sexta-feira, agosto 31, 2018

POEMA HIPERMODERNO ...



 … Retomo o discurso no ponto em que estávamos!

Nada do que ficou dito merece outro registo
A não ser o vácuo aceso das palavras
Que se entretecem irrestritas.

Na verdade que importa o tempo e o modo
Em que as palavras foram ditas? Depois de escritas nada
Nas palavras ditas permanece noutras palavras
Que fenecem já mortas. Antes de serem escritas…

Desditas as palavras continuam ditas!...

E na verdade inscritas noutras palavras
Que embora ainda não ditas serão logo desditas.
Cacofonia das palavras ditas. Tempo e Modo e o vazio
Das palavras que uma vez ditas serão logo escritas
No som das palavras que embora desditas
Serão sempre ditas…

… Retomo o discurso no ponto em que estávamos!


Manuel Veiga





... E, no entanto, as palavras podem ser tão belas!

11 comentários:

Jaime Portela disse...

O ciclo é vicioso, ainda que sempre diferente. Como este poema, feito de palavras já ditas...
Excelente, gostei imenso. Parabéns pelo talento.
Caro Veiga, um bom fim de semana.
Abraço.

Emília Pinto disse...

" Palavras leva-as o vento", mas o vento nāo leva as marcas que deixaram ao serem ditas; as palavras são perigosas e por isso devem ser bem pensadas antes de ditas ou escritas; não há palavras desditas por mais que tentemos dizer que não eram aquelas que queriamos dizer ou escrever; foram ditas e a sua marca ficou funda e nāo há como apagar; podemos apagar as escritas, mas antes de serem lidas; nāo há nada que guarde tão bem as palavras como a nossa alma que as retem para sempre, em forma de cicatrizes ou em forma de sorrisos ao serem recordadas. O papel não é um lugar seguro...podemos rasgá-lo e lá se vão as palavras...até que voltem a ser ditas, até que de novo sejam escritas. E lá vão elas, como a vida, sempre em frente, ora ditas, ora escritas, mas, creio...nunca desditas.
Finalmente cheguei aqui para me deparar com palavras tão bem escritas e que levaram a que outras aqui ficassem inscritas. E assim são as palavras de boca em boca ditas e por todo o lado escritas e inscritas. Interessante!!! Um beijinho e um bom fim de semana
Emilia

LuísM Castanheira disse...

'as palavras sao como flechas; atiradas, nada as faz regressar ao arco."
(palavra, que nao percebi nada...desse ponto onde estavas, mas concordo contigo: "... E, no entanto, as palavras podem ser tão belas!").
acertaram em alguém e eu nao sei quem...
um abraço, caro MV

José Carlos Sant Anna disse...

Caro amigo Manuel,

Não perguntei se posso entrar porque encontrei a porta aberta.
E aproveito para dizer que Maria Emília já traduziu tão bem as palavras escritas que não irei eu desdizê-las, se estão bem ditas pelos dois poetas.
E vamos lendo as ditas e "adivinhando" as entreditas...
Abraço, caro poeta!

Manuel Veiga disse...

Caro Luís Castanheira,

as palavras que publico no blog não têm destinatário concreto, são destinadas simplesmente a quem me concede o privilégio de as ler.
dito de outra maneira - não envio "recados" pessoais nos textos que publico.

o "Poema Hipermoderno" foi-me "soprado" pela recente leitura do livro "Os Tempos Hipermodernos" - Gilles Lipovetsky e Sébastien Charles - Edições 70 - Lisboa, Nov.2014

abraço

Larissa Santos disse...

Palavras para quê? Fabuloso. :))

Hoje, do Gil António:- Lágrimas em pingos de amor

Bjos
Votos de uma boa noite

manuela barroso disse...

Penso eu que as aliterações e os trocadilhos ( em que és , de resto , mestre) , personificam as palavras . E nós , corremos atrás da sua ( tua) beleza !
Beijinho , querido amigo Manuela

( as minhas lacunares presenças deve- se a uma “multi resistente” que me tira há muito as palavras ...)

Ailime disse...

Boa tarde Manuel,
As palavras quando ditas e desditas são sempre belas e proporcionam, como neste caso, magníficos poemas.
Gostei muito.
A música é linda e gostei de a recordar.
Beijinhos e um bom fim de semana.
Ailime

Tais Luso de Carvalho disse...

Meu amigo Manuel, também gostei do comentário da Emília, tão bem elaborado sobre as palavras ditas, o qual, algumas se transformam em poderosas armas de destruição, prefiro as não ditas, essas, pelo menos, deixam um fio de generosidade.

Beijo, um excelente fim de semana.

luisa disse...

Palavras puxam palavras, dizem-se e desdizem-se ao sabor das conversas. Ou não. Mas sim, há que recomeçar sempre, do mesmo ponto ou até de outro qualquer.
:)

Teresa Almeida disse...

Fascinante exercício, meu amigo Manuel! Entretecer palavras e voltar ao "ponto em que estávamos" acontece tantas vezes! O encadeamento está perfeito. E o apoio musical também.

Beijinho.

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