domingo, fevereiro 25, 2018

ROSA-MULHER...


Incendeias as ruas e os passos dos homens
E todos os cios. E as mulheres (in) cautas
Murmuram esconjuros
À tua passagem.

Altiva a ti, pertences. Tua alma
Apenas os poetas a cativam. Breve em cada estrofe
Para esvoaçante partires: - sina tua de amar
Em cada amor que em teu peito nasce.

Corpo mil vezes profanado. E outras tantas
Deserto. Cada palavra tua é balsamo
Nunca azedume. Ou acinte.

Amizade límpida perfuma-te as manhãs claras
E as noites inquietas - fome de vida e febre
Que te consome.

Guardarei de ti o gesto nobre de quem tudo entende
E nada espera. Singela em cada letra
Que em ti arde.

Pulsão livre do poema
Que de teu corpo se desprende.


Manuel Veiga


sábado, fevereiro 24, 2018

ANTI ROSA...


Rosa, nome de guerra!

Rosa funesta
Rosa viciosa
Rosa viciada...

Sem música
"Sem perfume, sem rosa
Sem nada…"

Rosa adiada!


Manuel Veiga





quarta-feira, fevereiro 21, 2018

POEMA MÍNIMO...



Quero poema mínimo!
Que enuncia-lo seja big bang
Do Universo

E teus olhos
Eterna vibração
Do Mistério.

E meu silêncio
A sombra ardente do Desejo


Manuel Veiga


terça-feira, fevereiro 20, 2018

ANTI - LETRADO





"Troco letras por poemas”
Proclamo.
“Estás em saldo?”
Replica o letrado.

"Não! Tenho lugar cativo
No jardim dos poetas
Sem sílabas…"


Manuel Veiga

Foto: Siza Vieira - Pavilhão de Portugal
Parque das Nações - Lisboa 


domingo, fevereiro 18, 2018

DOIS MODERNOS POETAS BRASILEIROS



Dois Poetas da moderna Literatura brasileira (ou deveria dizer baiana?), com um caloroso abraço ao meu Amigo, Poeta e Escritor José Carlos Sant´Ana, blog Nas Dobras do Dia. que me proporcionou o acesso a estes autores.


1 - TE AMO E PRONTO.

Te amo e amo e pronto
Amo sempre, todo o dia
Mas se não te amasse tanto
Inventaria
Te daria orquídeas do capão
Da cachoeira da fumaça
Um copo de água fria
Escreveria versos mesmo sem poesia
Para lhe fazer pirraça
E te dizer: te amo todo santo dia”

Gileno Félix

“O Trem, a Cidade e o Cordel” – pág 194
QUARTETO Editora
Salvador-Baía 2016


2 – Para Bárbara

“Esculpirei meus sonhos em teu rosto
E no teu corpo
Eu brincarei de novo a minha infância

Serei de novo, em ti, outro menino
E em teus olhos
Eu buscarei de novo a minha infância.

Esculpirei teu rosto no meu rosto
E no teu corpo
Eu traçarei de novo o meu destino”.

Roveral Pereyr

“100 POEMAS” – pág, 37
QUARTETO Editora
Salvador – Baía 2013


sábado, fevereiro 17, 2018

GENTE FINA É OUTRA COISA


Os projectos que o CDS levou a debate parlamentar a pretexto da “protecção” dos idosos revelam parte, do muito que ainda estará por mostrar, de quem mede o seu padrão de iniciativa e intervenção política por esse esse pequeno mundo de ilusão e opulência onde coabita.

Conceber que os problemas reais, e em muitas circunstâncias dramáticos das condições de vida dos idosos, se resolveria por via da criminalização das famílias e, pasme-se, dessa prerrogativa infalível que se lhes facultaria com o deserdar de filhos e descendentes, só podia mesmo passar por aquelas mentes. Nada que deva surpreender. Tão só o produto natural de convivialidade em ambientes de fidalguia e abastança.


Dito de outro modo, coisas de gente fina.
(…)
Ouvir Cristas a papaguear com ressonante sucesso mediático que a “esquerda” abandona os idosos” ou “não protege a população mais frágil e vulnerável”, entediada com a derrota do seu exercício de hipocrisia parlamentar, é digno destes dias de folia. Não se invocará aqui a falta de vergonha que recomendaria a não saída à rua, a menos que sob a cobertura de uma das muitas e fantasiosas máscaras condizentes com a tradição do entrudo. A questão não está no plano moral
(…)
O que se deve invocar é este refinado cinismo político de quem tendo estado no governo anterior, titulando aliás o ministério respectivo, vir com ar condoído falar das condições de vida dos idosos depois de, durante quatro anos, não terem feito outra coisa do que lhes ter infernizado a vida.
(…)

Ver FOICEBOOK

quinta-feira, fevereiro 15, 2018

ITINERÁRIOS DE LUZ...


Murmúrio de fogo e água em minúscula
Suspensão. Arrepio talvez do tempo.
Ou talvez brusca queda em direcção
Ao indizível.

Reflexos apenas pressentidos
Presos na língua e na decantação dos nomes
Antes dos rostos. Matriz ainda.

Itinerários de luz e magma à superfície
Forma-murmúrio antes do signo
E a decifração da Palavra.

O poema virá depois na fermentação
Dos detritos e no bailado das sombras
A possuir o Excesso e burilar o Tempo

E a abrir-se na caligrafia muda das coisas
Umas nas outras. E no mistério delas.

Manuel Veiga


terça-feira, fevereiro 13, 2018

ANTI METÁFORA (S)


Que expludam metáforas
E o Céu desabe!

Da poeira
Surgirá uma estrela…

E – talvez! –
Um poema.

Manuel Veiga

sábado, fevereiro 10, 2018

ANTI MATÉRIA...


Ouves-me?
- Estou do outro lado do Céu!

Escutas-me?
Dá-me tuas mãos
Cansei-me de minhas asas.

Manuel Veiga – Lisboa 2007

quinta-feira, fevereiro 08, 2018

ANTICICLONE...

Ardemos?
Ardemos!...

Que o sol seja nuvem
E meu fogo água!

E teu corpo
Céu aberto
Seja!

Manuel Veiga – Lisboa 2007




quarta-feira, fevereiro 07, 2018

ANTI POEMA...

Escrevo o nome
E disseco a Palavra
Nada encontro nela

Apenas uma máscara
Tombada
E uma vela
Acesa.

Manuel Veiga - Lisboa 2007

segunda-feira, fevereiro 05, 2018

FRAGMENTOS - Epílogo


Com a morte de Maria Adelaide, julgava-se o narrador definitivamente liberto das grilhetas da escrita, arrumadas que foram, no céu das coisas ardidas, todas as palavras ditas, pois todas aquelas que não foram, podendo ser, ficarão para sempre recolhidas no limbo eterno das meras possibilidades. Mas eis que lhe batem à porta, uma a uma, as personagens dispersas ao longo da narrativa, desde o soldado Assobio e o grupelho de reguilas alfacinhas, capitaneado pelo cabo Bonanza, passando pelo capitão Mascarenhas, Dona Rosalinda e tutti quanti, reclamando para si próprios, um destino, que seja ele qual for, mas não as deixe ficar, assim, desgarradas e suspensas, quais mortos-vivos a arrostar, ad eternum, as inclemências de personagens mal delineadas. E tudo para brilho e glória de Maria Adelaide -  enfatizam – o alfa e o ómega desta narrativa, que ela diz não ter ponta por onde se pegue.

Em suma, vê-se o narrador, “devorado” pelas próprias personagens, que exigem para si próprias um final em beleza, quer dizer, preenchida a respectiva função na arquitectura da narrativa, requerem, a final,  não serem descartadas como mera quinquilharia literária, sem préstimo.

Qual a escapatória, digam-me? Tanto mais que assumidamente o autor não existe e o narrador é apenas mera escora dos filamentos da escrita, que a torna possível, mas na qual ele próprio, narrador, se molda e metamorfoseia ,em função das exigências narrativa.

Assim o narrador nesta emergência e neste sonho, meio tresloucado, neste agora de um tempo sem tempo, a abrir-se, nas alturas, sobre as águas fétidas de uma qualquer bolanha da Guiné, toda a majestade do Céu e o esplendor da Santíssima Trindade, Pai, Filho e Espírito Santo, incarnados no profano Corpo de Dona Rosalinda, Maria Adelaide e a Dulcíssima Lia, como se fora Aparição inscrita em retábulo, ou pintura, ou fresco medieval e o Valentim, escudeiro mor do Reino dos Céus, qual centurião romano a capitanear brioso esquadrão de amazonas e a desbaratar as arremetidas dos exércitos infernais, vindos das profundezas da bolanha a arder em chamas ácidas e a extensa fila dos condenados, qual centopeia de mil pernas, ligados, derreados, chicoteados pelo chefe da Pide na Tabanca, o agente de 1ª Classe, Antunes e o “kamenino” Gaspar, “alma negra” do Armando, que assombraram a vida de Dona Rosalinda e que, caídos nas entranhas do Inferno, são os fogueiros e servos e “homens de mão”, em rigor, “almas à mão” dos Diabos maiores, o General Comandante-chefe de todos os Diabos, Demónios e Mafarricos, na sua máxima dignidade de Diabo, corpo peludo, patas, rabo e chifres de bode, a chispar enxofre pela boca e os seus lugar-tenente, o coronel “cuequinhas de renda”, também com figura de chibo, mas que, pelo avantajado cú, sempre a rebolar, se distingue do Bode Maior e bem assim o João, marido de Maria Adelaide e árvore do mesmo chão e amigo de infância do Alferes, herói a contragosto da narrativa, em palpos de aranha para chegar a bom porto, também ele, o dito João, caído no eterno fogo do Inferno, a distinguir-se das restantes classes de diabos maiores pelo tamanho do par de cornos e o capitão Mascarenhas, suspenso da forca, com a língua fora, a balançar com o sopro das chamas e um dístico dependurado ao pescoço “deixai toda a esperança, vós que entrais” e o Alferes Berros da Selva, diabo menor, com figura de mastim negro e grande coleira, sempre a rosnar, guarda das portas do Inferno, como se Cérbero fora, com três cabeças e filar as almas dos condenados pelo pescoço, mediante um simples gesto do Diabo, Comandante em Chefe, de todos os diabos, demónios e mafarricos e o Alferes Barbas, sempre de bem com todos, servindo no mesmo lance Deus e o Diabo, alma penada agora, a gemer pelo espaço a sua eterna solidão, pois que nem o Inferno o quer, nem o Céu o deseja e a extensa fila de almas, fora do tempo e do espaço, a agitarem-se e a protestarem o seu lugar na fila, e o Soldado Assobio, misto de Arcanjo S. Miguel e de bobo, saído de qualquer página de Gil Vicente, sem mãos a medir, a registar e a pesar a almas e gritar “ó da barca!”  e a encaminhá-las, as almas, para a barca do Céu ou para a barca do Inferno, conforme o respectivo peso, e agora neste tempo fora do tempo, o glorioso Padre Manuel, tio e padrinho de Lia, por sua santidade nomeado Prior-mor do Reino dos Céus a chegar à porta para serenar o chinfrim do dito Manoel Caetano avô paterno do Alferes de Cavalaria, que alferes foi, oficial adjunto do Comandante de Companhia, por acaso de graduação militar e seu padrinho de baptismo, algures numa aldeia ignorada no norte do País, bem como o Padre Casimiro, que de padre tinha o direito de rezar missa, mas ele a rezava quando muito bem entendia, que outros afazeres e prazeres o corpo lhe pedia, unha com carne, Padre Casimiro e Manoel Caetano, que ambos se negavam a entrar no Céu sem as pipas de vinho e os presuntos que com eles traziam, pois Céu não concebiam sem boa pinga e uma boa lasca, mais a mais o Assobio descobrira na nesga do registo de almas, serem ambos putanheiros e brigões, de tal forma que o Arcanjo Assobio lhes negava a entrada no Céu, não fossem eles, brigões e putanheiros, a desfazer o equilíbrio perfeito da Santíssima Trindade, o que seria o verdadeiro Caos, com o Céu e o Inferno a confundirem-se e misturarem-se e, daí então, a alma piedosa do Padre Manuel, Prior-mor do Reino dos Céus, a garantir ao atarantado Arcanjo Assobio que conhecia aquelas almas há mais de uma Eternidade e que eram, apesar dos seus exageros, almas generosas e pias e que aquilo escrito nas laudas do registo de serem brigões e putanheiros eram calúnias levantadas pelos “talassas” do Paiva Couceiro, que nos tempos idos da “traulitada monárquica” no norte do País, apenas os dois, Padre Casimiro e Manoel Caetano, valentes e feros, à força de bordoada, correram com  a secção” de “talassas”, aboletados na sede do Concelho e arriaram a bandeira monárquica do edifício da Câmara Municipal  e, em seu lugar, como era devido, colocaram a bandeira da República, removendo assim um inesperado obstáculo ao livre curso dos desígnios da Divina Providência, sendo de levar também a julgamento, como atenuante dos dois amigos, brigões e putanheiros, a circunstância do Padre Casimiro, com a sua imensa sabedoria das coisas do Mundo, ter salvo o jovem Aspirante a oficial miliciano, tenro ainda em primeira recruta, que aliás exibe o nome honrado de seu avô, Manoel Caetano, das garras e da cobiça da menina Gertrudes, mais conhecida por “Papa alferes” e de sua tia Dona Miquelina, que a imensa Misericórdia e Bondade de Deus as levou para o seu Santo Regaço e fez delas as faxineiras do Céu  e, assim, disse, ao atarantado Arcanjo Assobio, a alma do santo e piedoso Padre Manuel, que morreu, como bom pastor, no exercício de seu múnus sacerdotal, rodeado de suas ovelhas, que nunca lhe faltaram com a côngrua e, louvado seja Deus, nem com a assistência à missa, roído por uma ferida ruim que lhe corroeu a garganta e agora por mercê de Deus, Todo Poderoso, Prior-mor do Reino dos Céus e, assim dito, se aprestou, ainda que contrariado, o atarantado Arcanjo Assobio, que apoucalhado fora e agora, neste tempo sem tempo, zeloso pesador de almas, a deixar passar para a Glória dos Céus os dois amigos brigões e putanheiros, as pipas de vinho e os presuntos, sem que S. Pedro, em breve (ou propositada) soneca, tivesse dado por conta.

Assim se abriram as portas do Céus, aos dois amigos, feros e brigões, mas capazes de darem a camisa, a quem, dos seus, dela precisasse e, em cortejo celeste, guiados pela alma tísica do Padre Francisco, a quem as humaníssimas dores e o amor de Lia haviam resgatado das chamas do Inferno, era agora, neste tempo fora do tempo, Auxiliar dos Serviços Gerais da Corte Celestial e, à passagem, ia fazendo notar aos dois novos comensais da Graça Divina, os amigos brigões e putanheiros, as divinas figuras a povoarem o incorpóreo Reino de Deus, que bem se sabe ser Eterno e assim, de passagem, à esquerda ou à direita, não se sabe bem, pois tudo no Reino de Deus não tem distância, nem forma e tudo se passa num Momento, em qualquer caso a voar no espaço celestial, em harmoniosa formação de “Ordem Unida”, um coro de magníficas vozes, dirigido pelo Prof. Eduardo Filomeno, que a remissão de seus pecados e a sua enorme paciência e tolerância com um “bando de reguilas estudantes”, antecipando um “bando de reguilas alfacinhas”, capitaneados pelo “cabo da Cifra” “Bonanza”, tipógrafo da Imprensa Nacional, que cabo da cifra já não era, a pinchar clandestinamente os muros de Lisboa “Viva a Liberdade!”, assim o anteciparam os reguilas estudantes de um Liceu, algures no norte do País, a escrever no quadro negro com giz vermelho “Viva Humberto Delgado, o general sem Medo!” para pânico e o desespero do Prof. Filomeno, que estudantes, imprudentes, lhe estragavam a vida, e agora, neste tempo sem tempo, a harmonizar e fundir, no mesmo amplexo divino da música de Bach, os dois grupos de reguilas, estudantes e operários, irmanados no mesmo desígnio redentor da Pátria profanada pela injustiça e pela guerra, ambas filhas do Diabo.

E o Alferes Cartuchadas, médico e pediatra, nomeado Responsável-mor da Secção Infantil do Reino dos Céus e, como bom alentejano. a ir ao vinho e ao presunto dos abençoados transmontanos, pois bem se sabe que, no Céu, aquilo que é de um é de todos, deslumbrados que estavam os transmontanos com o Coro Celeste, agora a ensaiar “Cante Alentejano”-
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Naquele tempo sem tempo, em que os sonhos residem, a bolanha acesa era, então, água negra de mil decomposições, fétida, arrastando detritos e todas as sínteses, como o caldo primordial de todos os acasos de vida, esqueletos, carapaças, jacarés apenas olhos seguindo a presa, algas venenosas, insectos, batráquios, vermes, minúsculos seres, quase invisíveis, filando-se na carne dorida de homens inocentes. E sobre eles o Céu a abrir-se em esplendor de Luz e Cor, qual La Nave, de Fellini (ou seria o Uíge?) e toda a Paródia da Vida, em metamorfose rodopiante pelo espaço!

Acordou. Sobre a cidade, um dia de sol primaveril. Era um dia claro e límpido!  Floriam cravos vermelhos no cano das espingardas…
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E este pobre narrador, que não é um homem justo e que, por vezes, tem a pretensão de jogar aos dados com a vida, declara que ateia fogo, em praça pública, às palavras e cenas atrás escritas, em expiação, não de seus pecados ou culpas, mas de seus exageros...

Manuel Veiga

Lisboa 05/02/2018

Fim


ESCULTOR O TEMPO

Escultor de paisagens o tempo. E estes rostos, onde me revejo. E as mãos, arados. E os punhos. Em luta erguidos…  S ons de fábrica...