“Em
Portugal não há ciência de governar nem há ciência de organizar oposição. Falta
igualmente a aptidão, e o engenho, e o bom senso, e a moralidade, nestes dois
factos que constituem o movimento político das nações. A
ciência de governar é neste país uma habilidade, uma rotina de acaso,
diversamente influenciada pela paixão, pela inveja, pela intriga, pela vaidade,
pela frivolidade e pelo interesse.
A
política é uma arma, em todos os pontos revolta pelas vontades contraditórias;
ali dominam as más paixões; ali luta-se pela avidez do ganho ou pelo gozo da
vaidade; ali há a postergação dos princípios e o desprezo dos sentimentos; ali
há a abdicação de tudo o que o homem tem na alma de nobre, de generoso, de
grande, de racional e de justo; em volta daquela arena enxameiam os
aventureiros inteligentes, os grandes vaidosos, os especuladores ásperos; há a
tristeza e a miséria; dentro há a corrupção, o patrono, o privilégio.
A
refrega é dura; combate-se, atraiçoa-se, brada-se, foge-se, destrói-se,
corrompe-se. Todos os desperdícios, todas as violências, todas as indignidades
se entrechocam ali com dor e com raiva. À escalada sobem todos os homens
inteligentes, nervosos, ambiciosos (...) todos querem penetrar na arena,
ambiciosos dos espectáculos cortesãos, ávidos de consideração e de dinheiro,
insaciáveis dos gozos da vaidade.”
Eça de Queiroz, in 'Distrito de Évora”
(1867)
“Que
fazer? Que esperar? Portugal tem atravessado crises igualmente más: - mas nelas
nunca nos faltaram nem homens de valor e carácter, nem dinheiro ou crédito.
Hoje, crédito não temos, dinheiro também não - pelo menos o Estado não tem: - e
homens não os há, ou os raros que há são postos na sombra pela política.
De sorte que esta crise me parece a pior - e sem cura.”
Eça de Queirós, in “Correspondência” (1891)
De sorte que esta crise me parece a pior - e sem cura.”
Eça de Queirós, in “Correspondência” (1891)
9 comentários:
Tão antiga e tão actual!
Abraço
Como se tivesse falta de memória, a humanidade vive por ciclos, repetindo os erros até à exaustão. No entanto, para um observador mais atento, não deixa de ser curioso que neste Portugal há certas famílias que nunca passam pelas ruas da amargura, pois conseguem ter membros em todas as trincheiras políticas.
Este povo ainda tem tanto que caminhar...!
Abraço
E o século dezanove é hoje!
Abraço daqui
Se lhe mudaria o fim:
"De sorte que esta crise me parece a pior - e sem cura.”... por razões óbvias.
Olá!
Tenho um convite no meu blog!
Quando alguém não fica "datado" é imortal - Eça é-o.
Depois de mim virá quem de mim bom fará... Tudo certo no nosso Eça, se exceptuarmos essa outra pequena verdade de que a capacidade de alguns homens serem lobos de muitos outros homenes ser arte com capacidades notáveia de regeneração e de adaptação.
E ser cada vez mais importante o conhecimento da História.
Abraço.
Um texto de Eça de Queiroz muito actualizado nos tempos que correm.
Na verdade, Portugal,teve sempre as suas crises politicas- económicas.
Claro que os culpados desta crise em que estamos a viver, é evidentemente da corja que domina a AR e o próprio Governo.
A crise económica vive por ciclos...
Já no sécula XX- 1929, Portugal sofreu uma das maiores crises de sempre.
Está registada nos livros de história e... por ter conhecimento da ruina em que o meu avó materno ficou.
Nessa década não havia subsídios e nem ajudas financeiras.
A crise actual que afecta os portugueses, assim como a maioria dos países ( não só da Europa)... é sentida pela plebe. Os grandes e poderosos não fazem a miníma idéia da tragédia em que milhares de familias estão a viver.
Quanto aos politicos, estão bem de vida, e com os bolsos recheados.
Bem, peço desculpa pelo meu comentário tão longo e os meus sinceros parabéns pela partilha de um texto de Eça... tão actual.
Abraço.
Maria Valadas
...E quando deixará de ser assim?
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