Manuel
Maria, sentia-se um tanto perdido no emaranhado de linhas, novelo de escrita do
qual emerge como escritor, procurando dar coerência ao fluxo de emoções
várias e sentimentos díspares, cerzidos uns e outros apenas pelas pontas e em
risco de, em frágil equilíbrio, desabarem, qual funambulista que, na corda
bamba, lança ao ar bolas ou argolas e que a mínima distração ou gesto mal
medido pode deitar tudo a perder e fazer ruir todo o edifício de fantasia e arte,
assim Manuel Maria, neste tempo na
narrativa, a segurar o fio das suas emoções, procurando colocar ordem nos seus
pensamentos, bem sabendo que, da obsidiante pergunta sobre o que fazia ali a Cléo, mais cedo que tarde conhecerá a resposta.
Porém,
outros fios, veredas e caminhos se atravancam e percorrem a recriação da sua
vida, invisíveis filamentos que moldam a
matriz, memórias que ardem, perguntas acesas para as quais ainda não tem
resposta, como, por exemplo, o que
fazia ali, já não a Cléo, mas o que faz ali Flávia, apenas prenúncio de personagem que, em um tempo
outro, irá marcar, qual incisão no corpo mártir da escrita, que tudo aguenta, o
território da sua expressividade, quiçá a cúpula do edifício tão laboriosamente
encenado, assim os desígnios da narrativa, que sem rebuço se diz literária, se
cumpram e o escritor Manuel Maria tenha engenho e arte para, “levar a Garcia”, a Carta Que Nunca Escreverá.
Mas,
antes, porém, as dores da escrita o levarão a outras paragens e a outros
recantos da memória, donde salta, de vez em quando, a chispa de entendimento
das coisas e dos afectos, bem se sabendo que, por muitos que sejam os rodeios e
evocações, é a matriz e o barro, de que cada um é feito, que servem de aguilhão
e, agora, neste tempo narrado, Manuel Maria a retirar da penumbra, em seu jogo
de espectros, o escritor
e as suas angústias existenciais e inseguranças, já
não em saber-se como se
escreve um romance ou se ergue uma personagem, pois que, na sujeição da escrita, como em
qualquer realização humana, bastará erguer a
espada e espada faz-se, mas ir bem mais
fundo e interrogar-se como, no grande livro da vida, se constrói um homem, seja em Literatura, seja na Vida, pois, em rigor,
não se sabe se é a Literatura
que imita a Vida, ou se, mais
exactamente, será a
Vida a imitar a Literatura.
9 comentários:
Uma leitura interessante!! :)
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Pele aveludada onde passeiam os sábios.
Beijos e um excelente dia... :)
Um capitulo muito interessante, embora lhe deva confessar que desde Fevereiro que não acompanho a história, pois não consigo estar muito tempo no computador por causa do problema dos olhos e também por falta de tempo já que tomava conta da minha neta bebé e desde que encerraram as escolas tomo conta também da mais velhinha, e elas requerem muito tempo e atenção.
Abraço e saúde
E aqui temos Manuel Maria numa pausa, em tempo de introspecção,
procurando organizar as linhas com que vai costurando esta história.
E muito terá ele de alinhavar pois os vários tempos que se entre-
cruzam assim o exigem.
E agora surge, apenas entrevista, pelo menos
para mim, outra personagem, a Flávia. E claro, fico já em ânsias
desejando saber qual o papel que irá desempenhar.
Daqui envio ao Manuel Maria os meus votos de um bom deslindamento
da trama e que não dê folga ao escrevente.
Abraço, Manuel Veiga.
Olinda
A personagem desta narrativa, Manuel Maria, sente a ânsia, ou a angústia, ou a sua fraqueza diante da empreitada, o romance a ser escrito, que depende unicamente dele ( e das palavras, que garimpa) para a sua concretude. Mas Manuel Maria já conhece a luta que trava com as palavras, como conhece os seus labirintos. Sabe ele, também, não ser o único escritor a desafiar a palavra com roupagens enganadoras, e suas metamorfoses. Mas o personagem já está construído na mente do escritor, falta apenas a história, da qual ele será o suporte.
Caro amigo Manuel Veiga, gostei muito desta sua excelente narrativa. Meus parabéns ao Escritor e Poeta.
Votos de uma boa semana, amigo Manuel.
Gostei mesmo muito das divagações do escritor, da sua ansiedade e preocupação em edificar uma obra que adivinhamos robusta e chamativa. A isso já estamos habituados. E acompanhar as novidades que vão surgindo é um prazer que não dispenso, como se convidada a opinar em cada fase da construção.
Manuel, repara que não me esqueço do teu gosto pela arquitetura. Na verdade, a arte tem filamentos invisíveis que interligam as mais diversas expressões.
Um beijo, caro amigo.
Abraço, Manuel. Essa mesmíssima incerteza me guia cada poema desde que me conheço.
Escrever um romance e construir personagens coerentes não é tarefa fácil, não....mas é bem mais difícil construir-mo-nos como pessoas na vida de todos os dias, sem dúvida.
Abraço com votos de bons feriados
E agora, José?
Aguçada a minha curiosidade pela Flávia, confesso que meu interesse é saber da Cléo, não sei porque razão ou razões.
Gosto das divagações, das dúvidas, dos entremeios, da sutileza com que envolves o leitor.
Aliás, a sua escrita é sempre primorosa, resta-me ou resta-nos aguardar os desdobramentos desta narrativa. Já não é promessa...
Um forte abraço, Manuel!
Boa tarde Manuel,
É um prazer ler a sua narrativa tão rica tanto a nível do enredo como dos personagens!
Um deleite para o espírito.
Beijinhos e bom feriado.
Ailime
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