sexta-feira, dezembro 07, 2018

MACIOS MOSTOS ...


Abre-se a paisagem ao horizonte
Em delírio de olhos desmedidos. Memórias recidivas
Como se foram ainda açucenas colhidas
E o regaço. E o joelho incauto desguarnecido.
E viesses com a leveza de águas
Em mandil de coado tempo
A desalinhar orla
Dos sentidos.

Ergo-me e declino o nome.
Caminheiro de devoções pagãs que me visitam
Tão faceiras, que nelas me reinvento
Em néscio alvoroço.

Música que irrompe no declive do corpo. E do tempo.
E nos ecos recolhidos. Toada de abismos.
Coleante percurso dos veios
E profundos rios.

Águas bravias
Cascata de enleios
E macios mostos …


Manuel Veiga

8 comentários:

Larissa Santos disse...

UAU. Adorei o poema:))Parabéns.

Hoje : Lágrima em rio de cumplicidade
Bjos
Votos de uma óptima Sexta - Feira.


Suzete Brainer disse...

Minha nossa, que poema magnífico, meu amigo.

O percurso do poema é uma beleza rara, que nos rende
em um respirar de imensa admiração...

Este poema de alcance perfeito na expressividade da
arte da Poesia, como também, traz a voz inconfudível
do poeta. Este caminhar das palavras numa harmonia
em beleza imagética, com esta tonalidade emotiva-sensual,
sendo o poema corpo de uma música simplesmente sedutora,
a trazer os símbolos que o poeta originalmente inscreve
na raiz da sua literatura: o desejo pagã (sem limites)
em unidade com o sentir sublime de almas...
"E viesses com a leveza de águas
Em mandil de coado tempo
A desalinhar orla
Dos sentidos."

Lendo a tua poética nestes anos (assiduamente...), vejo
esta característica única e envolvente da tua maestria
com as palavras no ritual de seduzi-las e assim, nós
leitores, somos rendidos com tamanha arte, grande poeta.

Beijo.

Olinda Melo disse...

Oh là là!!! Formidable!
Está aqui tudo, não falta nada.
E esse alvoroço, néscio que seja, bebe a sua razão de ser nessa "Música que nasce no declive do corpo".

Abraço

Olinda

Graça Sampaio disse...

Muito lindo!!! Para ler e reler... Muito bom.

Muito bem, Poeta!

Beijinho

Teresa Almeida disse...

É com Chopin que se “abre a paisagem ao horizonte” E a alegria de viver “a desalinhar orla dos sentidos”. E teu poema “uma cascata de enleios”.
E a verdade é que apetece usar o teu verso para melhor sentir a “Música que irrompe no declive do corpo. E do tempo.”

Realmente arrebatador, caro amigo Manuel Veiga.

Beijos.

anamar disse...

Uma passagem atenta.
Há quanto tempo não acontecia.

Abracinho :)

Graça Pires disse...

"E viesses com a leveza de águas
Em mandil de coado tempo
A desalinhar orla
Dos sentidos."
Cito-te porque gosto quando escreves assim com a emoção à flor da pele…
Magnífico e inspirador poema.
Uma boa semana.
Um beijo, meu Amigo.

José Carlos Sant Anna disse...

À flor da pele, disse-o bem, Graça. Linguagem e memória de braços dados e o desaguar deste poema arrebatador. Desta "Música que irrompe no declive do tempo...", como uma verdade pressentida...
Um forte abraço, caro Manuel!

ESCULTOR O TEMPO

Escultor de paisagens o tempo. E estes rostos, onde me revejo. E as mãos, arados. E os punhos. Em luta erguidos…  S ons de fábrica...