domingo, março 18, 2012

BOAS PALAVRAS...

Bem sabemos a distância que separa a previsão das disposições legais e a prática concreta das instituições. Sobretudo na União Europeia, onde as instituições jurídicas e políticas são capturadas por teias de interesses que asfixiam, à partida, quaisquer veleidades de avanços rumo a objectivos de progresso e justiça social, que eventualmente os documentos comunitários possam propor.

No entanto, na minha perspectiva, vale a pena conhecer e debater o parecer do Comité Económico e Social Europeu – CESE, publicado, em 25.08.2011, no Jornal Oficial da União Europeia, sobre a denominada “Plataforma Europeia contra a Pobreza e a Exclusão Social”.

Não apenas pela caracterização que faz da “pobreza”, mas sobretudo, pela contradição evidente entre as propostas de políticas económicas em curso na União Europeia, que arrasam os países e as sociedades e as políticas de “combate à pobreza”, que o parecer em causa preconiza.

Como o parecer salienta, mais de 80 milhões de pessoas vivem na UE abaixo do limiar da pobreza, das quais mais de 50 % são mulheres e 20 milhões são crianças. Assim, o CESE reclama acções mais concretas para actuar sobre as causas e não apenas sobre os efeitos da pobreza, como natural consequência do respeito os direitos humanos, incompatível com as angustiantes situações de pobreza que lavram por essa Europa fora.

Assinala o documento que as pessoas pobres, com pouca capacidade para defender os seus interesses são lançadas frequentemente em situações ainda mais dramáticas pelas reformas económicas, fiscais e sociais e pela degradação dos sistemas de saúde e de educação, em consequência da redução da despesa do Estado, que não tem em consideração a protecção dessas pessoas.

Chamando as coisas pelos nomes, significa isto o reconhecimento, por ínvios caminhos, de que as reformas económicas e sociais preconizadas na União Europeia são incompatíveis com erradicação da pobreza.

Depois de acentuar a ideia de que a pobreza representa “uma violação dos direitos humanos” sustenta o parecer que as medidas de austeridade não devem agravar o risco de pobreza; pelo contrário, deve ser dado maior ênfase à retribuição da riqueza e à redução das desigualdades, como condição de cumprimento dos direitos fundamentais.

Piedosas palavras!... Enfim, pareceres, estratégias e plataformas e, uma vez por outra – admitamo-lo – boas palavras contra a pobreza não faltam...

De assinalar, particularmente, a ligação da pobreza à violação dos direitos humanos, o que corresponde às mais modernas perspectivas da problemática dos direitos do homem e da sua consagração universal.

Pena é que tais enunciados se limitem a ser ideologia jurídica, espuma de boas intenções que breve se desfaz perante as alegadas contingências da “crise” e os ditames dos sacrossantos mercados.

Em qualquer caso, é forçoso reconhecer que o Parecer do Comité Económico e Social Europeu – CESE constitui um sugestivo libelo acusatório contra o pensamento político dominante e as políticas prosseguidas na União Europeia de resolução da proclamada crise.

E que, no plano interno, a doutrina e as medidas preconizadas no documento, deveriam fazer corar de vergonha os nossos dogmáticos defensores do “empobrecimento virtuoso”, ou os laureados de propagandistas da “redução dos salários”...



9 comentários:

São disse...

"Des belles paroles rien ne change"!!

Bonsoir , ami

jrd disse...

...e boas intenções.
A quem servem?

Abraço

O Puma disse...

Por cá - vergonha?

Nem na presidência da república

Carlos Ramos disse...

Devereriam meu bom amigo, se tivessem a dita vergonha, como sabemos não têm, e esse não é o seu unico problema. A mentira repetida á exaustão, devidamente aprimorada por pareceres técnicos ridiculos e opiniões de peritos de duvidosa independencia e aí temos, "El poder".

Abraço

jawaa disse...

Cá para mim, eu penso que os nossos políticos já pertencem àquela geração dos que têm competências (pilhar, desbaratar, guardar em offshores, por exemplo)mas não sabem ler, pois há muito quem escreva bem sobre o que deveria ser feito para não mergulharmos mais fundo no pântano em que sobrevivemos.
Um abraço

lino disse...

Corar de vergonha? Os gajos não têem disso!
Abraço

Licínia Quitério disse...

Vergonha eles não têm. De facto, tomaram todas as medidas conducentes ao empobrecimento dos povos. Não espero que pareceres desta comissão os impressionem.
A saga continua, terrível!

Peter disse...

Words, words and more words. Não consegui chegar ao fim.

O Ulpiano anda um bocado em baixo. Já se senta a meio do caminho qd vai às compras.

Nilson Barcelli disse...

A pobreza e a exclusão social não estão na "agenda" da quase totalidade dos países europeus.
E Portugal leva a bandeira, pois o governo quer fazer a quadratura do círculo, isto é, quer tornar o país rico à custa dos cidadãos cada vez mais pobres...
Excelente texto de opinião.
Um abraço, caro amigo.

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