“Reflectir
sobre o trabalho humano envolve questionar a economia, a empresa, as relações
mercantis ou o mercado como regulador supremo, mas também tomar consciência dos
valores de civilização e de cultura que queremos preservar e desenvolver e bem
assim inquirir como é que estes hão-de tomar corpo nas múltiplas instituições
que integram as sociedades e presidem à sua organização. Com toda a razão, a
Doutrina Social, que a Igreja vem desenvolvendo há mais de um século, insiste
em que o trabalho é a chave da questão social.
Na
sociedade contemporânea, a problemática em torno do trabalho, do seu estatuto,
do lugar que assume na produção e repartição da riqueza e, de modo geral, do
papel que lhe é conferido na organização da vida colectiva ganhou novos
contornos, já que o trabalho assalariado e dependente se tornou num bem escasso
e, do mesmo passo, a relação laboral conheceu uma acentuada perda de poder
negocial dos trabalhadores, decorrente da globalização e da financeirização das
economias.
Por outro
lado, os governos e a administração pública viram os seus meios de regulação e
de intervenção fortemente condicionados pelas regras de um mercado cada vez
mais aberto, competitivo e desregulado. É neste quadro que emergem questões
novas que suscitam o interesse e empenho de todos os cidadãos e cidadãs que
recusam a inevitabilidade dos fenómenos sociais, sejam eles o desemprego
estrutural, o trabalho precário, os baixos salários a par da cada vez maior
acumulação da riqueza produzida, o abaixamento dos níveis de protecção e segurança
dos trabalhadores, etc...
No
contexto das novas coordenadas, ganha particular acuidade o próprio conceito de
trabalho humano que não pode restringir-se apenas ao trabalho assalariado, mas
há de incluir o trabalho de formação pessoal, de educação dos filhos e de
prestação de cuidados na família ou na comunidade. O trabalho assalariado é
apenas uma entre outras componentes do trabalho humano e do contributo que cada
pessoa deve trazer à sociedade em que vive. Como integrar esta perspectiva nos
mecanismos de repartição da riqueza e de organização das sociedades, quando se
pode antever que irão sendo menores as oportunidades de trabalho assalariado
para todos os activos que o procuram?
Com a globalização, os poderes públicos
nacionais viram a sua capacidade de intervenção na regulação e desenvolvimento
das suas economias consideravelmente reduzida, sendo necessário encontrar novas
formas de regulação do mercado a nível supra nacional sob pena de vermos
persistir as situações de grande desigualdade e exclusão social, que hoje se
verificam, tanto à escala de cada país como, e sobretudo, à escala mundial.
Nem sempre
o cidadão comum se dá conta destas realidades, não sabendo como lhes fazer face
e como exigir dos respectivos governos actuações conducentes à construção de
mecanismos de globalização da solidariedade, condição sine qua non para o
desenvolvimento e a paz. De pouco vale engrossar a corrente do rio das muitas
queixas e dos justíssimos descontentamentos (às vezes, protesto e actos de
rebeldia), ainda que o leito de certos rios mais calmos se faz com o galgar das
margens que os querem conter...”
(…)
Manuela
Silva
VER Agência ECLÉSIA
5 comentários:
Gostei do texto!!
Parabéns
Hoje:- Alma que Vagueia.
.
Bjos
Votos de uma boa noite.
O texto é excelente. Gostei de ler.
Uma boa semana, meu Amigo.
Um beijo.
O trabalho humano. Penso que aqui se lança um olhar sobre o que será a actividade humana seja na produção de riqueza como na sua distribuição,
tanto na retribuição às escalas mais altas como aos assalariados.
Prefiro focar-me num ponto apenas. A precariedade. Uma situação que tem vindo a sofrer alterações ao nível da legislação mas que, nem por isso, tem trazido segurança às pessoas que ao fim do mês têm despesas para pagar. Se antes os chamados "precários" faziam horários normais e estavam submetidos à hierarquia, contrariamente à figura jurídica a que estavam sujeitos, hoje, depois da tal regularização, não me parece que estejam numa situação ideal, com impostos incomportáveis em relação ao seu salário.
Mas, os precários não têm os seus problemas resolvidos. Remeto para este artigo do ano passado que nos mostra a instabilidade das suas vidas: "Quando os precários nos batem à porta"
https://www.publico.pt/2017/03/12/economia/noticia/quando-os-precarios-nos-tocam-a-porta-1764865
Eles andam aí. Nos últimos quinze dias, bateram-me três deles à porta numa luta pela sobrevivência e eu sem lhes poder valer.
Manuel Veiga, passei do geral para o particular. Não terá sido o comentário ideal mas...foi o que o tema me sugeriu neste momento.
Abraço
Olinda
Nunca te passo em falso. Há sempre muita qualidade em tudo o que escreves.
Gostei.
Beijinho.
Olinda,
as suas palavras são sempre ponderadas e justas.
e ainda que não fossem, este espaço pretende ser um espaço de liberdade e responsabilidade.
abraço, grato
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