Como bem sabem, mais não seja que por saber de experiência feito, o rosto é o “espelho da alma”. O que significa que a história do rosto humano é a história do controle da expressão, das normas religiosas e éticas, sociais e políticas que, a partir do Renascimento e dos alvores do capitalismo, contribuíram para o surgimento de um certo tipo de comportamento social, sentimental e psicológico, baseado no afastamento dos “excessos” e no “silenciamento” dos corpos. E no recalcamento das paixões…
Estes constrangimentos físicos e morais, determinaram o aparecimento de um certo tipo de “persona”, que os autores designam por “homem sem rosto”, caracterizado por uma expressividade medida, reservada, prudente, circunspecta e calculada, por vezes, reticente ou mesmo silenciosa.
Assim, importa assinalar que a expressão do corpo e da face condensa sempre a interiorização por parte dos indivíduos das tensões, constrangimentos e dependências sociais, que modificam e deformam as sensibilidades humanas, mais íntimas e complexas.
É verdade que o desenvolvimento das sociedades modernas e a generalização dos cuidados de higiene, da institucionalização dos sistemas de saúde e de educação, da multiplicação das migrações e do aumento do bem-estar em geral, tem vindo a contribuir para homogeneizar os tipos físicos e a esbater lentamente, nas classes médias urbanas, as origens sociais de seus rostos e as marcas de seus misteres e trabalhos.
Pode dizer-se que, com o aparecimento das sociedades de massas, a identidade tende a apagar-se em cada individuo – os rostos tornam-se anónimos! Mas nem por isso fisiognomonia, ou seja, “a arte de conhecer o carácter humano pelas feições do rosto” perdeu actualidade. Por exemplo, a psiquiatria e a criminologia, sabem-no bem! E atrevo-me a sustentar que também essa “arte” será pertinente nas relações políticas e seus protagonistas, empolados pela comunicação social nas suas “marcas da expressividade”.
Nesta perspectiva, bem desejaria eu dominar as subtilezas dessa nobre arte “de conhecer o carácter humano pelas feições do rosto” para poder decifrar a natureza profunda do Ministro da Finanças, cujo rosto na sua expressividade inexpressiva e fria - verdadeiro “homem sem rosto” - ficará, pelas piores razões sem dúvida, na memória dos portugueses.
É que, meus amigos, o seu fundamentalismo ideológico e seu zelo aos cânones do liberalismo económico e, sobretudo, as torturas que infligem no corpo exangue da sociedade portuguesa levam-me a admitir, na expressão de seu rosto e na sua voz melífica, que em contexto histórico tão distante, ainda se mantêm vivos os modelos fisionómicos e culturais dos oficiantes da inquisição.
Mas devo estar enganado. Em verdade, pelo seu brilhante curriculum profissional nas instituições europeias, designadamente, como membro do Comité Monetário Europeu, a sua participação no Tratado de Maastricht, ou como Chefe do Gabinete de Consultores Políticos da Comissão Europeia talvez seja mais adequado admitir que afinal tal rosto revela espírito de porta-estandarte de “bandeiras a meia haste”, que alguns dos seus epígonos da União Europeia sugerem para a bandeira da República Portuguesa sem, tanto quanto se saiba, um arrepio de indignação de Sua Excelência…
Enfim, rostos!... E, sobretudo, políticas…
7 comentários:
... na verdade há rostos
intragáveis mesmo nos espelhos
há rostos para além de rostos.
há bonecos e bonecas de trapos.
há palhaços escondidos.
há espaços amotinados.
deixo-te um beij
Olá, como está?
Você está falar de quê?
Peixe?
* Aquele assunto não está esquecido.
Um forte abraço
"tal rosto revela espírito de porta-estandarte de “bandeiras a meia haste”
Excelente !!!
há rostos que nem sempre são o espelho da alma.
Se "o rosto é o “espelho da alma”, também é verdade que "quem vê caras não vê corações"...
Enfim, não sou especialista e o tema é demasiado complexo para mim...
Caro amigo, tem uma óptima semana.
Abraço.
É isso mesmo, Amigo. O homem, o rosto do homem, as olheiras do homem, a voz do homem, a inexpressão, o ritmo da fala, aquela mornidão ou morbidez, até o descair dos ombros, tudo me incomoda, me perturba, me assusta.
Não é ele, insípida criatura, mas o que ele representa, o que ele transporta.
Apre! O que nos havia de calhar!
Beijinho.
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