Um destes dias um poeta, com banca na praça,
Meio por graça disse que minha poética caligrafia
Era escrita à mão ainda e, se por acaso, eu sabia
Que a poesia, toda ela, hoje em dia, salta
Das entranhas do computador e se derrama
Pelas ruas citadinas em gigantes placards
E montras, não de chocolates, mas de iguarias
Bem recicladas, como noticias esventradas,
Ou bombas por explodir algures em qualquer lugar
Ou esquina do mundo. E se consome sem sal
Em fulgor hiper-realista. E se ilumina consumista
Nas escórias do luxo. E do lixo.
Eu não sabia, por isso, saí da refrega com
O rabo entalado qual cachorro de feira enxotado
Pela cozinheira, a polvilhar a mistela do dia.
Mas fiquei a matutar na minha. E como no fado
Dedilhado em que o fadista se esganiça, fingindo
Que chora, o que então não disse, vou pois
Dizer-lhe agora que prefiro a poesia me venha
À mão como “dobrada fria” em vez do arrepio
Fervilhante dos bits a formigar nas teclas
Dos computadores. E que dispenso o incenso
E contorcionismos do hip-hop. E a borbulha tardia.
E que a culinária literária me faz azia a derreter-se
Nas bocas hipermodernistas. Ou nas tretas
Da grande farra das letras.
Manuel Veiga
(Poema Editado)
5 comentários:
Um abraço e um sorriso cúmplice, Manuel.
Também eu "dispenso o incenso e contorcionismos do hip-hop. E a borbulha tardia". E digo contigo "que a culinária literária me faz azia a derreter-se
nas bocas hipermodernistas. Ou nas tretas Da grande farra das letras".
Eu escrevo à mão e com lápis…
Uma boa semana, meu Amigo.
Um beijo.
"Original é o poeta
que se origina a si mesmo..."
E este poema prima pela autenticidade numa linguagem exuberante. É mais um que te identifica, meu amigo Manuel Veiga.
Beijos.
Pois é, pois é... não importa como nasça, sabemos que a sua poesia não esquece do seu povo lá fora. E haja penhor! Acima das contingências!
Forte abraço, caro amigo!
Aqui está o poeta autêntico , na Arte e verticalidade !
Beijinho Manuel
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