Toma o poeta o
cinzel e seu ofício
E pela fissura
da pedra por onde a palavra espreita
Escuta o lento
germinar da água sob a fraga
Gota a gota.
Como seiva...
Nada que não
saiba. A demora é cadência
Do escopro.
Música que não rima ainda.
Rumor apenas de
água. Talvez fermento.
Selo que
resguarda. E anuncia...
Ergue o poeta o
murmúrio do silêncio
No cadinho e no
caule da sua espera.
E sopra o nada.
E busca a presa. Que arredia
Se escapa.
Fugidia...
Razão que não
queira. Rumor da língua.
Centelha agora.
Já não apenas água.
Contudo mineral
ainda. Mas já crisálida abrindo
O som da
sílaba...
Ousa o poeta
depois o fogo e a sarça.
E a chama no
interior da pedra.
A palavra ainda
é nada. Apenas o estrelar da luz.
Fogo e água. E
solidão acesa...
Nada que não
seja. Porém a palavra agora
(Feita água) é
rosto e é nome. E claridade...
Vereda de dor e
fome de humanidade.
É quimera que se
ergue no poema...
Manuel Veiga
7 comentários:
... que sugere:
«Arranca o estatutário uma pedra destas montanhas, tosca, bruta, dura, informe; e depois que desbastou o mais grosso, toma o maço e o cinzel na mão e começa a formar um homem: primeiro, membro a membro e, depois, feição por feição, até a mais miúda. Ondeia-lhe os cabelos, alisa-lhe a testa, rasga-lhe os olhos, afila-lhe o nariz, abre-lhe a boca, torneia-lhe o pescoço, estende-lhe os braços, espalma-lhe as mãos, divide-lhe os dedos, lança-lhe os vestidos. Aqui desprega, ali arruga, acolá recama. E fica um homem perfeito, e talvez um santo que se pode pôr no altar.»
Belíssimos textos ambos.
Beijo, Poeta!
Nada que na saiba o poeta. Do silêncio e da sede. Da fome e do pomo. Palavra feita fonte. Clareira
de luz ou fogo...
Tão belo, meu amigo.
Um beijo.
No rumor da língua o cinzel leva a poesia até ao êxtase.
Abraço fraterno Poeta
A intertextualidade num trabalhar belíssimo da palavra. Em surdina Vieira e o Antigo Testamento...explicitamente TU, nessa capacidade imensa de urdir a Língua.
bj
MARAVILHOSO!!! A pedra bruta do "mineral", colocada no cadinho e aquecida pelos sentimentos do poeta, atinge o seu ponto de fusão e nasce a crisálida a voar ao som da sílaba...
Amei, heretico, amei!
Beijos!
Gosto da cor!
Gosto do titulo!
E gosto mais ainda da simplicidade da capa que contrasta com o arrebatamento da cor...
:-)
Gostei muito heretico
" ...A palavra ainda é nada.Apenas o estrelar da luz .
Fogo e água .E solidão acesa..."
Talvez quimeras.
abraço
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