Gosto
de pessoas. Por vezes próximas, respirando ao mesmo ritmo!.. Outras (quase
sempre) apenas momentos, riscos de acaso, meteoritos intensos na solidão da
cidade. Uma viagem de autocarro (ou de metro) é sempre uma revelação inesperada.
Pequenos nada que nos perseguem (momentos, horas, dias?) e que exigem que os
soltemos, de tão intensos...
Gosto
de gente anónima. De seus rostos. Da linguagem subtil dos seus gestos. Do seu
porte. Do pulsar do meu Povo!...
Por
vezes, a cor desânimo, toma o sangue. O cepticismo cria raízes e uma ironia
triste ocupa o espaço da esperança. Porém, do meio da multidão, surge tantas
vezes, sem nos darmos conta, uma imagem, o resto de uma carícia, uma ternura,
uma beleza inesperada que humaniza e reconforta. Que nem sempre estamos
disponíveis para ver e que, outras vezes, guardamos como refrigério de alma...
Falo-vos
de uma viagem de autocarro entre o Rossio e o Cais de Sodré. Na curta
distância, cenas dignas de um pintor impressionista - o melhor e o pior de um
Povo concentrado no escasso espaço de um autocarro, à hora de ponta. Nada que
seja diferente de outras viagens.
Até
que...
Uma
jovem mãe, de rosto trigueiro e olhar apaziguado, entrou, aconchegando no colo
uma criança de escassos meses. Sozinha, face as intempéries e os balanços da
vida, ali bem simbolizados nos apertos e balanços do autocarro. Um jovem, de
brinco na orelha e crista de galo loira, cede-lhe o lugar (no meu íntimo, um
sorriso freak!)
Acomodou-se
a “minha" jovem Madalena (era, de certo, este o seu nome!) com o bebé nos
braços, sereno que nem um anjo. E alheia a tudo que não fosse a sua novel
maternidade, a jovem soltou o seio da blusa (mármore puro) e a boca da criança,
em esplendor, buscou afoita o mamilo, assim exposto em dádiva!
Vi
então olhares brilhantes nos rostos cansados dos transeuntes. Vi ternuras
caladas e inesperados silêncios. Vi orações pagãs em cada sorriso!...
E,
em época natalícia, a minha alma ateia, entoou um cântico de vida -
"Glória in excelsis Deo!..."
Manuel
Veiga
Retomo um texto
antigo.
Não (me)
acontecem milagres todos os dias!
11 comentários:
Eu também gosto dos anónimos. Eu, ateu por fé, também gosto de alguns cânticos. Boas babilónias, boas festas, bons versos, bom vinho e um abraço real do Rei dos Leittões.
Os nossos milagres são fáceis de explicar
meu irmão
Abraço sempre
... mas acaba por ser um esplêndido quadro de Natal, surpreendente para os homens sem fé, um milagre que dá para acreditar pela sua natureza. E beleza.
Na espectativa de mais presentes pelo ano fora, desejo-te, neste tempo de encantamento, as maiores felicidades com Boas Festas pelo meio.
Uma breve passagem para desejar um Feliz Natal e um Bom Ano de 2017
Cumps
Fantástico conto para o natal de todos os dias...
e dum micro-cosmos se faz poema num espaço/tempo onde vale a pena acreditar no humanismo.
e o poeta desfrutou dum momento sublime e que tão bem reteve e passou.
um forte abraço nesta época onde as emoções andam soltas, ao sabor do que melhor o ser humano tem.
(escrever assim é um bem...)
Voltando à blogosfera, meu amigo! Notei que os amigos estão voltando com suas postagens, em curso normal. Que bom, adoro meus amigos e já estou cansada das festas.
Mas quanto à postagem do vídeo, diria que é uma das mais lindas canções de Elis, carregada de emoções. E que voz...
Quanto a essa crônica, gostei imenso, uma crônica poética com passagens lindas, com encerramento hilário.
Gosto de gente anônima. De seus rostos. Da linguagem subtil dos seus gestos. Do seu porte. Do pulsar do meu Povo!...
Pois é, das pequenas coisas, do simples é que nossa criatividade salta deixando registrado coisas e situações belas, que valem a pena.
Meu amigo, agora só resta a festa de mudança de ano; o que desejo a você é muita saúde, alegrias, belos poemas e crônicas! A você e sua família!
Um beijo, Manuel.
Caro Manuel,
Se que um milagre é só olhar em volta, é o que você nos mostrou com um lirismo invejável. Dizer mais o que o que?
Acabei o ver o documentário Elis Regina. Se não é uma peça antológica, vale a pena vê-lo (o documentário). Andreia Horta está "impecável" como Elis. Já a música de Renato Teixeira, essa é antológica
Um forte abraço, meu caro amigo!
Lindíssimo texto de um homem atento e sensível!
Beijinho
Um cântico de vida registrado pelo um
olhar de poeta, pinta o quadro da vida
numa bela obra de arte!...
Belíssimo!!
Beijo.
Curta ou longa, uma viagem pode trazer sempre com ela o milagre do encontro.
Um abraço fraterno
Li e penso que comentei, talvez pelo tm.
Já me tem acontecido o comentário não ficar.
Agora, lapidarmente: se estivermos atentos, vêm ao nosso encontro circunstâncias que, pela pena de um escritor, quase se assemelham a contos.
Eis um caso. Lindo!
(Em esplanadas, já me acontecer apanhar cenas improváveis. Algumas, plasmei-as em breves narrativas :) )
Bjo
Enviar um comentário