Às portas da
cidade rarefeita por onde
Os lobos marcam lá
dentro a paisagem em seu registo de sangue
E ódio e se
devoram senhores do tempo
E os cães
famélicos são apenas os restos do banquete
E da apoteose da
morte...
Às portas da
cidade por onde o grito se perfila
E os rodízios e
as alavancas gemem num chiar de surdos
E o canto se
entope nas gargantas. E pela milésima vez
Bandeiras
esfarrapadas cobrem as chagas
Expostas como
fístulas poluídas...
Às portas da
cidade onde fervem as vitórias e todas
As desistências
são possíveis e os heroísmos são verso e reverso
De tudo ou nada.
E os homens se reconhecem
E são barro ou
aço na dimensão comum do seu destino
E da entrega à
incerteza e ao sobressalto...
Às portas da
cidade por onde um poeta sem nome
E sem glória aclara
a voz com cítara desajeitada
E recolhe os salvados
de todos os naufrágios
E com eles as
dores e as fomes descarnadas que se perfilam
Num deserto de
agonia trágica...
Aí nesse mítico
lugar de batalhas destroçadas e de furtivas
Esperas. Aí às
portas da cidade por onde corre o sangue
Fermente e o
medo se fecunda no rugir dos ferros e dos ventos.
Aí nesse mítico
lugar solto meu grito de guerra e me jogo
Farrapo de azul vertido
nas velas rasgadas de um qualquer
Moinho perdido
no horizonte dos dias...
Manuel Veiga
"Poemas Cativos" - Poética Edições - Maio 2014
1 comentário:
este é (mais) um poema que vou levar...para não esquecer e guardar.
já o tinha lido e, na altura da publicação, achei-o brilhante.
abraço, MV
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