Na
lisa permanência do tempo ressaltam
De
quando em quando, pequeníssimos fragmentos
Algumas
frações mínimas – um relance de um rosto
Que
se abre à nossa passagem e que saído da multidão
Parece
querer abraçar-nos – ou uma outra notícia sem memória
Caída
do cesto das notícias espessas
O
do comentário erudito que nos emociona.
Ou,
então sobra sempre o poema que um dia
Havemos
de escrever e nunca mais vêm à claridade.
E,
no entanto, haverá talvez uma mão clandestina
E
uns centímetros aveludados da pele nua – uma carícia
Que
fica tatuada na polpa dos dedos.
Porventura,
um amor irreal coberto de palavras
Inventadas,
onde o fogo abrasa e os dias
Cristalizam
em pequenas doses de tempo
Fluido
– entre a quimera e a dor mordente –
Uma
fina dor a desaguar na avalanche da vida
Onde
se joga o “homo faber” e se perde a liberdade
Nas
minudências festivas e no fervor das grilhetas---
Assim
caminhamos, frágeis e vulneráveis
Por
entre a multidão que nos é estranha
Apressados
e sem tempo, que o tempo alienamos
E
dele colhemos apenas a margem e a miragem
Presos
uns aos outros pelos longos dedos da solidão
Manuel
Veiga
08.01.2022
17 comentários:
O tempo como dono e senhor de tudo e até de nós, toma-nos o pensamento e, depois, despedaça-o.
Fragmenta-o em mil bocados e "dele colhemos apenas a margem e a miragem".
Acabamos, "presos uns aos outros pelos longos dedos da solidão"...
Belo poema, Caro Poeta.
Um abraço.
Olá, meu caro amigo Manuel,
bem hajas, como vivem vocês aí em Portugal.
Que sorte a minha iniciar esse 2022 lendo esse seu belíssimo poema. O nobre poeta deu-nos esse belo presente de Ano Novo.
Então fica aqui os meus parabéns e o meu obrigado pela partilha, nobre Poeta.
Um excelente domingo, com muita paz.
Grande abraço, amigo Manuel.
Sempre um prazer chegar aqui
Bom ano
A solidão é a maior doença do nosso século. Uma pandemia para a qual não há vacina.
Abraço, saúde e um ano 2020 com muita saúde e alegria
E o tempo vai passando inexoravelmente por todos nós, deixando as suas marcas, levando sonhos, trazendo réstias de esperanças e lá vamos seguindo, presos muitas vezes nos "longos dedos da solidão".
Belíssimo poema.
Abraços
Talvez que a mão clandestina, na pele nua, seja a forma mais eficaz de combater a solidão.
Obrigado pela sugestão da ligação.
Abraço amigo.
Juvenal Nunes
E de novo o tempo esse nosso aliado, mas também nosso inimigo que corre sem dó nem piedade, até que um dia , num instante, ele pára de contar para nós, mostrando-nos a nossa fragilidade. Mas, poucos se importam com isso e continuam a correr mais que o tempo, por entre a multidão ,também ela apressada numa ânsia de conquistarem o mais que puderem, nesta vida que pensam ser infinita para eles, só para eles, claro, porque são especiais. Ledo engano! O tempo é sempre o mesmo, mas nós vamos mudando muito com o tempo e é bom que aprendamos que este tempo que o tempo nos tem dado, tem limites e deve ser tratado com respeito, dando-lhe o devido valor, vivendo-o com calma, sabedoria e equilibrio. Já não teremos muito tempo, neste tempo que nos foi dado viver. Aproveitemo-lo com sensatez. Beijinhos, Manuel e que o teu tempo seja vivido, especialmente com saúde
Emilia
O tempo...a solidão e um belo trabalho poético.
Como já é de se esperar deste espaço e do Poeta MV.
Um domingo feliz..
:)
Aproveitemos então as frações mínimas, os poemas sobrantes, as miragens que sejam.
:)
Pela margem do tempo procuramos as palavras, os gestos, tudo o que nos toque a alma, tão desprevenida daquilo que é mais sensível. Que dizer do teu poema, onde já disseste tudo com a sensibilidade que te é própria.
Muita saúde para ti e toda a tua família.
Uma boa semana.
Um beijo.
Ah, mVeiga como achei bonito esse 'amor irreal coberto de palavras'!
e concordar que esse tempo 'tão inventivo, compositor dos destinos'
que tamborila ritmos desiguais, nem sempre no mesmo compasso_ como canta também o outro poeta, aceite nossos pedidos e deixe o cesto sempre cheio de palavras e amenize nossa solidão.
Belíssimo!
e abraços, deixo aqui.
Boa tarde Manuel,
Como sempre, um poema genial que muito apreciei.
A pressa e a solidão a asfixiarem-nos no tempo que é tão breve.
Um beijinho e bom Ano, com muita saúde.
Ailime
É triste a solidão, é um vazio de si mesmo. Quando começamos a gostar de estar sós, estamos em solitude, a nossa própria companhia que nos abraça e nos faz sorrir. Infelizmente, nem todos conseguem estar na solitude.
Um beijinho 😘
Boa tarde! Bela e profunda poesia de um tema tão instantâneo como o tempo.
O relógio não para, os dias passam ligeiros, quando vemos morremos.
Parabéns pelo blog e pela poesia. Abraço e uma ótima tarde.
E o tempo a tudo assiste, impávido e sereno, já que tem tempo de sobra para ver o caminho que vamos percorrendo e até para preservar poemas como este e o seu autor, que será presente para lá do nosso tempo.
Os meus aplausos para a excelência de mais um teu poema, quase todos os que escreves, de resto.
Continuação de boa semana, caro Veiga.
Abraço.
Nós e o tempo, nós e as palavras que ele engole não permitindo que nos ajustemos ao que ainda nos resta para sonhar e realizar . E na obsessão da eternização da vida, ele acorda-nos para a crua realidade da nossa finitude.
És um grande pensador, um grande poeta, Manuel
Um beijo com saudades
Meu amigo Manuel, que belo poema que fala do tempo que no início de nossas vidas nem pensamos se é bom, se é muito, se é pouco, não importa isso. Na verdade, começamos a pensar e a brigar com o tempo, quando estamos já maduros, quando já passamos por tsunamis, por tempestades, por enchentes, secas... e já vivemos as tristezas acumuladas, também. E aí que o tempo tem seu maior valor e nos damos conta que é preciso mudar urgente... para começarmos a viver.
"Ando devagar / Porque já tive pressa
E levo esse sorriso / Porque já chorei demais..." ♪♪♪
(Música Amir Sater - Tocando em frente)
Beijo, amigo, um ótimo domingo!
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