Como se sabe a Declaração Universal do Direitos Fundamentais do Homem, foi proclamada pela Assembleia Geral da Organização das Nações Unidas a 10 de Dezembro de 1948. A Declaração surgiu como alerta à consciência mundial contra as atrocidades cometidas na Segunda Guerra Mundial.
Desta forma, a Declaração inscreveu-se no acto fundador da ONU e nos objectivos de Paz e boa convivência entre as diferentes nações, credos, raças, ideologias, etc. E, nesta perspectiva, a Declaração Universal dos Direitos do Homem enuncia os direitos fundamentais, civis, políticos e sociais de que devem gozar todos os seres humanos, sem discriminação de raça, sexo, nacionalidade, ou de qualquer outro tipo.
A noção de direitos humanos foi, entretanto, aprofundada, no decurso da segunda metade do século XX, alargando-se o conceito, sob a inspiração dos temas da Revolução Francesa e impulso da Revolução de Outubro, a três gerações de direitos fundamentais: a primeira geração refere-se aos direitos civis e políticos, fundados no ideal de liberdade (liberté); a segunda geração, diz respeito aos direitos económicos, sociais e culturais, com base no ideal de igualdade (egalité); por fim, a terceira geração, refere-se aos direitos de solidariedade, em especial ao direito à Paz e ao desenvolvimento, ao direito a ambiente sadio, entre outros, coroando-se, desta forma, a tríade de direitos fundamentais, sob o ideal de fraternidade (fraternité).
Decorre, portanto, que estas três instâncias de direitos fundamentais têm a mesma génese e a mesma matriz libertadora e que, no seu conjunto, representam um avanço político e social inquestionável, cuja realização constitui a “pedra de toque” da democraticidade de qualquer sistema político. Contudo, apesar de todos os Estados-membros da ONU serem signatários da Declaração, muitos são os que, comprovadamente, continuam a não respeitar os seus princípios.
Em Portugal, por exemplo, a Declaração Universal dos Direitos do Homem foi apenas subscrita em 9 de Março de 1978, na sequência da promulgação da Constituição da República que emerge da Revolução do 25 de Abril. Dando expressão aos ideais libertadores de Abril, a Constituição da República Portuguesa consagra os direitos fundamentais do homem em todas as suas vertentes – direitos políticos, direitos económicos e sociais e direitos culturais e ambientais – que, no plano jurídico-institucional, fazem dela um valioso instrumento de progresso político e social, apesar das restrições que foram introduzidas nas revisões constitucionais subsequentes, especialmente, nos direitos de egalité, ou de segunda geração.
Não cabe aqui o balanço dessas revisões constitucionais. Mas faz todo o sentido afirmar que a restrição aos direitos fundamentais foi acompanhada (ou consequência) da viragem à direita da sociedade portuguesa, a partir do final dos anos 70, de que o Partido Socialista foi cúmplice, senão mesmo agente empenhado.
Seja como for, a 10 de Dezembro, celebra-se o 60º aniversário da Declaração Universal dos Direitos Humanos. Certamente a efeméride não passará despercebida nas instâncias internacionais, nomeadamente, no âmbito das Nações Unidas e do Conselho da Europa. Também a Associação Internacional de Juristas Democratas (AIJD) organiza uma Conferência Internacional em 11 e 12 de Dezembro, em Paris, no qual se irá debater “A invisibilidade dos direitos do homem – incluindo os direitos económicos, sociais e culturais, designadamente, os direitos à Paz e ao Desenvolvimento”, com a qual me sinto particularmente solidário.
Entretanto, por cá, a ordem comunicacional dominante irá, previsivelmente, ignorar a efeméride. Esta ou qualquer outra. Cumprirá com zelo o seu papel de anestesiar a sociedade portuguesa. O que é pena, pois não faltam motivos de preocupação quanto aos os direitos fundamentais do homem, para além das liberdades cívicas, que ninguém contesta.
Querem melhor exemplo? Atentem na nova legislação de trabalho. Na sociedade actual, o trabalho é o único meio digno de vida da esmagadora maioria das pessoas, pelo que permitir que alguém possa, sem um motivo forte, privar outrem deste bem tão essencial é um verdadeiro atentado a um direito humano fundamental. Como a nova legislação de trabalho permite e potencia...
Quem o afirma é o professor Jorge Leite em entrevista ao jornal “Público” de 17.1008 para depois acrescentar que (...) “as instâncias internacionais têm-se preocupado com este problema (dos despedimentos sem justa causa), designadamente, com as chamadas "saídas negociadas", que encobrem verdadeiros despedimentos, muitas vezes sem motivo legítimo; ou com as “comissões de serviço”, ou com o “período de experiência” e com essa estranha figura da “caducidade”(...),atrás da qual se escondem verdadeiros despedimentos.
Não foi por má vontade que o Tribunal de Justiça da Comunidade Europeia condenou Portugal por insuficiente transposição da directiva sobre despedimentos colectivos. E tudo continua a passar-se como se nada tivesse acontecido"...”
Bom fim-de-semana.
21 comentários:
Mudam-se os continentes, mas influências são laços fortes.
Aqui, no "país verde-e-amarelo" temos uma brilhante constituição, promulgada em meados de 1988, que defende arduamente seus cidadãos, garantindo os considerados "direitos fundamentais". Cláusulas pétreas foram definidas a fim de impedir que, através de políticos subversivos, conteúdos importantes fossem mudados.
Os direitos fundamentais permanecem lá. Intactos. Porém, os poderes da república apresentam-se incompetentes para ganrantir que a carta magna seja respeitada.
Em um país que luta contra a crescente onda de trabalho escravo, falar sobre direitos dos trabalhadores e a dignidade e inclusão social que o trabalho provê para a maioria esmagadora da população chega a ser cômico.
Quanto a informação sobre o júbilo da declaração dos direitos humanos, não podemos esperar nada além de uma tímida cobertura da imprensa alternativa, já que, através do monopólio de um grande grupo responsável pela formação da opinião do povo do meu país, essa data passará desapercebida.
Aproveito o ensejo para parabenizar o excelente blog.
Um drink. Bem forte....
Rum.
ola
existem tantas coisas bonitas escritas, tantos conceitos abstactos esmiuçados... em manifestos, em romances... tentados na prática com tao poucos resultados.
quase passados 60 anos, sinceramente, nao vejo direitos humanos respeitados.
excelente post.
beijinhos
Herético,
grande, grande post, e não me refiro ao tamanho, mas ao conteúdo,
que mais dizer,,,
que todos-os-dias vemos nos "media", notícias que são autênticas aberrações, sobre os maltratados direitos fundamentais, do Homem, da criança, do animal, do ecossistema,,, DOI.
olhe, pronto, para sorrir um pouco, estava eu, ontem, vinda do H de Stª Maria, onde fui com o meu filhote, eram 18h00, o trânsito, um caus, frente à reitoria da UL, não pude deixar de sorrir, e captar com a minha arcaica digital, um avião rasando um grande painel que reza o seguinte:um relógio em que os ponteiros são uma tesoura e " Código do Trabalho do PS/Menos Emprego Menos salário menos vida/Bloco de Esquerda"
Independentemente da "cor" política, no mínimo dá que pensar...(instintivamente tive um mau pensamento... e se o avião agora "pum"... que expluda em cima do raça das teorias, e dos Decretos, e... )
ou será que afinal, continua a dar-que-pensar só a alguns??!
bom-fim-de-semana e melhor semana
deixo-lhe uma castanhazita assada (é tempo delas!)
e
um sorriso :)
mariam
:))))
Num país onde a solidariedade social é uma ruína, o dia 10 de Dezembro vai seguir-se ao dia 9 e preceder o dia 11, como se nada tivesse acontecido...
Abraço
Sessenta anos passados e, quando olhamos para o que se passa no mundo, pensamos que nada mudou. Ou mudou para pior. Mesmo centrando-nos, como fazes, nos países ditos democráticos, onde são cumpridas essas três gerações de direitos fundamentais? Não em Portugal, decerto. Mas também não em grande parte dos países da Europa. Tão civilizados que somos todos...**
Admiro a tua luta e a forma como o fazes, o empenho que aí pões.
Meu amigo, o tempo não é de lutas partidárias. Não é preciso ir a Inglaterra. É preciso copiar a lição que a Espanha nos está a dar.
Quando daremos conta que Portugal corre o risco de não ser viável?
Oportunamente acutilante, como sempre...
Beijo
tuas palavras, teus ideais, como ondas, uma após outra, todos os dias, o ano inteiro, ano após ano, chegando até a praia - não para morrer! -, mas sim, para lembrar/esclarecer, à exemplo de todos os Avatares que pisaram a Terra: “a lei foi feita para os homens e não os homens para a lei”... todo e qualquer sistema que não tenha por objeto a felicidade humana (consubstanciada nos princípios por ti citados) e nos princípios de harmonia com o Ambiente, não serve à humanidade, tampouco ao planeta que nos acolhe.
grato, meu Amigo-irmão!
partilho um canto antigo:
um sonho
pra se contar
cantar
espalhar no vento
correr mundo através do tempo:
Liberdade
Igualdade
Fraternidade
um sonho
contado
cantado
ao vento
no mundo
no tempo
será somente um sonho?
sim, é um sonho. o sonho possível. o sonho concreto. o sonho bom... até porquê, se não fosse bom, não seria um sonho: seria um pesadelo!... como pesadelo é a onda consumista, estimulada pela ganância do Capital, que a tudo consome, sem jamais se saciar.
E agora o trabalho para os que restam tornou-se também um modo de escravatura. Com a redução de pessoal sobrecarregam-se outros com horas extra sem direito a nada.
E comno está mau.. calam. Trabalho hoje apenas significa sobrevivência. Uma tristeza.
beijo
... bem ao estilo de um país 'plantado' à beira da Europa...
Sensibilizada pelo teu olhar bem amistoso em 'fragmentos'!
Um beijo afectuoso
Herético
O Direito ao Trabalho e a uma remuneração que permita viver com dignidade.
São cada vez mais os trabalhadores que estão em situação de pobreza.
Abraço
Excelente!
Destaco este parágrafo:
"Não cabe aqui o balanço dessas revisões constitucionais. Mas faz todo o sentido afirmar que a restrição aos direitos fundamentais foi acompanhada (ou consequência) da viragem à direita da sociedade portuguesa, a partir do final dos anos 70, de que o Partido Socialista foi cúmplice, senão mesmo agente empenhado."
Beijinhos
Aqui o grande drama é a Selecção e tema dominante o futebol.
Agravou-se o conjunto 3-F: Fátima, Futebol , fado.
Bem hajas!
falamos de direitos conquistados mas que se estão a perder.
Olha par o que eu digo.. blablabla...
Pouca evolução é o que é.
Solidária, eu. Com o texto. Com o autor do texto. Um abraço.
A democracia cria sempre formas subtis de subverter as próprias regras.
Stella
meu caro!
a tua clareza das coisas é tão evidente que deveria afastar a hipocrisia dos que ficam cegos pq não querem ver...nunca é demais lembrar-lhes isso e ser firme na prioridade absoluta a dar à causa dos direitos humanos contra todas as violações, desvios, hesitações e, não poucas vezes, sinuosas hipocrisias...
abraços
Obrigada pelos votos. Já passou.
Para o neo-liberalismo, a Declaração Universal dos Direitos Humanos é como um daqueles discursos que fazemos em alguma solenidade: casamento, batizado, enterro, etc. Depois que passa, ninguém mais se lembra.
Um abraço!
P.S.: Não ligue muito para o que escreveu lá em cima os amigos-patrícios Gin e Rum. Pelo visto, eles tomaram absinto e encantaram-se com a fada verde. De fato, há focos dispersos de frentes de trabalho semi-escravo no Brasil, mas, nada que nos torne um país escravocrata. Pelo que leio na mídia, o tráfico de mulheres patrocinado pelos espanhóis, bem como o de de mão-de-obra quase escrava que eles exportam para o Marrocos, são muito mais significativos. Mas nenhum europeu liga para isso, estão mais preocupados em elegerem o seu queridinho da hora, o Barack Obama.
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