorriso na paisagem pintada, qual tela, em pinceladas precisas, apesar da '...esquiva cor'.
Também, em neblinas invernais, há beleza nas cores e o poeta/'pintor' dá-nos a amplitude duma escrita deveras sublime.
Cada poema é um hino, cada palavra é um ninho onde se alimentam os sonhos.
Parabéns, Manuel
Como sempre, um forte abraço

Pata Negra disse...

Nós somos a paisagem quando a sentimos. Infelizmente os nossos deuses nunca sorriram como os dos gregos. Em conclusão façamos os deuses gregos nossos, vivamos na floresta e viremos costas aos santos e arcanjos e às cidades.
Mais do que ser poeta, sempre tive orgulhos de ter amigos poetas e ainda mais se forem manuéis.

Um abraço verso

Odete Ferreira disse...

Tens razão, o poeta é um medianeiro, com uma função primordial (e a marcar o intemporal): captar o olhar das coisas e deixar nas palavras o seu olhar de espanto e nelas se comprazer. Epicuro ficaria orgulhoso de tão fiel seguidor. E claro que Pã encontraria, neste poema, a legitimidade da sua existência.
BJ, amigo 😊

Agostinho disse...

O primeiro verso, por si só, vale um poema!
A inteireza do trajecto, sem pôr os pés no chão, é uma dança sensual, e, seguem-se as emoções mais carnais, força incontida, na fala encantaria do poeta. Quase apostava, eu, que não pinto, que pelas declivosas vertentes subia o perfume das maresias.
Quem tocou a flauta?
Abraço.

Manuel Veiga disse...

errado! meu caro Agostinho

perfume a madressilva!

abraço

Graça Alves disse...

Maravilha sempre os meus sentidos, esta sua poesia!
Bj

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