Hoje a várzea e sobre o
rio o festivo freixo e sua sombra
E o cantar do melro no
amarelo doirado do sol em fim de dia
E esta pedra no
inamovível tempo em que me sento...
Nem sequer a melancólica
aragem, nem o restolhar da memória
Como insecto em flor.
Nem o mel silvestre da infância.
Nem o vime. Nem a aurora
do sonho. Nem o cântico nas igrejas...
Apenas o alvoroço
tardio. E esta pedra absurda no caminho
Como trono. E meus dedos
desfiando contas. E o mistério
Inaudito das palavras. E
o perfume da dor em cada ausência...
Fenecem grinaldas. Que
as cores são apenas nevoeiro
Dos sentidos. Agora o
vinho é espessura em bocas de desejo
E o corpo é porto.
Ardendo. Como lava em que me extingo.
Manuel Veiga
13 comentários:
Que o porto do corpo (te) seja sempre de abrigo
Tudo de bom
"...E esta pedra no inamovível tempo em que me sento...", imaginária ou não, é um lugar de meditação.
Poema Maior, Manuel.
Boa tarde, Amigo.
Em contacto: espaço, memória, canto sagrado, fogo tardio…
até que, em chama, o poema se cumpre.
E dá gosto ler.
Beijinho, Manuel.
Um momento inteiro numa mão de versos que não são só teus. Não existem proprietários de poesia, apenas rendeiros. Rendo-me aos poetas transmontanos.
Corpos portos, aeroportos, centeais, montados, parques, paióis? Ou barcos, aviões, palha, árvores, máquinas, armas?
Não interessa, interessa apenas que se encontrem os humanos.
abraço em verso
Para ler, escutar a musicalidade das palavras e sair com saudades de voltar.
Beijo!
Torga deve ter sentido emoção idêntica em Galafura.
No poeta, estes olhares nunca são tardios. Talvez as palavras, mas elas sabem quando é o seu tempo.
Além da beleza no todo do poema, gostei imenso da cadência que lhe imprimiste, como câmara a filmar...
Bjo, Manuel :)
O fluir da poesia, em toda a sua plenitude...
Parabéns Poeta por mais um maravilhoso texto.
Peço desculpa pela ausência , mas estive sem pc.
"O corpo é porto" que se extingue lentamente desde a cabeça dos dias, entendo eu, "desfiando contas", como diz o Poeta, no tom da poética a que nos habituou.
Abraço.
Existimos num corpo que será " porto" de todo um ser interior que, segundo um pensador, será eterno no significado que vai deixando na vida dos outros; o corpo é porto até um dia, aquele dia em que uma onda, tremendamente raivosa ou mesmo aquela suavezinha que serena beija a areia, chega e o leva para as profundezas do oceano ou o atira para o infinito dos céus. Enquanto isso, vamos caminhando pelos caminhos que são postos à nossa frente, desviando pedras, observando a flor, admirando o cantar do melro, tentando colorir a escuridão deixada pela dor das perdas, das ausências voluntárias ou obrigadas. E, enquanto o corpo por aqui for porto deixemo-nos embalar pela brisa suave dos ventos, pelas ondas meigas que nos beijam os pés, pelos insectos que, nas flores, procuram o mel; sentemo-nos na pedra e, tranquilos, observemos a lava que, espesse, desce vulcão abaixo. E assim correu a pena sobre a folha branca, deslizando em magnificas metaforas até encontar um belo punhado de versos e assim construir um belo poema que a todos encantou. Obrigada, amigo! Fica bem!
Emilia
Corrigindo....espessa
Emilia
O poema em páginas abertas da memória a narrar toda
a emoção, no toque desta saudade, do tempo como sombra,
de todas paisagens colhidas na pedra-corpo do poeta
que observa...
As palavras regem os sentires dos sentidos. O vinho
como passaporte de outros sentires, no fogo por
dentro das palavras na viagem poesia.
Muito, muito belo, Poeta amigo.
Sempre excelência este teu caminho poético, caro Manuel!
Beijo.
Perpassa deste bucolismo uma certa nostalgia...
bj
Caríssimo amigo,
Também queria estar à sombra deste freixo com essa musicalidade a me apaziguar os ânimos, pois aqui a totalidade anímica se encontra na vibração máxima e contagia.
Forte abraço,
Enviar um comentário