terça-feira, abril 05, 2022

SOBRE A RELVA DA TARDE

 

 

Lisa nos dedos cresce a forma e o seixo

Como linhas libertas na geometria do sexo

Ou prolongamento das coxas reclinadas

Em espera do gesto líquido de colhê-las…

 

Acendem-se brisas sobre a relva da tarde

Nos corpos como tochas entre gritos

Corvos brancos no círculo dos sentidos

Limiar de fusão entre o sexo e o seixo…

 

Rebolam-se cavalos no declive dos seios

Línguas como vespas ferradas como lapas

Cio estival de dias solarengos nos lábios

Enrolados como os potros sobre éguas…

 

Revolve-se o seixo e as coxas, arde o sexo

Na boca a saliva das horas maturadas

Tomba a paisagem sobre os corpos e voam

Pássaros no espasmo vulcânico dos dias…

 

Abrem-se grutas, argila líquida nas línguas

E nos dedos como linhas modeladas explode

O seixo e nas horas e nos dias gritam aves

Em côncavo percurso de ondas retomadas…

 

Enlaçados em dolência de cigarras ora acesas

Restolho quente dos corpos desnudados

Nada corre. Suspensos arde a sombra apenas

E crepitam os dorsos no cântico da tarde…

 Manuel Veiga

Coreografia dos Sentidos- pág 106

Edicão MODOCROMIA

2 comentários:

Ailime disse...

Boa noite Manuel,
Um poema muito belo e sensual, em que as metáforas primam pela excelência.
Um beijinho e continuação de uma boa semana.
Ailime

Olinda Melo disse...


Eis o Poeta no seu exercício de escrita poética, esgrimindo as palavras como
lavas que um vulcão incandescente deixa
escapar. E potros na relva da tarde
cumprindo um ritual que nos vem desde
o princípio dos tempos.

Assim é. O fogo arde. E a água, líquido
benfazejo, mata a sede do caminhante.

No prefácio do seu livro, "Coreografia dos Sentidos", Domingos Lobo faz um comentário a este Poema que se lhe ajusta na perfeição.

E eu digo:
Que Poema poderoso este, meu amigo Manuel Veiga!

Abraço
Olinda

UM SORRISO “FREAK - Poema de Natal

Gosto de pessoas. Por vezes próximas, respirando ao mesmo ritmo!.. Outras (quase sempre) apenas momentos, riscos de acaso, meteoritos inte...