Foi notícia nos jornais e nas
televisões. Os órgãos da comunicação social ignoram-lhe, porém, o nome. Reduziram-no,
assim, mesmo quando erguido em piedoso escândalo, à sua condição de
“descartável”. A notoriedade que, momentaneamente, apazigou as “boas
consciências” remeteu-o para a sua condição de marginal, coisa nenhuma na sua
(in)dignidade, zero à esquerda nas estatísticas do consumo.
Um “sem-abrigo”, portanto…
A sua insignificância, no entanto, fez
mover o Estado e o seu aparelho da Justiça. Não por ele e sua dignidade de
pessoa humana. Não para celebrar o primeiro e fundamental direito “adquirido”,
desde os velhos cânones romanos, que é o direito ao nome, em que cada um se
reconhece e que nos eleva à qualidade de cidadãos.
Nem, muito menos, para
garantir o fundamental direito à habitação, que gerações sucessivas de lutas e
combates políticos inscreveram, como direito adquirido, na ordem jurídica das
sociedades modernas.
João Luís Mateus Sarzedo é “sem-abrigo”.
Sem direito ao nome, nem direito a habitação. Mas foi julgado e condenado, em
sentença judicial por um crime nefando: em 11 de Fevereiro de 2010 tentou
“apropriar-se” (antes de ser “direito adquirido”, não será a “propriedade um roubo”, como dizia
Proudhon) num supermercado Pingo Doce de um polvo congelado, ou parte dele, e
uma embalagem de champô.
O perigoso delinquente não passou,
porém, a malha da segurança e os artigos em causa foram recuperados no local
por prestimoso funcionário. Dizem as notícias, que fora o crime consumado e o
dano não ultrapassaria a módica quantia de € 25,66 euros. Mas o Estado e toda a
parafernália da Justiça mobilizaram-se em sentença exemplar e o arguido é
condenado à revelia em 50 dias de multa, equivalente a € 250 euros, isto é, cerca
de dez vezes mais que o preço do polvo e do champô…
Para glória profissional da douta juíza
que considerou não serem os produtos em causa necessários para “satisfazerem uma necessidade essencial”
e para conforto do “patriótico” do merceeiro mor do reino, que não brinca em
serviço e não quer “dar sinais errados à
sociedade...”. Mais a mais, como bem sabem, “o que é bom para Jerónimo Martins é bom para… a Holanda”...
Pode, a partir de agora, a sociedade
portuguesa ficar tranquila. A vergonhosa participação crime e a zelosa sentença
são penhor seguro. O “direito adquirido” a segurança individual e colectiva é
plenamente assegurado na “exemplar” sentença...
Descansem, pois, cidadãos de meu País
doente...
E o senhor Presidente do Supremo Tribunal de Justiça bem pode esgrimir argumentos e, sabiamente, sustentar que o ataque político contra os direitos adquiridos é “abrir a Caixa de Pandora”...
E o senhor Presidente do Supremo Tribunal de Justiça bem pode esgrimir argumentos e, sabiamente, sustentar que o ataque político contra os direitos adquiridos é “abrir a Caixa de Pandora”...
Enquanto o direito de propriedade
prevalecer sobre os restantes direitos a Caixa de Pandora estará despudoradamente
aberta, exalando seu fétido odor...
9 comentários:
Enquanto a "Justiça" se sujar com estas mesquinhices bem podem os Loureiros , Isaltinos e quadrilha dormir repousados.
Boa semana
O João Luis não roubou, apenas procurou recuperar uma pequena parte do muito (tudo) de que esta sociedade desumana lhe espoliou, a ele e a tantos outros, ao longo da vida.
Abraço
Tem razão, meu amigo, a nossa "justiça" fede...
Abraço
Felizmente o valor da acção não deve dar hipóteses de recurso ao merceeiro, senão ainda ia até ao Supremo.
Abraço
justiça tarda mas não falha(Acho que não é neste País)
uma boa semana!
beij
Esta situação é um exemplo da mesquinhês e da falta de vergonha daqueles que, direta ou indiretamente, são os maiores causadores das assimetrias sociais escandalosas que dão origem a situações destas.
A Justiça funciona (mas não muito)...
L.B.
Com esta escória
ladrão é o que recupera uma lata de polvo
se fosse uma tonelada de polvo
seria absolvido
Há esperança que no meio de tanta vergonha , em alguns lances da abertuta da caixa de pandora se encontre réstias de dignidade.
Tomara.
bons dias heretico
não é só este desgraçado que anda a precisar de "roubar", então não é do conhecimento geral (pois ele já se lamentou) que até ao presidente não lhe chega o dinheiro para as suas despesas. eu até acredito pois se ele diz isto é porque não ganha o suficiente para comprar os comprimidos que devia tomardiariamente e o impediriam de dizer patacoadas.
ao menos o outro também precisava de tomar os comprimidos e não toma mas, como não é piegas, não se queixa. e não anda a roubar. pois não??
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