No seu aparato, o poder mediático
reveste-se das suas próprias liturgias de poder, não apenas pelo seu papel
social (e a quem serve), mas porque como verdadeiro poder é visto pela
sociedade, que o identifica como algo superior, definidor da realidade, revelador
da verdade e criador de mitos, celebridades, que alimentam o imaginário
colectivo.
A especificidade da questão é que o
poder mediático se realiza numa espécie de “submissão
voluntária”. A interiorização subjectiva dos modelos e comportamentos
sociais e, sobretudo, a interiorização do “olhar
do outro”, que o poder mediático exponencia, transforma cada indivíduo
concreto no seu próprio vigilante.
O temor interiorizado “do que os outros vão pensar” (por não se
frequentar tal o tal meio, conhecer a vida de tal celebridade, usar tal marca
de vestuário, etc. etc.) constitui motivo de submissão voluntária à ordem
estabelecida e ao consenso social, ou seja, constitui um poderoso e subtil
elemento de sustentação (pela inércia) do sistema de poder.
Como romper o cerco?
Importa acentuar que, como indica Marx,
a história é construída a partir das condições existentes e que a superação de
uma formação social passa necessariamente pela identificação das manifestações
próprias do respectivo poder.
Acontece que, desde o início das
sociedades modernas, os meios de comunicação contribuíram decisivamente para a
construção e a modulação das formas de pensar e os comportamentos dos
indivíduos e para a consolidação das sociedades capitalistas modernas. Como se
sabe, um dos traços fundamentais do mundo contemporâneo é exactamente o
inesgotável fluxo de imagens e de conteúdos simbólicos, que conformam a
realidade, as relações sociais e a subjectividade individual.
A realidade exige assim que os cidadãos
saibam lidar com a espectacularidade
da informação que invadem diariamente a vida quotidiana e com o impacto do
fluxo acelerado de informações, imagens e acontecimentos, que os envolvem.
Saber interpretá-los e dar-lhe um significado será uma forma de exercício do
poder por parte dos cidadãos, que irá contribuir seguramente para destruturar
os poderes dominantes.
Assim, importará ter presente que, se é
verdade que somos produtos da sociedade, também somos nós, cidadãos, os
produtores da sociedade que almejamos. Não somos meras marionetas de um jogo de
forças, nem meros expectadores dos embates dos diversos poderes.
Cada um de nós
é co-autor da trama em que os poderes se tecem. E, portanto, o nosso silêncio e
passividade, ou a nossa acção decidida irão contribuir para manter ou alterar o
estado das coisas.
Afinal, onde “há poder há resistência”. E toda a resistência cria por si novas “formas do poder-saber”.
Quer dizer, fundamentos de uma
vida-outra...
3 comentários:
Excelente!
Mas sobrevive a questão (em termos práticos): COMO ROMPER O CERCO?
Mesmo que o "poder-saber" tenha de ser um novo "Contra-poder".
Abraço
Oi heretico
Eu que vivo costumeiramente a ler poesia e, quando não a fotografar mares e flores, me pego lendo seus 'fundamentos ...', há de convir que as'peculiaridades',me deixam embaralhada;
não sei dizer nada, só aproveito a deixa de vir a ti, pra deixar um bocado de ternura onde houver 'resistência' rs
grande abraço
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