Quando um dia for poeta quero ser
Poeta – porém, poeta “insurgente”
E mergulhar em seus abismos.
Então meus dedos hão-de calar os ventos
E serei hóspede de infinitas tempestades
E criarei inimizades. (Que meus amigos
De mim sabem. E assim me querem
Desabrido. E claro.)
E serei aquele cego das esquinas.
A tocar concertina e exibir fístulas.
E arremedar jaculatórias piedosas. E sem rima.
E a piscar – brejeiro - o olho.
E a apalpar meninas - desprevenidas –
Está mais que visto!...
E a fazer grosso manguito à moeda
Que lhe atiras…
Pois meus versos hão-de arder – vivos.
Ou rasgados. Ou serem papel nas latrinas.
Mas nunca usarão barbas.
E metáforas? Serão poucas.
E hei-de rir com meus botões.
Até que os cães acirrados
Se cansem de ladrar à toa
Tão frustrados quanto o dono
A morderem a própria cauda
E a declamarem em uníssono
“O (novo) Noivado do Sepulcro”.
Manuel Veiga
8 comentários:
A poesia sempre foi voz da luta por valores e tu és poeta que sabe esgrimir a palavra.
Parabéns, Manuel.
Beijinho.
"Mas nunca usarão barbas", está visto.
Uma clara face será sempre mais aceite na bolsa das metáforas. Será isto.
Um poeta descarado, fingidor como (P)pessoa, que não diz coisas à toa e que morda as canelas aos cães com o hábito da cauda a abanar, cumpre a missão.
Põe-nos a dançar (a eles), Poeta. O morder da pulga é que lhes encurva o rabo (a cauda).
Abraço.
Ser Poeta é...Ser aquilo que É!
"[...] (Que meus amigos
De mim sabem. E assim me querem
Desabrido. E claro.)"
E num claro e redondo vocábulo, de metáforas ausentes, mas com ironia presente, vais espalhando folhas de pura poesia.
(disseste que a poesia anda na rua, em qualquer dia, mas a ti ela procurar-te).
Um forte abraço e uma semana prometedora, Manuel.
Fez-me lembrar Bocage, a quem fica muito bem o uso da palavra desabrido:)
~CC~
E és poeta insurgente, sem aspas. Desabrido, há que sê-lo. E claro (e contundente) és e serás, como o atestam as 3ª, 4.ª e 5ª estrofes. E assim te conheces; eu, leitora atenta, certifico-te e acrescento: nunca serão vãs as tuas palavras, assim como a sabedoria de as colocar no devido lugar.
Aproveitei a deixa e fui revisitar Soares de Passos...
Bj, Manuel :)
Esqueço-me de referir o som que escolhes; ouço sempre com prazer e deixo uma palavra de apreço pelo bom gosto.
Se veio o ser tudo isto, não sei, mas lá que é bom é ;)
bj
Há muita verve neste poeta desabrido, mas é o mesmo poeta conspirando com as palavras ou atravessando paredes sem a intenção de nos iludir. Deixa vir a poesia em teu rio a correr, poeta!
Forte abraço,
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