domingo, outubro 29, 2017

Apenas a Curva da Tarde....


Nada. Absolutamente nada
Na vibração da tarde. Apenas o caprichoso melro
A saltitar de galho em galho
E um rio cá dentro...

E o céu a abrir-se na miragem
E o assédio da ave…

E o queixume do cello a lamber o ar…

Nada. Absolutamente nada!
Apenas curva da tarde a arder em febre
De lume e mar…


Manuel Veiga

sexta-feira, outubro 27, 2017

FRAGMENTOS L


Apressemos então os passos, Maria Adelaide e desembaracemos de África, que a narrativa, em que nos fingimos vida, por nós reclama e pelas veredas da escrita havemos de chegar ao afago que fomos, reviver ainda alguns momentos colhidos em contramão e cujo eco ainda vibra, como acordes longínquas de uma sonata e a dolência do violoncelo, a desenhar, no íntimo, as emoções que foram e que ambos sabemos memória reinventada.

De resto, que fazemos em Africa? Temos nossas contas ajustadas com África, tu que a vida narrada de Dona Rosalinda te permitiu espreitar para a tua própria vida e resolver o enigma de teu nascimento, pacificando a tua angústia, permitindo-te sublimar o amor de mãe, que não tiveste, no amor de mãe que te preenche. E, de facto, que te importa a ti, Maria Adelaide, a Tabanca, a degradação da situação militar, os bombardeamentos cada vez mais frequentes e intensos, as operações de patrulhamento, os dias contados pelos dedos dos militares da Companhia de Cavalaria, a dois meses da “peluda”? Um universo de causar tédio, sem qualquer claridade que possa acrescentar entendimento aos lances desta narrativa, que já de si, dizes entediante. 

Deixemos pois África e evoquemos nossos passos, num tempo outro, de refluxo de promessas revolucionárias, ali à mão de colher, “um pouco azul e seria Céu”, tempos que se finaram “capelas imperfeitas”, e “revolução inacabada”, tempos assim, então, de refluxo e apascentação de ócios, num anódino Departamento da Administração Central do Estado, tu eras quem eras, que dizer, mulher de teu marido, a enfileirar, com algum sucesso, nas hostes do novo poder político e o Alferes, que alferes já não era, mas um jovem licenciado em Direito, comunista, a que o zelo apostólico-político do Director Geral, nem um papel na secretária lhe consentia que justificasse o horário e o vencimento e que, por isso, tal secretária e tais ócios, os meus e os teus, melhor foram ocupados, em vez dos burocráticos papéis, pela graciosidade da exibição de tuas pernas, quando, num gesto de distraída “coquetterie”, sobre a mesa te sentavas, inflamando o olhar e os sentidos de teu novel amigo, pária que fosse para o Director Geral, no entanto, para ti um “must”, que nunca conheceras um comunista “assim tão perto”, de tal jeito que se, de África e da guerra colonial houvera traumas, nessa tua dádiva e no encruzamento de nossas vidas (e descruzamento de pernas), tais traumas se evaporariam.

Sim, é verdade, por África nossa, de guerra e batalhas outras, travadas na luta corpo a corpo pela sobrevivência física e de superação anímica, forjando o carácter e arrostando riscos maiores que os medos, calando fundo afectos, rostos, lugares, pedras, cheiros e sons que eram os seus e ainda hoje permanecem como uma segunda pele, nessa dialéctica entre o que somos a aquilo em que nos transformamos, nesse indizível tempo de todas as esperanças, dele e dos outros, algumas bem mais largas que seus ombros, nesse fruste lugar da guerra e vidas roubadas, por essa África, Terra-Mãe ubérrima e madrasta de seus filhos, nessa macabra dança dos homens e seu destino, nesse acaso ou nesse acinte da sorte, nessa generosidade imaculada e nessa amizade impoluta, o Alferes perdeu o seu irmão de armas, que irmão de sangue nunca teve e cuja morte, a dois de dias de regresso, ficará para sempre como eco de uma balada (nunca cantada) e o gesto tão eloquente de “acender no seu, o meu cigarro”.

Adivinho-te, Maria Adelaide, sei que te escalda a pergunta nos lábios “mas para que serve agora, num momento em que é suposto abandonarmos África e a Tabanca este repisar de uma amizade, dita e redita, com o Valentim? Apenas o teu gosto de remoer, como serpente mordendo a cauda, numa insensatez amarga que te consome sem que nada possas fazer para alterar os dias ardidos. Há mais vida para além da vida vivida, apressa-te por isso, antes que fiques prisioneiro de ti próprio, dentro desse redemoinho em que te comprazes, quando a tua lucidez fica embotada na morbidez de uma culpa sem motivo. O Valentim morreu por que assim estava escrito, não por que, em teu lugar, se ofereceu a evitar-te uma situação, que ambos sabiam ser-te incómoda, sendo que tu próprio farias o mesmo, no caso de uma situação inversa. Esquece por isso esses momentos dramáticos da morte de teu amigo, que nada, nem ninguém pode desfazer, pois que vida é para sorver nos momentos bons e cuidar, sem amargura, os momentos maus! Anima-te, meu amigo, há um tempo, lá atrás, de um beijo suspenso e um livro roubado que exijo, nessa ardência de corpos, que então éramos.”

“Sim, sim, Maria Adelaide, voltaremos, breve que seja, aos lugares onde fomos felizes, a essa impetuosa entrega, a essa dádiva pagã de nossos corpos, a esse tempo sem tempo que fingimos e, fingido somos, no milagre das palavras em que nos inventamos. Mas antes deixa que escorra a ferida, como punção dolorosa, mas tão necessária, para sarar o sofrimento e, por escassos momentos, reinventemos, nas palavras em que nos jogamos, os últimos dias da Companhia de Cavalaria, em Bissau, de regresso a Lisboa.
Sem esses momentos de escrita, toda a narrativa seria maculada de traição a uma amizade e não seriam dignas de nós, nem palavras em que nos jogamos, nem os reflexos de vida, que nunca seremos”.

O “Quartel da Amura”, instalado na fortaleza com o mesmo nome, à entrada do Rio Geba, em Bissau, que, outrora fora entreposto do comércio de escravos, era agora entreposto de chegada e partida de tropas, mistura de insígnias e militares em trânsito, ostentando fardamentos diversos, conforme o destino de cada unidade militar, de “camuflado” os militares na eminência de seguirem para o mato, invejando, por antecipação, os que estavam de partida, outros, com farda de caqui, amarelo-torrado, ou seja, os militares em gozo de férias ou em trânsito para embarcarem rumo à “peluda”, misturados com o traje civil dos oficiais e sargentos, em regime de fim-de-semana, ou em gozo de férias, pontuada a diversidade de fardamentos, aqui e ali, por uma farda branca de algum marinheiro em qualquer diligência, ou, até mesmo, um ou outro oficial do Exército, envergando a farda branca, por uma qualquer razão protocolar.

Um verdadeiro bric-à-brac de fardas e atitudes militares, pois que, como bem se sabe, conforme uma paisaníssima regra, o que nos cobre o corpo, de cada um “fala”, regra de tal forma verdadeira que contamina o próprio status militar, certos de que na sociedade civil ou na sociedade militar, tal regra deslassa na exacta medida em que se sobe na hierarquia, no estatuto e no “lugar social”, em que cada um se veste (ou despe, também).

A dois dias de embarcar para Lisboa, a Companhia era pois viva excitação. Os Oficiais e Sargentos, libertos de obrigações militares que não fossem as de rotina e reduzidas ao mínimo, passavam as horas fora do quartel, vestidos à civil, apascentando as horas, bebendo cerveja e aqueles outros mais dados a fixar recordações, fazendo fotos e comprado souvenires. As praças, está bom de ver, seguiam percurso paralelo aos oficiais e sargentos, limitados, como é certo, à sua condição básica, isto é, obrigadas à autorização de saída e ao recolher obrigatório.

Também o Alferes, adjunto do Comandante da Companhia de Cavalaria, por acaso de graduação militar e herói a contragosto desta narrativa a fazer que anda mas não anda, qual cavalo em trote em picadeiro, conforme as judiciosas opiniões de Maria Adelaide, licenciada em Línguas e Literatura Modernas, também o Alferes, Adjunto do Comandante da Companhia de Cavalaria estava desejoso por se libertar da farda e apressar os dias da “peluda”, mas ossos de ofício são mesmo ossos, quer dizer, não há forma de os evitar que não seja roê-los, de tal sorte que o Alferes, enquanto seus camaradas de armas “queimavam os últimos cartuchos” quer dizer, despendiam os últimos “pesos” e as últimas horas, na moleza descontraída, das ruas de Bissau, colhendo as últimas imagens e arrecadando as últimas emoções de África, o Alferes, herói a contragosto desta narrativa, estava amarrado à sua condição e múnus de Adjunto do Comandante da Companhia, sobre quem impendia, em primeira instância, a elaboração de relatórios diversos, descrevendo a situação militar na Tabanca, que, depois de ler, reler e assinar o Capitão Mascarenhas levaria ao Comando de Batalhão e daí para o Quartel-general e também garantir a adequada apresentação das contas e espólio de equipamento e armamento, a cargo do 1º Sargento, Chefe de Secretaria, adjuvado pelo Furriel Miliciano amanuense, pois já se sabe que, subsidiários à carreira militar de Oficiais e Sargentos do “quadro permanente”, os milicianos, fossem eles graduados em Alferes, na classe dos oficiais, ou Furriéis, na classe de sargentos, seriam eles a roer os ossos de ofício, para glória do Exército e lustro da Pátria.

Não havia pois maneira do Alferes apressar a “peluda,” agarrado que estava, por dever de ofício e ordens expressas do Capitão Mascarenhas, aos exigentes trâmites e tarefas administrativo-militares, que o regresso da Companhia de Cavalaria a Lisboa, finda a comissão de serviço, requeriam com a força e a urgência das marés e das águas do rio Geba a marcarem a hora de embarque. E, no entanto, bem sabia o Alferes que, algures na cidade, passado o eixo de pouco mais que um quilómetro de via alcatroada, nas bermas do qual se erguiam umas moradias de tipo europeu, passada a Praça do Império, espaço ajardinado, dominado pelo Palácio do Governador, nessa zona de transição, metros adiante, onde a dominância branca acaba e o crioulo começa, se erguia, em sólida arquitectura europeia, a Pensão Estrela de que Dona Rosalinda, era proprietária e gestora única e que bem poderia ser graduada em “instituição de serviço público e quiçá condecorada com a Cruz de Guerra, tão relevantes os serviços prestados à Pátria, como depósito de ejaculações e sofá psiquiátrico que, qual penso rápido, se não cura, pelo menos conforta e esconde a ferida. Enfim, desejava ardentemente o Alferes despedir-se de Dona Rosalinda, não por qualquer apetite de suas carnes flácidas, mas por que o jovem Alferes não podia esquecer que a milhares de quilómetros do gineceu familiar, em que fora criado e dos cuidados e bênçãos de sua Mãe e de suas santas Tias, ambas solteiras e virgens e zeladoras do Santíssimo Sacramento, não podia o Alferes esquecer, que algures no Mundo, num buraco negro de sua vida, uma outra Mulher sofrida, mundana e generosa, amaciou seus dias, com desvelo e carinho, e o protegeu com suas devoções e saciou seu corpo e apaziguou seu sangue, e lhe deu ânimo e afectuosos conselhos, sem os quais os primeiros tempos na Tabanca seriam porventura marcados pelo registo da Derrota. Como poderá, pois, o Alferes, mesmo em memória calcinada e de recriação do tempo vivido, num tempo, que sem rebuço, se quer literário, como poderá assim, dessas mulheres, fazer escolha de afectos, se todas elas o quiseram como filho? “Que lindo és meu filho!...” assim o quisera Dona Rosalinda, na mesma maternal ternura de passar os dedos nos seus cabelos. Julguem o Alferes, todos aqueles que, do amor de Mulher, lhe espartilham as águas …

Andava, por isso, o Alferes descorçoado. Ainda tentou uma abordagem ao Capitão Mascarenhas, que cortou cerce “nem pensar nisso, nem duas horas nem cinco minutos, você Alferes Viegas, sabe muito bem que é aqui indispensável…”. O máximo que arrancou ao Capitão Mascarenhas foi autorização para o Valentim ir em seu lugar e poder utilizar o jeep, atribuído ao Comando de Companhia. “Se ele que ir que vá e pode levar o jeep, sim”, rematou o capitão Mascarenhas, remetendo-se de imediato a outro qualquer assunto.

E o Valentim, foi. Por razões de fraterna amizade e por outras bem suas, a que não eram estranhas, certamente as notícias de que Dona Rosalinda renovara o elenco de meninas residentes.

(Continua)


Manuel Veiga

quarta-feira, outubro 25, 2017

Devoto de Meus Altares


 De sons longínquos recolho o eco e deles
Faço cítara em meus dedos. Que de minhas dores
Não sei. Nem de medida que me meça
Peregrino eu sou. E devoto de meus altares.
Nunca aio. Ou súbdito.

E a bruma que em meus olhos
Se desvanece assume então a forma de um veleiro
Que nas procelas se enfurece e vai além  
Das rotas. E amacia os ventos bem sabendo
Do furor das tempestades.

E perdulário de sonhos desenha o perfil
Das enseadas e das margens e dos portos
Em que altaneiro se despoja.

E festivo se incendeia!


Manuel Veiga

sábado, outubro 21, 2017

Cinzel de Fogo...


Gota a gota o calcário
A desprender-se da água. Murmúrio
Sobre pedra lisa. Estátuas frias
A correr por dentro.

Desenho de improváveis dedos
Num arpejo. Crisálida e ponto-fuga
A organizar o Acaso

Asas de pedra. E cinzel de fogo.
E o sopro indizível. Nome sem nome
No devir das ocultas formas.

Cântico mudo das coisas
E o gesto demiúrgico.

E a magia Palavra
A iluminar
O Mundo.

Manuel Veiga


quinta-feira, outubro 19, 2017

Nos Esteios do Sangue


Nos esteios do sangue e nas telúricas vozes
Que em nós habitam.
Nas profundas águas
E no altar das rochas
Tresmalhadas
No zénite do sol
E nos pomares e
Nos veios
Líquidos.

E nos cheiros da terra lavrada
E nas marcas da vara tempo
E nos nossos rios.

E nos lábios ressequidos
E na sede de mil anos
A acicatar os passos.

E nos lutos. E no silêncio dos sinos.
E no estrondo das festas
E nos arraiais festivos
E nas antigas
Danças.

E no corpete das raparigas
E nos lenços bordados
E nas gargalhadas
E nas brigas.
E nos dias ardidos
E naqueles outros pregoeiros

Te nomeio, Terra, Língua, Mátria
E te venero
E te guardo
E te digo

Gesto em que me rendo
E me entrego
E deslasso
Meu olhar
Altivo.

Manuel Veiga

"Caligrafia Íntima"
POÉTICA Edições - Maio 2017

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Porque sim!
E porque alguns amigos mostraram desejo nisso
Está reaberta a caixa de comentários!

Sejam bem vindos! De novo...


segunda-feira, outubro 16, 2017

INUMANOS DEDOS...


Em cada ausência uma dor viva
Um adeus que se prende num gesto de alvorada
Uma persistência ou teima
Uma duna ou um deserto a clamar
Mais além e a miragem …

Em cada ausência um rosto que se recria
Inumanos dedos a percorrer
As faces da memória
E os ecos …

Como palavra acesa
A mutilação dos corpos…


Manuel Veiga

sexta-feira, outubro 13, 2017

À FLOR DE NADA...


Em todos os silêncios
Uma vibração insuspeita
Uma linha distendida
Um acorde por abrir
Ou uma promessa
Apenas larva…

E um eco da memória
A persistir na teima
Uma caligrafia
Que assoma
Um sopro
À flor de nada…

Ou fonema vazio
Ou uma espera muda
A desenhar-se
Palavra…


Manuel Veiga


quarta-feira, outubro 11, 2017

ÀS PORTAS DA CIDADE...


Às portas da cidade rarefeita por onde
Os lobos marcam lá dentro a paisagem em seu registo de sangue
E ódio e se devoram senhores do tempo
E os cães famélicos são apenas os restos do banquete
E da apoteose da morte...

Às portas da cidade por onde o grito se perfila
E os rodízios e as alavancas gemem num chiar de surdos
E o canto se entope nas gargantas. E pela milésima vez
Bandeiras esfarrapadas cobrem as chagas
Expostas como fístulas poluídas...

Às portas da cidade onde fervem as vitórias e todas
As desistências são possíveis e os heroísmos são verso e reverso
De tudo ou nada. E os homens se reconhecem
E são barro ou aço na dimensão comum do seu destino
E da entrega à incerteza e ao sobressalto...

Às portas da cidade por onde um poeta sem nome
E sem glória aclara a voz com cítara desajeitada
E recolhe os salvados de todos os naufrágios
E com eles as dores e as fomes descarnadas que se perfilam
Num deserto de agonia trágica...

Aí nesse mítico lugar de batalhas destroçadas e de furtivas
Esperas. Aí às portas da cidade por onde corre o sangue
Fermente e o medo se fecunda no rugir dos ferros e dos ventos.
Aí nesse mítico lugar solto meu grito de guerra e me jogo
Farrapo de azul vertido nas velas rasgadas de um qualquer
Moinho perdido no horizonte dos dias...


Manuel Veiga


"Poemas Cativos" - Poética Edições - Maio 2014

sábado, outubro 07, 2017

FRGMENTOS XLIX - Continuação


O General procurava ser cordial com os milicianos, pois bem sabia que o objectivo da sua visita à Tabanca, por enquanto não revelado, mas apenas sugerido, em diálogo um pouco cifrado e tenso, com o capitão Mascarenhas exigia, não apenas a adesão do Comandante da Companhia, que por maiores que fossem as objecções não deixaria, certamente, de encontrar forma de o convencer, pois mesmo entre oficiais da mesma arma, General é general e Capitão é capitão e são os generais que determinam, degrau a degrau, a carreira dos oficiais sob seu comando e qual o oficial de carreira, que admita enjeitar mais uma insígnia no doirado dos seus galões, de forma que, possuindo o General Comandante em Chefe, argumentos considerados irrecusáveis para o Capitão Mascarenhas, havia também que convencer os oficiais milicianos que obedeciam a outra lógica de aspirações, não de promoção e carreira, mas à lógica da “peluda”, isto é, a lógica de safarem o pêlo e saírem daquele buraco negro das suas vidas para regressarem, sãos e salvos, ao seio de suas famílias e ao afago de seus sonhos.

O ambiente à mesa, sem ser hostil, era, assim, um tanto ou quanto soturno e embaraçoso para o Capitão Mascarenhas, que gostaria que os seus oficiais milicianos se comportassem perante o General como verdadeiros oficiais de cavalaria, desembaraçados, tanto na caserna, como nos salões, ressalvando naturalmente as distâncias que vão da vivenda de Dona Rosalinda, naquele cú do Mundo que a Tabanca era, aos galantes serões da Papa Alferes, que lá atrás ficou, moída de amores pelo Alferes, que ainda não era, mas apenas Aspirante, acabadinho de chegar da Escola Prática de Cavalaria, literalmente filado pela menina Gertrudes, conhecida por todo o Regimento por Papa Alferes e varrido de sua casa, pelo zelo familiar de sua augusta Tia, senhora de respeito e excelsas virtudes, em circunstâncias sobejamente narradas e que para aqui não são chamadas.

Perante o pesado silêncio, o General, porém, não se dava por achado. Percorreu um a um todos os oficiais milicianos, indagando de suas vidas e projectos de futuro depois de cumprirem o seu dever de defesa da Pátria, ameaçada pelo comunismo internacional, começando pelo Alferes médico, “Cartuchadas”, único casado e uma filhota de meses, medroso que nem um rato, mas que do medo fazia coragem, quando em campanha, debaixo de fogo cerrado, algum militar requeria cuidados médicos, excelente médico, bom amigo e exemplar camarada e lá foi respondendo fixando o General e calando mais agreste resposta que era médico obstetra e que outra coisa que desejava senão ajudar a vida a nascer e as crianças a crescerem saudáveis e o General a engolir em seco, a passar adiante e a desejar felicidades e a inquirir o Barbas, lisboeta, filho de um pequeno industrial, dotado de assinalável “savoir faire” que lhe permitia quase sempre passar incólume por entre os pingos da chuva, que se limitou ao “politicamente correcto” e, sublinhando as palavras com o seu melhor sorriso, quase num gracejo, esclareceu que quando chegasse a Lisboa pensaria no assunto, que por enquanto esperava que os dias passassem e o General afagando a dupla queixada, ora aqui está o que se chama bom senso, mas meu rapaz – o General assume-se paternal e, sibilino, acrescenta – porém, os grandes homens não esperam que os dias aconteçam, fazem acontecer os dias e, sob o olhar circunspecto do capitão Mascarenhas, prosseguiu o General a sua ronda pelos oficiais milicianos, agora a vez do Valentim e a fala desabrida e seca serei professor de História, se sair inteiro desta merda e a admoestação do Capitão Mascarenhas nosso Alferes contenha-se, que não se toleram faltas de respeito e General contemporizador não ligue, Mascarenhas ao destempero do nosso Alferes, você sabe quanto aprecio cavalos e os homens e os cavalos querem-se de sangue quente e como um vago sorriso, sem mais olhar o Valentim, prosseguiu a ronda, agora a vez do Berros da Selva, a ostentar a braçadeira vermelha de “Oficial de Dia”, e de faces tão vermelhas quanto a braçadeira, tal o momento glorioso, proclamou, como quem decreta meu General, depois desta comissão de serviço, ofereço-me no Exército para nova Comissão, pois desejo prosseguir a carreira militar e o General alargando o sorriso e será bem-vindo à Família Militar, nosso Alferes, a Pátria necessita de homens como o senhor, que não do regateiam a generosidade do seu sacrifício e do seu sangue, se for necessário.

O General filara a sua presa, de forma que foi quase a despachar que fechou a ronda pelos oficiais milicianos e se prestou a ouvir o Alferes Adjunto do Comandante da Companhia de Cavalaria, por acaso de graduação militar, que, sentado ao lado do Capitão, fechava círculo e, portanto, o último a falar e, à sacramental pergunta, respondeu que frequentava a Faculdade de Direito e esperava em breve terminar o curso e exercer a sua profissão de jurista, não sabendo ainda se como Magistrado Judicial, se como Advogado e o General, até então, sem mais largar o Berros da Selva, olhou com interesse o ocasional interlocutor, herói a contragosto desta mal cerzida narrativa ora aí está uma profissão que tem todo o meu apreço – aos juristas se deve o ordenamento e a disciplina das sociedades! E o Alferes, num vago sorriso, quase num murmúrio, como se falasse para si próprio a verdadeira questão, porém, é quando a realidade extravasa a ordem jurídica e o General, franzindo o sobreolho nessa altura cá estão os militares para meter a realidade na ordem e eis, em duas frases, um verdadeiro tratado de filosofia política.

E, sem réplica ergueu o General a voz, para todos falando agora, mas com o Berros da Selva em mira e num discurso inflamado, evocou os deveres de todos e cada um perante a Pátria multisecular e pluricontinental, do Minho a Timor, a vocação civilizadora de Portugal e a defesa da Civilização Ocidental que se fazia na África Portuguesa, contra a subversão do comunismo internacional, o exemplo de nossos maiores e, em especial, o Santo Condestável, D. Nuno Álvares Pereira, patrono da gloriosa Juventude Portuguesa que coragem se bate em três frentes de guerra subversiva. O Capitão Mascarenhas, surpreendido com o inflamado discurso, olhava em redor da mesa, como quem receia a todo o momento uma hecatombe, o Alferes e o médico Cartuchadas, frente a frente, trocavam de vez em quando olhares cúmplices, o Valentim torcia-se na cadeira prestes a explodir, o Barbas metia os olhos na mesa, sem mais os levantar, e brincava com as franjas da toalha como escape para da tensão e o riso. Apenas o Berros da Selva bebia, com devoção, as palavras e os gestos do General, totalmente submetido, qual passarinho na boca da serpente. E o General Comandante em Chefe prosseguia no seu discurso, evocando agora os feitos guerreiros dos portugueses e a heroicidade da juventude, desde Alcácer Quibir a Aljubarrota, desde Goa, a Nambuangongo para, em tom dramático e requebros na voz, fixando com intensidade o Berros da Selva, cada vez mais impante e corado, fora eu jovem e pertencera eu a esta briosa Companhia de Cavalaria e jamais consentiria que um bando de maltrapilhos, a dois quilómetros de distância, fizesse gato-sapato de um destacamento do glorioso Exército Português e, dirigindo-se directamente ao Berros da Selva, estou certo que o nosso Alferes me dará razão e está desejoso de desancar esse bando de turras maltrapilhos, sendo que o seu Comandante de Companhia e eu próprio saberemos reconhecer o mérito do seu feito militar.

Antes de o Berros da Selva recuperar da emoção e poder causar dano irrecuperável com sua prosápia e desejo de dar nas vistas, levantou-se o Capitão Mascarenhas e, em impecável postura militar, permita-me, V. Exª, meu General, que o interrompa para esclarecer que não é apenas o Alferes Berros da Selva quem está desejoso de acabar com a base da guerrilha no outro lado da fronteira, todos os oficiais, sargentos e soldados desta Companhia de Cavalaria o desejam ardentemente. E, dirigindo-se, individualmente, a cada um dos oficiais milicianos, a começar pelo Alferes, seu Adjunto, não é verdade, nosso Alferes? E o Alferes erguendo-se da mesa, que nem uma mola, batendo os tacões em irrepreensível posição de sentido sim, meu Capitão!   E depois do Alferes, adjunto do Comandante da Companhia, todos os outros oficiais milicianos, batendo os tacões e em irrepreensível posição de sentido e assim, um a um, o disseram e gritaram Sim, meu Capitão! E assim permaneceram, perfilados, qual círculo de ferro, ou cavaleiros da Távola Redonda, em torno de seu Galaaz, perante um deus da guerra sentado e abatido, a receber a última estocada, todos os meus oficiais o desejam e eu com eles, insiste o Capitão Mascarenhas, todos nós desejosos de aniquilar o inimigo que, a escassa distância, nos ameaça e, com isso, dar uma grande alegria ao meu General, falta, porém, um pequeno detalhe – a ordem de operações do Batalhão, que eu dispenso, basta-me uma ordem assinada por V. Exª, e, dirigindo-se de novo ao Alferes, seu Adjunto, por acaso de graduação militar, providencie na Secretaria a redacção do documento para o nosso General assinar.

Então, nesta emergência, o General Comandante em Chefe, levantou-se, colérico, com um gesto travou o Alferes que se preparava para abandonar a mesa e cumprir o que lhe fora ordenado e, com voz trémula de raiva e incredulidade, visando o capitão com o dedo indicador apontado ao rosto pode você, Mascarenhas, ter por si a razão militar, mas advirto-o de que a sua atitude não cai em saco roto – o Exército pode compreender, mas não esquece, nem perdoa.

E sem se deter, abandonou o General imediatamente a mesa, dispensado o café e o conhaque, ordenou que lhe chamassem o furriel piloto-aviador que tripulava o helicóptero, pois a visita terminara e desejava seguir imediatamente para Bissau.

Ladeado pelo Capitão Mascarenhas e, dois passos atrás, acompanhado por toda a guarnição de oficiais milicianos o General, dirigiu-se, em completo mutismo, para a aeronave e, com os motores a roncar, subiu de imediato o escaler e já na entrada do helicóptero, sem outro gesto de atenção ou cumprimento, limitou-se, com breve gesto da mão direita à testa, a retribuir a continência do corpo de oficiais perfilado e em posição de sentido, até a nave levantar voo.

À distância, ignorando o drama e a trama, a curiosidade mole dos militares e os acenos e os gritos da pequenada negra.

De regresso à messe, o Capitão Mascarenhas, encheu os cálices com Remy Martin, conhaque que apenas em ocasiões especiais era servido e exclama, perante a libertadora gargalhada geral Meus senhores, celebremos o manguito! Hurra! E todos os oficiais, encenando, com os braços, o glorioso gesto que imortalizou Bordallo Pinheiro, responderam em uníssono, Hurra! E beberam num trago...

Nunca, na messe de oficiais, se falou mais do assunto. Mas, lá onde moram, os deuses da guerra decidiram, nesse dia, o futuro da carreira militar do capitão Mascarenhas.


Manuel Veiga

                     

quinta-feira, outubro 05, 2017

NA INOCÊNCIA DO CANTO...


Na esquiva gruta de resguardo
Das coisas simples.

E no pequeno nome das ervas
E no trevo dos caminhos
E na inocência do canto
De todas as partilhas.

E no bordão dos peregrinos
E no livro das Horas nacarado.
E na espada. E no selo das promessas.
E em todas as juras.

E nos maculados pés
E no alvoroço dos portais.

E na fome dos dias por abrir

Toda a fecunda dor
De todas as colheitas. E o sândalo
De todos os cansaços.

(poema reeditado)


Manuel Veiga



terça-feira, outubro 03, 2017

BÁLSAMO E A ÁGUA


No brado úbere da terra
Milhares de fios de Penélope sobre o cotovelo
Dos dias de espera. E barcos vazios
E o sangue fermente. Macerado
Na dor da ausência...

Nesse grito a eterna sede das "mulheres de Atenas"
Vestidas de negro e de olhar profundo
De pranto escorrido.
E riso em cascatas
Festivas. Como bacantes
Em febre...

Bálsamo e a água
Com que o mistério do amor celebra 
O corpo dos proscritos…


Manuel Veiga

(poema reeditado)

segunda-feira, outubro 02, 2017

FRAGMENTOS XLIX


Perfilados, aguardavam, pois o General, Comandante em Chefe, todos os oficiais da guarnição, à entrada principal da vivenda, que antes fora habitação de Dona Rosalinda e cenário de expiação de seus pecados, pois bem se sabe, cada um é para o que nasce, no dizer da experiente senhora que, nos últimos tempos, antes de cumprida a ordem militar “de que todos os civis devem ser imediatamente evacuados” fora capacho do maligno Gaspar, mais conhecido, entre brancos e pretos por kamenino pelo pérfido gosto por garotinhos negros e alma negra do Armando, seu homem, que o diabo levou, tarde de mais, roído pelas febres e pelo álcool e, hoje em dia, ela. Dona Rosalinda, pela graça de Deus e de seus conhecimentos mundanos, empresária de hotelaria em Bissau, senhora de uma pensão assaz frequentada, por militares em trânsito, desde que ostentem divisas ou galões doirados, está bem de ver, sendo que devera ser classificado tal estabelecimento hoteleiro como de “serviço público” e quiçá condecorado pelo notável “esforço de guerra”, prestado ao “Corpo Expedicionário do Exército Português”, como sanatório de almas, ou como depósito de ejaculações e sofá psiquiátrico que, qual penso rápido, se não cura, pelo menos conforta e esconde a ferida.

Aguardavam, pois, o General, à entrada da vivenda, todos os oficiais, devidamente aprumados e ordenados por antiguidade militar, que o Capitão Mascarenhas, com o impante Berros da Selva, dois passos atrás, apresentou um a um, ao que o General correspondeu com um vigoroso aperto de mão, não sem antes receber e retribuir a continência militar, a que as praxes obrigam e, na passada, a comitiva dirigiu-se para o interior da vivenda, que antes fora habitação, cenário de expiação de pecados, ninho de amores serôdios de Dona Rosalinda e de angústias existenciais do Alferes, herói a contragosto desta narrativa e, já no interior da vivenda, o Capitão Mascarenhas, detendo o General por um braço, num aceno chamou o empinocado soldado Assobio, tempos atrás Apoucalhado, ora arvorado em “impedido na messe de oficiais”, que à distância aguardava ordens para servir as bebidas, antes de as galinhas de mato, loiras e bronzeadas, pela arte culinária do cozinheiro indígena, que fora antes de Dona Rosalinda, nos faustuosos dias, antes da guerra, saltarem do fogão para a mesa dos comensais, e, nesse ínterim, o capitão, carregando os subentendidos, “meu General, permita que lhe apresente o “insubstituível” soldado Assobio, sem ele a vida aqui seria o inferno” e o General, despindo-se de toda a formalidade, pois bem se sabe que “que quem quer colher cocos, há-de trepar ao coqueiro”, verdade universal até mesmo para General, disposto a engolir sapos, quer dizer, a apear-se do pedestal de General Comandante em Chefe e descer, salvo seja, ao tu cá, tu lá, com a caserna, isto é, à camaradagem própria dos “homens do mato”, em que as hierarquias militares perdem rigidez para deslizarem para uma zona intermédia e perigosa, entre a moleza e a “pissalhada” e, assim, com aparente bonomia, replica o General “tem toda a razão, Mascarenhas, um bom “impedido” é meia guerra ganha…”, e, à vista do apoucalhado Assobio, armado de seu sorriso cândido, fardado de branco, luvas, casacão e calças, com faiscantes botões de metal amarelo e as “aristocratas” dragonas doiradas a descerem em cascata das ombreiras e o caminhar desengonçado, marca e linguagem corporal, que os socalcos da Gardunha e o surrão e a manta de pastor lhe imprimiram, o General Comandante em Chefe, numa mirada de soslaio para a figura, um tanto clownesca, fardada de branco, em alvo contraste com o verde mesclado das farda de combate, que todos envergavam, o General prossegue o tom da conversa e remata “aliás, você, Mascarenhas, tem ao seu serviço, não um “impedido”, mas o czar da Rússia, o que me dá a garantia que, se a guerra não está ganha, pelo menos, irão terminar os bombardeamentos vindos do outro lado da fronteira !...”

E, neste tom de ironia ácida emerge à superfície, o primeiro abalo ou sintoma das preocupações que arrastavam o General à Tabanca, contrastantes aliás com a relativa distensão do Capitão Mascarenhas que, naquela emergência, nada mais poderia fazer que não fosse “receber o General o melhor sabia e podia”, consolidada a convicção de que ele, Capitão de Cavalaria, não seria apanhado “com as calças na mão”, aceitado pois, com alguma bonomia, a alfinetada do General e, assim, mantendo o tom, chutou literalmente para o lado “pode o Assobio, meu General, não ser um Imperador, mas é um verdadeiro Rei, lá isso é!”, num jogo de subtendidos de que o General apenas detém a chave, depois do Capitão ter declinado o nome do soldado Assobio, ora arvorado em soldado impedido na messe de oficiais, Eusébio da Silva Ferreira, por assento baptismal, num qualquer lugarejo esquecido nos cumes da Serra da Gardunha, talqualmente o “Rei Eusébio”, vindo, em tosco, da designada Província Ultramarina de Moçambique e que ora se afirmava, neste tempo narrado, como “rei do pontapé na bola”, também ele um tanto ou quanto “apoucalhado” e, “pour cause”, deslumbrava o Mundo como glória maior do futebol português, qual herói, que, por seus feitos, “se vai da lei da morte libertando”, a ombrear, em glória nacional, com o Fado e a diva Amália, pois bem se sabe que Fátima, como coisa do Céu, é eterna e, por esses dias, nesses tempos narrados, fora abençoada pelo Papa e, assim, “Rei Eusébio”, que não o Apoucalhado soldado Assobio, oriundo dos cumes da Gardunha, mas o outro Eusébio, vindo em tosco de Moçambique e a Amália, Rainha do Fado, um e outro, Fado e Futebol, em rendida veneração da Pátria, num tempo outro, ainda larva, neste tempo narrado, mas tempo que viria, quando maduro, acabaram por bater com as ossadas no Panteão Nacional, fadista e futebolista lado a lado com a “divina” Sofia, que depois de morta não se importa nada com a vizinhança, pois se é verdade que, muitas vezes “os mortos vão a nosso lado”, não é menos verdadeiro que os mortos não falam, nem protestam.

Entretanto, nestes rodeios de escrita que tanto irritam Maria Adelaide, licenciada em Línguas e Literaturas Modernas, veio e a seiva que alimenta esta narrativa que, sem rebuço, ela a heroína diz entediante, com todos estes rodeios em que a escrita se perde por atalhos inesperados, como corrente de consciência tresmalhada, a conversa do General, Comandante em Chefe e o Capitão Mascarenhas, Comandante da Companhia de Cavalaria, evoluía na sua própria lógica, como fervura que lentamente se levanta e, gradualmente, acumula pressão até ao entornar da sopa.

(continua)


domingo, outubro 01, 2017

CATALUNHA. AGORA...




Uma Flor Vermelha 
Contra a Força Bruta!...

"Temos ouvidos e vemos! Não podemos ignorar!..."

Cantares de Maio Moço...


Maio moço, meu amor, nos amamos!
Bocas em delírio incandescentes
E o pulsar da Primavera
Em nossos corpos.

Louco, louco era o vento desse espanto!
Que o beijo arde e as bocas pedem.

Seara esvoaçante em teus cabelos
E azul em teu olhar
Indeclinável.

Botânicos os jardins. Que ciosos, éramos.
Maio moço agora. E o fragor que canta.

Outros espantos
Em teus olhos
Cor de mel…


Manuel Veiga


Sem Pena ou Magoa

  Lonjuras e murmúrios de água E o cântico que se escoa pelo vale E se prolonga no eco evanescente…     Vens assim inesperada me...