Sabe-se que o conceito de Estado se associa a
ideia de Estado de direito, cujos princípios, para além constituírem garantia “de forma” da acção estatal (separação
de poderes, vinculação dos órgãos do Estado à lei e ao direito, controlo
jurisdicional, etc.), detém também conteúdo “material
concreto” de atribuição de direitos fundamentais aos cidadãos (direitos e
liberdades políticas).
As garantias jurídicas de liberdade e de
igualdade cívicas, que constituem o núcleo central da cidadania, foram
enriquecidas ao longo do século XX pela ideia de Estado Social e pela missão nela contida de realizar a
justiça social, de criar as condições reais para um desenvolvimento da
personalidade e de concretizar a igualdade de oportunidades para todos.
Assim, hoje as constituições modernas, a par dos
direitos e garantias fundamentais dos cidadãos, inscrevem também um vasto
elenco de direitos económicos, sociais e culturais, designados por direitos
fundamentais de segunda geração que, com os primeiros, integram o “acquis” histórico da cidadania.
Pois bem! A globalização
capitalista põe em crise a ideia de Estado soberano, alicerçado ao longo do
século XVIII e do século XIX e que teve o apogeu no século XX, ao ritmo da 1ª
revolução industrial e da evolução das necessidades da economia emergente. Como
é inevitável, a crise do Estado é indissociável da crise política e da
cidadania e dos direitos fundamentais que a enformam.
No entanto, nunca como hoje se falou tanto em
direitos humanos e direitos fundamentais dos cidadãos - aos direitos
fundamentais de primeira e de segunda geração, somam-se actualmente os
direitos fundamentais de terceira geração
(os direitos do ambiente) e os direitos fundamentais de quarta geração (os
direitos de protecção face à informática e o direitos sobre o património
genético, etc.).
E, se isto é verdade, também nunca como hoje, os
direitos fundamentais foram tão postergados, designadamente, no domínio
concreto da acção política e da cidadania. As causas? Bom, serão muitas e
variadas! Mas sublinho que o desemprego, a exclusão social e a miséria, põem
a cidadania em perigo, sobretudo, “pela
angústia que inspiram”. É o medo da despromoção social, de perda de
emprego e de direitos, que alastram na sociedade global, que tornam os cidadãos dóceis
e conformados...
Assim, fazem todo o sentido as prevenções
daqueles que afirmam que, no dealbar do século XXI, a mais eminente missão dos
políticos preocupados com a democracia será devolver aos Estados as suas
funções e restabelecer o primado da política sobre a economia e domar o
processo de globalização.
Caso contrário, no dizer de
alguns autores, o processo de fusão da técnica e do comércio, inscrito no âmago
da globalização, acabarão por impor à humanidade uma velocidade dramática que poderá lançar o planeta num imparável curto-circuito global.
E, como afirmam. “aos nossos filhos e aos nossos netos não
restará mais do que a recordação da idade de ouro, esses anos 90, em que o
mundo ainda parecia ter ordem e em que era possível mudar de rumo[i]...”
Profecia trágica? Talvez!... Mas quem contesta a
urgência de, no meio da dificuldades incomensuráveis, agregar forças, energias
e vontades e travar as batalhas do futuro, tendo em vista “tornar possível o impossível”?
Manuel Veiga
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