quarta-feira, janeiro 17, 2024

HORIZONTE LÍQUIDO DO TEJO


Vicejam espinhos nas ruínas do tempo

E os rios medem as margens no sobressalto das árvores...

 

Em seu pudor - ou resguardo - a palavra lateja. Mítica.

 

Clandestina embora atiça o fervor que germina

Nos rostos calcinados e na amargura dos homens.

E o alvoroço ganha então asas nas veredas do sangue.

E no percurso inóspito dos passos...

 

As mulheres revestem-se de sibilinos gestos

E soletram a boca das crianças

Nas migalhas...

 

E erguem o olhar pleno. Antigas ânforas

Que repletas extravasam. E minguadas se aprestam

A todas as sedes e a todas as urgências.

E que de mão em mão passam. Gloriosas...

 

Fecundos são os dias assim pressentidos

Que amadurecem como crisálidas. E se soltam serenos

Na arribação das aves. E nos ritos da memória...

 

E se advinham no pulsar expectante da cidade

Ainda agora cais. A erguer promessas.

 

E a desenhar velas

No horizonte líquido do Tejo...

 

 

Manuel Veiga

2 comentários:

Olinda Melo disse...

Olá, Manuel Veiga

Este Poema é lindíssimo e diz-nos
tanto tando no extravasamento das
suas margens, que acrescentar mais
alguma palavra é estragar a harmonia
e o ritmo de que se reveste...
A Palavra, mítica, continuará aqui
incólume.
Um abraço.
Olinda

Olinda Melo disse...

Onde se lê "tanto tando",
deverá ler-se:
"tanto tanto"

ESCULTOR O TEMPO

Escultor de paisagens o tempo. E estes rostos, onde me revejo. E as mãos, arados. E os punhos. Em luta erguidos…  S ons de fábrica...