terça-feira, abril 10, 2018

Cortemos Cerce Os Enleios


Importa cortar as águas Lydia
Que também as águas corrompem!
E nada detém o movimento
Das correntes…

E nem sempre as pontes são regresso
Nem os barcos são viagem. Nem as âncoras
Enseadas límpidas.

Mergulhemos Lydia no fragor das cascatas
E na nascente das ribeiras. E que nossos corpos
Sejam os únicos afluentes.
E apenas as margens
Aluvião dos dias.

E os dedos entrelaçados o açude
Das águas sufragadas. E a razão de nossos gestos.

E a copa dos salgueiros e os frondosos freixos
Sejam o único alimento das sombras.
E o sol a vibração de nossas almas
Vagabundas.

Derrubemos Lydia todos os arcos.
E todas as glórias. E todas as pontes.
E todos os triunfos.

E cortemos cerce os enleios.

 E amemo-nos. Antes que a deletéria espuma
Nos tolha. E macule a inocência
Dos sentidos.


Manuel Veiga

Nota
Lydia é uma criação literária de Ricardo Reis

11 comentários:

Boop disse...

Li como se de uma sôfrega tentativa de guardar o belo se tratasse.
Como se a verdade (ou a realidade) corrompesse o amor.
Como se nada fosse certo. E apenas o momento contasse. O momento em que dois são um.
Como se não houvesse tempo.

Agostinho disse...

Se Lydia for de Ricardo Reis quantas houve, há e haverá para que as águas nunca sequem .
A evocação da maior motivação da vida num belo poema.
Agora vou aos atributos de uma certa branqüelas, com sardas, que vislumbrei à varanda uns andares abaixo.
Abraço.

Ana Tapadas disse...

Eu poderia fazer uma análise...e até gostaria...meu admirável neoclássico incontido!

Beijo meu.

_ Gil António _ disse...

Estou à procura de entender e perceber certas palavras, lool
.
* Amor sonhado nas ondas do entardecer *
.
Um dia feliz-

Manuel Veiga disse...

Gil António,

em alternativa a opção mais radical, aconselha-se então a consulta de um bom dicionário

e acrescento,

neste espaço dispensam-se "lool"

dia feliz

Suzete Brainer disse...

Este poema, recriação literária do Manuel Veiga,
da criação literária de Ricardo Reis (F P), é
grandiosidade da poesia exemplar na superioridade
literária. Aqui nesta poética singular, não cabe
desnudar o significado do conteúdo do poema, seria
assim, (re)tocar numa estrutura poética que ecoa no
seu todo, numa vibração sútil luminosa da alma da
poesia numa infinita significância:
"E amemo-nos. antes que a
deletéria espuma
Nos tolha. E macule a inocência
Dos sentidos."

Manuel, meu amigo, para mim tu és um dos grandes e
melhores poeta e escritor que eu leio (no universo dos
grandes mestres da poesia e literatura), claro que dito
por apenas uma pessoa, que somente uma leitora compulsiva
da grande poesia e literatura, com o hábito do exercício
singelo de escrever poesia e literatura também.

Deixo o registro do brilho dos meus olhos de admiração
nesta leitura, obra de arte poética do Manuel Veiga!
Grata por este momento, meu amigo.
Beijo.

Manuel Veiga disse...

Suzete, minha querida Amiga

agradeço a generosidade do teu comentário, que muito me honra, por que de uma Poeta talentosa, inteligente e sensível.

é evidente quem escreve aprecia o reconhecimento do leitor e, em especial, daqueles que se movem no mesmo espaço de escrever e amar poesia, por isso não escondo (descontado embora os excessos ditados pela amizade) quanto teu comentário me envaidece e que o considero um raro privilégio

beijo

São disse...

Se Suzete Brainer permitir assino por baixo as suas palavras.

Beijinho

Teresa Almeida disse...

Comungando da opinião da nossa amiga Suzete, apenas deixo a minha percepção de mais um poema que celebra a vida, a estética da palavra e o enredo dos sentidos sem apeias. E, como sempre que te leio, meu amigo Manuel, fica esta agradável sensação de nos envolvermos nos meandros e no âmago da poesia.

Beijo.

Ana Freire disse...

Quando as palavras têm um curso imparável, e nos dão a conhecer mais mundo... do que os nossos limitados horizontes...
Adoraria estar mais por dentro desta criação de Ricardo Reis, que me aproximaria do verdadeiro alcance das suas palavras, Manuel... neste seu poema apaixonante, que me parece uma verdadeira celebração da vida... vivida... por viver... mas acima de tudo... uma verdadeira celebração do momento presente... único, e irrepetível...
Beijinho
Ana

José Carlos Sant Anna disse...

Caro Manuel,

É claro que Lydia fez por merecer este "arroubo".
Qualquer palavra minha pode macular a beleza deste poema.
É perceber esta nova realidade aqui fundada, assimilar e se entregar à sua palavra poética.
Forte abraço,

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