Nada é começo na contabilidade das horas
Nem o rugido das
esferas é vibração do cristal
Nem os passos são
a devoção dos dias
Nem as
ondas-cavas são destino de barcos...
Administramos
silêncios.
E os dedos são compasso
de um círculo
Que se ferra no
pescoço dos náufragos
E asfixia o
grito. E devora por dentro num fervor negro
Como bolor em
pão ázimo
De porta em
porta
Negado...
Somos leilão de
condenados.
Sem o sabermos. Que
nem o preço ao menos
Nos distingue na
volúpia do deve – e do haver!
Nem o festim das
coisas que esventram os olhos
Nem a náusea nos
redime
Nesta voragem...
Libertos apenas talvez
na palavra que teima
E no bruxuleante
lume da candeia
A iluminar a
gruta. E no granito
Fogo e água tímida
a soletrar
A sede em que
ardemos.
Manuel Veiga
12 comentários:
Palavras que teimam em fazer-se luz, em rasgar silêncios onde, preguiçosamente, nos embrulhamos...
Um beijo :)
Ah, se todos ardêssemos...
Ou melhor
Se todos sentíssemos tal ardor
~
~ ~ ~ "Libertos apenas talvez na palavra que teima..." ~ ~ ~
~ ~ Libertemo-nos com o verbo e mitiguemos a sede em que ardemos
~ com os amigos, resistindo tenazmente.
~ ~ ~ Dias felizes e inspirados. ~ ~ ~
Lembrei-me destes versos de Amílcar Cabral:
"...Ah! O meu grito de revolta que percorreu o Mundo,
Que não transpôs o Mundo,
O Mundo que sou eu!
Ah! O meu grito de revolta que feneceu lá longe,
Muito longe,
Na minha garganta!
Na garganta de todos os Homens"
E como tu bem disseste:
"Libertos apenas talvez na palavra que teima"
Ficam sorrisos e estrelas,
Helena
para lá do azul
ainda á água
ardente
Abraço fraterno
Grande grito de angústia que nos devora a todos nós, condenados de um qualquer leilão...
Como sempre, muito bom!!
Beijinhos
fogo libertador....
muito bom!
:)
Não sei se 'administramos silêncios' ou se de tanto sofrimento, nos ausentamos das palavras...
Mas tu nos resgatas na profunda convicção e beleza das tuas poesias.
Vim agradecer tua mensagem tão afectuosa em tempo de 'aniversário'.
beijo
Fernando Pessoa no seu '...desassossego' ja dizia que temos intervalos em que o sonho foge e só nos resta'administrar silêncios'
Tudo foi dito!
Mesmo administrando silêncios, eis que os gritos morrem no nascedouro, restam as palavras e a pequena luz que leva claridade ao negro espaço. Podem não ser muito, mas não deixam de ser passos, que unidos à consciência, a uma nova construção podem conduzir. Abraço.
A sede em que ardemos. A resistência.
Não sabemos do seu início, mas sabemos que a vamos saciar.
Grande poema!
Uma braço meu irmão poeta
Poema fantástico!
Vou levá-lo, tem de ser lido por mais gente!
Beijo.
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