Parecem muito claras as motivações da instabilidade política e dos atentados que presentemente assolam a Bolívia.
A elite económica e os políticos de direita, que predominam nas cinco províncias orientais, não aceitam que o governo legítimo do País pretenda controlar a economia e redistribuir o rendimento nacional a favor dos mais pobres, extinguindo privilégios e que, ao mesmo tempo, devolva a cidadania ao Povo, conferindo gradualmente autonomia às comunidades indígenas, exploradas e marginalizadas em 183 anos de história.
Acresce que, embora num quadro de economia mista, Morales tem promovido uma política de intervenção económica, socializando actividades e sectores económicos considerados mal geridos ou geridos contra o interesse nacional. Esta política, naturalmente, tem resistências nas classes abastadas bolivianas.
Por outro lado, a etnia índia do Presidente Evo Morales causa engulhos na minoria branca e europeizada, até agora com o monopólio da actividade política, aliás dominada por regimes antidemocráticos e o esbulho da riqueza nacional. Expressões como “macaco”, “índio infeliz” e “índio porco”, usadas pelos governadores da oposição para agredir Morales, são bem reveladoras das boas maneiras, cultivadas pelas elites bolivianas. E, no entanto, a minoria branca não ultrapassa 15% da população, sendo que 60% e constituída é constituída por índios quechúa e aymara.
Segundo o FMI, quando Morales foi eleito, em Dezembro de 2005, a Bolívia era o país mais pobre da América do Sul, com 60% dos seus 9 milhões de habitantes abaixo da linha da pobreza e 38% em extrema pobreza; o desemprego atingia os 12%, com 40% de sub-empregados e o rendimento dos indígenas 40% inferior a dos não indígenas.
Entretanto, nos dois anos e meio de governo Morales, este quadro começou a mudar. O Governo boliviano tem aumentado as receitas do Estado, revendo os acordos de exportação de gás e petróleo com o Brasil e a Argentina, desvantajosos ao país e estabelecendo o controle estatal sobre a exploração dessas riquezas. A Bolívia passou a deter 85% dos lucros e suas exportações dobraram de 2005 para 2006, chegando a 4,9 mil milhões de dólares...
Para estimular a industrialização e reduzir o desemprego, concedeu, através concurso, a exploração da mina de Mutun à empresa siderúrgica indiana, com proposta de investir 1,5 mil milhões de dólares e mais 2,5 mil milhões em 8 anos. Por outro lado, foi celebrado um acordo económico com o Irão que prevê o investimento de 230 milhões de dólares na instalação de uma fábrica de cimento e mais 1,1 mil milhões em energia, agricultura e indústria alimentícia. Com o Irão, imaginem!...
Na área social, Evo Morales anunciou uma reforma agrária, propondo-se a expropriação de 14 mil hectares de terras, a maioria não cultivada. Foram, por outro lado, feitos substanciais investimentos na Educação e parte das receitas provenientes da venda de gás natural reservadas à melhoria da situação social dos mais pobres, em particular, os idosos pobres.
Para consolidar as reformas necessárias, é necessária, no entanto, uma nova Constituição. Aprovada pelo Congresso, com abstenção da direita, não foi aceite, porém, pelos governadores insurrectos. Exigem mais autonomia – o controle da distribuição dos recursos dos hidrocarbonetos produzidos localmente (82% do gás do país),o fim das pensões financiadas com parte dos rendimentos do gás e rejeitam “in limine” a nova Constituição.
O governo de Morales e seus adversários concordaram com a realização de um referendo revogatório, no qual o povo poderia manter ou afastar o presidente, governadores de departamentos e perfeitos das províncias. O resultado foi favorável ao governo central. Morales obteve 67% dos votos a favor e venceu em 95% das 112 províncias. O apoio popular a Morales é indiscutível. A direita, no entanto, continua em pé de guerra. Claro que semelhantes resultados não agradam ao “império”. Manifestamente, a Bolívia inclina-se para o “eixo do mal”...
As manifestações se intensificaram, numa escalada de violência que chega ao bloqueio de estradas para impedir a chegada de alimentos às cidades, incêndio de edifícios de instituições do governo central – destruição de documentos públicos, ataques a aeroportos, estações de comboios, locais de reuniões de indígenas e, por fim, explosões de gasodutos e cortes no envio de gás para o Brasil –, visando paralisar as exportações. Como é evidente, tendo em vista provocar o caos e criar um ambiente propício para um golpe de Estado.
Assim vai a Bolívia... Semelhante “espectáculo” já foi visto, infelizmente, noutros locais do Mundo. No Chile, por exemplo. São, no entanto, outros os tempos. A solidariedade dos povos sul-americanos funciona. A Bolívia vencerá...
ver Luiz Eça
22 comentários:
Mas nunca é fácil... com os EUA tão perto.
Mais lembranças do Chile, é que não. Estamos em Setembro...mas, outra vez? Não!...
[Beijo...]
O grande problema é que o colonialismo nunca abandonou a Bolívia.
Espera uma desgraça.
Abraço.
Bolívia, Chile, etc...não gosto de falar sobre...
E, hoje falo do quê?
Os netos...
Eu, quando me permitem, é que levo aqui e ali...a minha neta;
convido-te a ver a minha companheira no festival dos oceanos.
HOJE, a minha netinha começa a sua vida escolar, a sério!!
1º ano do Ensino Básico.
Um beijinho amigo.
Amoroso, amoroso é o post que acabei de fazer.
Muitos cumprimentos.
Os tempos são outros?! Quem dera.
Beijo.
ética política, precisa-se em todo o planeta? Mas os jogos de interesses quantas vezes se sobrepõem e a obstaculizam? Fazes muito bem informar...o primeiro ponto para vencer os conformismos...
A História estásempre a repetir-se. Pelo lado pior...
Um abraço.
Tal como diz Graça Pires. Gerações de memória curta e o poder do dinheiro, varrem a história recente.
Oxalá não.
Abçs
uma análise muito bem estruturada
beijos
Concordo com a tua análise mas duvido muito da esperança do teu final. Não acredito que os tempos sejam outros e o Chile não me sai da cabeça. Por isso... veremos se a solidariedade dos povos sul-americanos funciona mesmo e se é suficiente. **
Nos últimos meses não tenho acompanhado o que se passa na Bolívia.
Mas o teu excelente post alertou-me... vou estar mais atento ao que lá se passa.
Abraço.
estou com o klatuu......
completamente...
Também já escrevi sobre esta ignomínia.
Mas poruqe razão só vemos (até à exaustão) Chavéz madar Buhs para o c....o e não põem no ar os insultos a Morales?!
Um abraço.
Gostei de ler-te nesta análise bem lúcida. Como tu, tenho esperança de que a aliança sul-americana comece a surtir algum efeito...
Um abraço
Força camarada
Também por cá
Abraço
Esse homem é muito esquisito! Não sei se ele ama tanto o seu pais...
Muito bom o seu texto! Elucidativo...
Beijos de luz e o meu carinho!!!
Já estive três vezes na Bolívia. Pobre país, faz o Brasil ser parecido com o melhor da Europa Nórdica.
Por outro lado, desconfio de caras que contam com o apoio incondicional do nosso presidente Lula. :)
Um abraço!
No fundo, no fundo - ou mais acima, consoante o posicionamento geográfico que se tenha - comentaria este teu excelente artigo de informação com uma frase «batida»: basta yá qu'el yankee mande!
Pelo quanto isto possa representar um caminho para uma nova ordem mundial, estou com a actual governação da Bolívia, por supuesto.
Solidários com a Bolívia (e não só) estamos, e estaremos...
Beijos, beijos
“solidariedade com a Bolívia...”
de tão usadas, num ou noutro momento, as palavras parecem carecer de sentido: solidariedade, amor, liberdade, exploração, miséria... há-de se ter cuidado com elas, as palavras. e esse cuidado deve acontecer antes que sejam pronunciadas. há-de de se ter carinho com as palavras. e esse carinho deve acontecer no silêncio, no mais profundo de nós mesmos, onde as palavras são gestadas. caso contrário perderão o sentido ou poderão ter o sentido inverso do que tentam exprimir.
há-de se cultivar, sempre! - SOLIDARIEDADE com todas as pessoas, em todos os lugares do mundo, a qualquer tempo, exploradas, aviltadas por outras pessoas – que escudadas num “sistema” mesquinho e perverso, anti-humano, capitalista -, dizem defender valores tais como: “solidariedade”, “liberdade”, “democracia”...
tuas palavras, meu Amigo, jamais gastas, alimentadas que são pelo que há de melhor dentro de ti, ajudam-nos a prosseguir, sem perder a ternura ou a firmeza nos gestos. tuas palavras, meu Amigo, jamais gastas, alimentadas que são pelo que há de melhor dentro de ti, ajudam-nos a prosseguir em direção à Utopia, caminho e porto, traçado e sendo construído por homens e mulheres do porte de Cristo (sim, Jesus Cristo!), pelo Zé da esquina, que estende a mão pedinte (sim, pelo Zé da esquina!), Maria de Nazaré (sim, a mãe Dele!), Maria, dentre tantas outras Marias, mães de tantos outros crucificados sem cruz (...), Gandhi (sim, Gandhi, Mahatma!), Manoel da padaria (ó, Manoel, tu também!), Clara, a de Assis... Clara, não tão clara assim, filha da noite africana... Clara, não tão clara assim, filha do solo americano...
deixo o meu abraço fraterno pra ti.
... tuas palavras, meu Amigo, jamais gastas, alimentadas que são pelo que há de melhor dentro de ti, ajudam-nos a prosseguir, sem perder a ternura ou a firmeza nos gestos. tuas palavras, meu Amigo, jamais gastas, alimentadas que são pelo que há de melhor dentro de ti, ajudam-nos a prosseguir em direção à Utopia, caminho e porto, traçado e sendo construído por homens e mulheres tais como: Marina Silva, Ho chi Minh, Thaís, Betinho, Rejane, Che, Luiza, Chico Mendes, Maria Clara, Zumbi, Juliana, Mandela, Gorete, Zeca Afonso... pessoas públicas ou “anônimas” de todos os recantos do mundo, incluindo todas as pessoas do solo boliviano, espoliadas ao longo do tempo, mas que lutam para reverter essa situação.
outro abraço fraterno.
ps. quando estava escrevendo o comentário fui interrompido. tive que sair. retornei para concluí-lo.
São outros os tempos mas a malha social continua semelhante. A construção de uma sociedade mais igualitária, a implementação de reformas económicas que colidem com os interesses das classes dominantes não são facilmente aceites.
Há 35 anos,mataram Victor Jara, Allende caiu e uma terrível ditadura deu origem a uma trágica carnificina.
A América Latina e as suas convulsões!
Beijinhos
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