Manuel Maria não conhecia, completamente,
de ciência certa, as razões da urgência por que for convocado. Não seria por
motivo do funeral, uma vez que existia, em vida, entre os dois uma profunda
aversão e, a última coisa que o senhor da Casa Grande, agora defunto, desejaria,
era que sua passagem para outro mundo fosse presenciada pelo “zorro”, como sempre
que se referia a Manuel Maria era designado, num misto de desprezo e
arrogância. Não seria, pois, o funeral a razão efectiva da sua presença naquele momento, em Terras do Demo, mas nas razões especialíssimas, que a Camillinha
que o amava como se sua mãe verdadeira fosse, lhe iria revelar, logo que se despedissem das poucas pessoas que restavam do funeral,~e mal entrassem no velho casarão. que os
aguardava, com Manuel Maria a fervilhar de memórias
Manuel Maria foi desterrado para
Lisboa, fundamentalmente. por uma razão prática, isto é, “longe da vista, longe do coração” e, assim, deixaria de ser um empecilho, a tropeçar permanentemente com o Senhor da Casa Grande. Porém, do ponto de
vista das duas dedicadas mulheres, que o amavam. como se ambas sua mãe fossem,
a partida do jovem para o internato escolar, em Lisboa, representava a emancipação do jovem, para esferas mais
elevadas de formação – e, “assim
Deus o ajude” - poderá até prosseguir
os estudos e singrar na carreira eclesiástica, para a glória de Deus e felicidade
das duas Mulheres, que ambas o amavam como filho, ficando descansadas quanto ao
seu futuro, já que a vivência de uma grande cidade, como Lisboa, ou retiraria
da mediocridade de apenas saber “ler,
escrever e contar” e a circunstância de passar a viver numa grande cidade lhe permitiria aprender defender-se das armadilhas da vida.
Quer dizer, são os grandes espaços que
fazem as grandes árvores. E também os grandes homens.
Manuel Maria, cedo do
compreendeu ser esse o seu destino e foi com resignação que aceitou a decisão
que, em seu nome, fora tomada pelas duas mulheres; apenas a saudade constituía
uma nuvem a enegrecer os seus pensamentos, pois ficaria sem o afeto cotidiano, que
constituía um bálsamo a dulcificar sua solidão. Porém, não ignorava quanto o Senhor
da Casa Grande o desejava da porta para fora e, nesse contexto, crescia
o seu próprio o desígnio de abandonar aquela casa.
Assim, pois, Manuel Maria, no seu jeito de ruminar factos e acontecimentos da sua vida, a que, de uma forma ou outra, ficou preso, quer por lhe serem gratificantes, ou demais penosos para poder esquecer. Seguia pois Manuel Maria, ajustando as suas contas nesse mergulho do passado, na justa medida em que seus olhos passavam as paisagens e lugares da sua meninice, com as duas mulheres que o amavam como filho de ambas fosse, ele ao do condutor. elas no banco traseiro do automóvel, também elas em silêncio mergulhadas nos seus pensamentos, cada uma, por certo. com diferentes precupações, face à nova realidade, ditada pela morte de Federico Amásio.
Finalmente, os portões da Casa Grande
abriram-se à passagem do automóvel e Manuel Maria, o primeiro a sair da
viatura, abriu a porta às duas Mulheres, que o amavam como se filho de ambos
fosse, primeiro a Camillinha que o abraçou demoradamente. não contendo uma lágrima
furtiva e abraçando a Violante depois com o outro braço, assim ficaram os três abraçados como se fossem um só, durante
alguns minutos até que o rapaz se soltou do abraço colectivo e beijou na face ambas as mulheres
e, para quebrar é comoção que os invadia, soltou, num sorriso traquina “Vocês, as
duas, sois as mulheres da minha vida…”, que teve o mérito de fazer sorrir as duas mulheres e desconstruir as emoções e as fadigas do dia.
E, assim, mais libertos da emoção
de estarem juntos, em plena liberdade sem os olhos expiados de Frederico Amásio agora defunto e para todo o sempre encerrado no seu túmulo, no dia em que, por todo o País estalava a Revolução
e a primavera floria no coração do Povo.
Manuel Veiga
3 comentários:
um forte abraço, Manuel!
Ausente durante duas semana em tratamento aos olhos estou de volta mas ainda não consigo ler textos muito grandes.
Abraço e saúde
Revolução que também estala para esses três personagens
que merecem viver as suas vidas em plenitude.
E nós, aqui, desejando saber quem não escreveria a tal
"Carta..." e a quem. Um segredo que o digníssimo Escrevente
guarda a sete chaves. Mas que será desvendado, disso tenho
quase a certeza. :)
Um abraço
Olinda
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